sexta-feira, julho 30, 2004

Parabéns

Com uns minutos de imperdoável atraso, aqui ficam os meus parabéns ao Irreflexões. Um dos melhores na forma como irreflecte e inexcedível na paciência para com os leigos da informática. Um sincero abraço de felicitações e agradecimento.

Os sonhos nunca morrem

A apresentação da candidatura de Manuel Alegre a secretário-geral do Partido Socialista veio mostrar que esta é a proposta mais sólida e credível para a liderança do partido. Ideologicamente consistente, motivada pelas causas e pelos princípios da esquerda e, ao mesmo tempo, politicamente hábil. O discurso de Manuel Alegre, talvez o melhor discurso político dos últimos 15 ou 20 anos, mostrou que a força das convicções possui um apelo que o tacticismo nunca será capaz de alcançar. E mostrou também que a ideologia e os valores de esquerda são hoje tão actuais como eram há 30 anos.
O anunciar a candidatura nos termos em que o fez, Manuel Alegre colocou inequivocamente o PS num campo de onde ele nunca devia ter saído. E fê-lo de uma forma que não compromete a natural autonomia eleitoral do partido, antes pelo contrário, denota bem a ambição dos seus propósitos. Mas também não teve medo de afirmar que mais valem os compromissos assumidos claramente do que os contorcionismos eleitoralistas. É um projecto com características para reabilitar o PS e a própria democracia portuguesa, que bem necessitada está deste novo fôlego.
O projecto que Manuel Alegre propõe não representa o passado, como alguns pretendem, mas sim o futuro. Representa o que a política deve ser e sempre devia ter sido. Uma actividade sem concessões ao populismo, ao simplismo e ao centrismo. Uma actividade que se quer expurgada dos interesses económicos, do peso dos aparelhos e das clientelas. A candidatura de Manuel Alegre reaviva a saudável pluralidade partidária, sem receio de defender os valores da esquerda, da criação e justa distribuição da riqueza, da solidariedade social, da transformação da realidade e da não subserviência ao primado da economia. É uma candidatura que não se conforma e ousa sonhar. A importância de nos devolver esta capacidade é incalculável. Se não fosse por mais nada, só por isto já tudo teria valido a pena.

terça-feira, julho 27, 2004

Uma grande verdade

Se Lisboa tivesse sempre a densidade populacional que regista entre o final de Julho e o início de Setembro era um sítio muito melhor para se viver.

segunda-feira, julho 26, 2004

Verdade eleitoral (V)

Conforme ficou explícito no post anterior sobre este assunto, a documentação que suporta a validade dos actos eleitorais está longe de obedecer ao exigível. De seguida são enunciados os casos referidos pela investigação da GR.

- Nas freguesias de Penha de França, Campo Grande, Ameixoeira, Santa Maria dos Olivais e Carnide, entre outras, a discriminação do número de boletins de voto recebidos para a Assembleia Municipal, Câmara Municipal e Assembleia de Freguesia não é coincidente.

- Na secção 2 da freguesia de S. João de Deus o número referido de boletins a disponibilizar aos eleitores é muito inferior ao número de votos (245 para 785).

- A situação descrita em cima também ocorre na secção 2 de Carnide, sendo que neste caso existem dez rasuras e correcções de dados referentes à CM e à AF no número de boletins recebidos, total de votos, número de boletins de voto e nas votações das listas Amar Lisboa e Lisboa Feliz.

- Na secção 5 de Carnide surgem rasuras nas abstenções, nos votos em branco e nulos.

- Na secção 9 de Carnide não está preenchida a acta referente à CM e a da AM recebeu infirmações a lápis sem qualquer assinatura dos membros da mesa.

- Na secção 19 de Marvila a acta não regista qualquer resultado.

- Na secção 1 da Ameixoeira a soma do número de votos apurados com o número de boletins não utilizados (1150) não coincide com o número de boletins de voto disponíveis (1000). No caderno eleitoral há três votos riscados sem qualquer indicação ou justificação. Existem rasuras também nas secções 2 e 3.

- Na freguesia da Penha de França há dados em falta nas secções 4, 9, 12 e 13. Na secção 3 todos os votos expressos por partidos/coligações estão emendados.

- Na freguesia do Campo Grande há problemas nas actas das secções 1, 2, 5, e 7.

- Na secção 3 do Campo Grande e na secção 2 de São João os nomes dos partidos/coligações estão escritos a lápis.

- Na freguesia de Santa Maria dos Olivais há rasuras e faltas de preenchimento de dados nas secções 1, 2, 7, 11, 14, 19, 24, 26, 29, 31, 33, 36 e 37.

- O caderno eleitoral e o livro de actas da secção 7 da freguesia de Alvalade não se encontram no Governo Civil.

- Na freguesia de Marvila as actas das secções 7, 9, 16 e 30 apresentam problemas.

- Na freguesia de São Jorge de Arroios foi corrigido o número de votos nulos (12 para 8), o número de votos no PP (4 para 53). Na secção 9 todos os resultados estão escritos a lápis.

- Na secção 2 da freguesia da Sé foram descarregados 276 votos nos cadernos eleitorais, mas as actas referem 282. As abstenções também variam de 274 para 280.

- Na secção 2 da freguesia de São João de Deus foram descarregados 772 votos nos cadernos eleitorais enquanto nas actas constam 787.

Quanto a outros concelhos, a investigação aponta para diferenças nos números de eleitores, de votantes e de votos. São referidos os concelhos de Braga, Coimbra, Guarda, Lisboa, Viseu, Évora, Setúbal, Aveiro, Águeda, Vila Verde, Vizela, Rio Maior, Ponte da Barca, Montalegre, Vila Pouca de Aguiar e Ponta Delgada, Santarém, Sintra, Amadora e Porto.

Esta síntese telegráfica tentou ser fiel ao que consta na investigação realizada pela GR. No entanto, falta um pormenor que merece fazer parte deste conjunto de posts e que ainda não foi abordado. Trata-se das reacções de diversas entidades que foram recolhidas pela GR. Com mais alguma paciência, também se poderá apresentar um resumo do que alguns dos intervenientes quiseram dizer sobre este assunto.

Old news, same mistakes

Ardemos novamente. Segundo o Público, em igual período do ano anterior havia menor número de incêndios e menos área ardida. Ou seja, este ano consegue estar a ser pior que o inferno do ano anterior. E a única coisa que temos como garantida é que não há ninguém para responsabilizar.

Grande Reportagem

A continuação da síntese da reportagem sobre as autárquicas de 2001 esteve suspensa este fim-de-semana. É que a vida não é o blogue. A minha, pelo menos, não é. Dito isto, é certo que, embora o espírito das férias já se insinue no Viva Espanha, o trabalho vai mesmo continuar.

Durante a busca pelo exemplar da Grande Reportagem que continha esta peça, dei por mim a folhear outros números da revista. Por coincidência, nas últimas semanas também me têm chegado às mãos as edições actuais da GR. A diferença é tão avassaladora que faltam palavras. O decréscimo de qualidade, em todos os aspectos, é de tal forma constrangedor que parece abusivo que a versão actual continue a ostentar o mesmo nome. A GR já foi a minha revista mensal de referência. Ainda não lhe encontrei substituta à altura. Mas uma coisa é certa. Aquele amontoado de páginas que responde agora pelo nome de Grande Reportagem não chega a ser uma pálida imagem do que já foi uma grande revista.

Quebrar o silêncio por Darfur

Após o fim-de-semana, encontro no e-mail um apelo do Nuno Guerreiro para que não se ignore as atrocidades que estão a ser cometidas no Sudão. O Nuno Guerreiro diz que com este e-mail não pretende referências nem links ao seu blogue, mas apenas contribuir para a sensibilização da blogosfera, tentando abranger o maior número de pessoas possível. A iniciativa é louvável e, por isso, o link é mais que merecido. Por lá pode ser encontrada muita informação sobre a crise no Sudão. Acabar com estas situações mais que desumanas passa muito pela nossa capacidade de não calarmos a desgraça. Pode parecer pouco, mas, de facto, não é. Obrigado ao Nuno Guerreiro por nos lembrar disso.

sexta-feira, julho 23, 2004

Verdade eleitoral (IV)

A peça que divulga as incoerências no apuramento dos resultados nas autárquicas de 2001 é da autoria de António José Vilela e está publicada na Grande Reportagem de Outubro de 2002, da página 86 à página 95. Uma boa parte do texto baseia-se em informações recolhidas por Alberto da Silva Lopes, mas também existe trabalho de investigação da própria GR. O texto merece uma leitura atenta, mas afigura-se demasiado longo para ser transcrito na íntegra. Os dados que apresento a seguir são retirados da reportagem e, segundo Francisco José Viegas, na altura director da revista, não foram contestados por ninguém.

Segundo a GR, o primeiro número apresentado refere-se ao resultado provisório anunciado oficialmente na noite das eleições. O segundo número refere-se ao resultado anunciado cinco dias depois pela Assembleia de Apuramento Geral.

Variação do número de eleitores inscritos para a CML – 567.867 para 568.087
Variação do número de votantes – 312.391 para 311.482

Variação de votos para a Câmara Municipal de Lisboa
Lisboa Feliz (Pedro Santana Lopes) – 131.135 para 131.094
Amar Lisboa (João Soares) – 130.279 para 129.368
Votos nulos - menos 67
Votos em branco – mais 39
BE – mais 22 votos
CDS/PP – mais 53 votos
PCTP/MRPP – mais 4 votos
PNR – menos 8

Variação de votos para a Assembleia Municipal
Número de votantes – 312.383 para 312.784
Lisboa Feliz – 124.457 para 124.876
Amar Lisboa – 129.852 para 129.823
Votos nulos – menos 114
Votos em branco – mais 73
CDS/PP – mais 33
BE – mais 12
MPT – menos 3
PNR – menos 1
PCTP/MRPP – mais 11

Número de eleitores descarregados nos cadernos eleitorais mas sem votos correspondentes nas urnas, por freguesia
Ameixoeira – 340
Carnide – 189
Penha de França – 50
São Mamede – 20
Alcântara – 12
Santa Catarina – 3

Número de votos nas urnas que não têm correspondência nas descargas nos cadernos eleitorais, por freguesia
São João – 620
Santa Maria dos Olivais – 103
São Jorge de Arroios – 54
São Francisco de Xavier – 13
Santo Condestável – 4
Madalena, Prazeres e São Domingos de Benfica – 1 cada

Existem ainda outros dados curiosos. Houve 1302 pessoas que votaram para a AM mas não para a CM. Em 1989 esse número era de somente 34 eleitores e em 1997 não se registou qualquer diferença.
No artigo da GR há também referência a actas rasuradas ou emendadas e a documentos onde não constam todas as assinaturas obrigatórias, assim como diferenças entre os dados apresentados pelo STAPE e os dados publicados pelo Diário da República. E as incoerências não se ficam por Lisboa. Sintra, Setúbal, Amadora e Porto, por exemplo, também apresentam variações. Assuntos para os próximos posts.

quinta-feira, julho 22, 2004

Verdade eleitoral (III)

O exemplar da Grande Reportagem já apareceu. É a edição de Outubro de 2002. Mais logo conto apresentar uma súmula das incorrecções que são apontadas nessa investigação.

quarta-feira, julho 21, 2004

Verdade eleitoral (II)

O LNT publicou um texto no Tugir sobre o apuramento dos resultados nas autárquicas de Lisboa. Por lá pode-se seguir um link que esclarece alguns dos contornos que esta história assume. Franciso José Viegas também publicou um texto sobre o assunto. Entretanto, prossegue a busca do exemplar da Grande Reportagem.

Verdade eleitoral

O primeiro contacto que tive com as incorrecções no apuramento dos resultados das autárquicas em Lisboa, a que o Irreflexões dá eco, deu-se através da leitura de um texto na Grande Reportagem. Do que me recordo, ficou a impressão de uma história muito mal explicada, com vantagens e desvantagens para as duas listas, lideradas por João Soares e Pedro Santana Lopes. Sempre me pareceu que um caso destes reunia todas as condições e mais algumas para se proceder a uma investigação profundíssima por parte de todas as autoridades competentes. Que eu saiba, tal nunca chegou a acontecer, ou então os esforços feitos nesse sentido não produziram qualquer esclarecimento digno de reparo. O mais estranho e preocupante parece ser o abandono a que o caso está votado. Acredito que muita gente não faça sequer ideia das suspeitas que existem sobre a forma como decorreu a contagem de votos nessas eleições. Nem a comunicação social, nem os partidos, nem os candidatos parecem interessados no apuramento dos factos. Ainda que se venha a descobrir que tudo não passa de uma confusão, é do interesse do sistema democrático que estes assuntos sejam totalmente esclarecidos. Se se vier a descobrir que realmente existiram irregularidades, quer elas sejam decorrentes de incompetência técnica, quer estejam relacionadas com uma deturpação consciente e voluntária dos resultados, é fundamental encontrar os responsáveis e garantir que tal não se repetirá. Um regime em que existe uma perversão da verdade eleitoral, nem que seja por apenas um voto, não é uma democracia. Não é, ponto final.

O exemplar da Grande Reportagem que contém esta história anda algures lá por casa. Assim que o seu paradeiro seja conhecido será possível acrescentar alguns pormenores a este caso bizarro. Se não me falha a memória, por essa altura o director da GR era Francisco José Viegas. Um interlocutor privilegiado para trazer alguma luz sobre a investigação que a sua revista publicou.

Responsabilidades

O fenómeno Santana e Sócrates, para utilizar a expressão do Paulo Gorjão, resulta da demissão de terceiros. Mas não dos terceiros que o PG identifica. Em rigor, não é a demissão de Durão Barroso que permite a Santana Lopes chegar à presidência do PSD, assim como não é a recusa de António Vitorino que permitirá, eventualmente, que José Sócrates chegue à liderança do PS. Tanto JS como PSL alcançaram o reconhecido ensejo, já concretizado no caso do segundo, de liderar os seus partidos e, assim, alcançar também o lugar de primeiro-ministro. A forma como JS e PSL aparecem tão bem colocados para liderar os destinos do PS e do PSD é que merece alguma atenção.
É fácil perceber que a exposição mediática é boa parceira do protagonismo político. Aliás, muito protagonismo político passa hoje pela exposição mediática, seja na televisão, na imprensa, na rádio ou nas revistas de trivialidades. A forma como se chega a este ponto, em que a intervenção política vale mais pelos minutos de exposição do que pelos conteúdos ou pelo curriculum, é típica do nosso tempo. O que não quer dizer que nos devamos sentir confortáveis com isso. Aliás, estas situações têm vindo a ser denunciadas com maior ou menor sucesso. No entanto, se a superficialidade tem direito a honras de prime time na televisão e a manchetes apelativas na imprensa, os principais responsáveis não poderão deixar de ser as pessoas que tomam essas decisões editoriais. Ainda esta semana José Manuel Fernandes diluía as responsabilidades por todos. Mas não é verdade. Os leitores do Público e os espectadores da SIC e da RTP não têm qualquer responsabilidade na escolha dos comentadores. A responsabilidade é daqueles que preferem continuar a alimentar uma fórmula fácil e redutora que, todavia, garante audiências.
Se PSL e JS não têm conteúdo político relevante (e não é isso que está aqui em discussão), então quase toda a exposição mediática que têm é, na realidade, sobre-exposição. E, tal como diz a infinita e sempre ambígua sabedoria popular, o que é demais é erro. Se o erro está identificado – e há muito tempo que está identificado – por que esperam para o corrigir?
Neste cenário é compreensível que se perspectivem oportunidades fáceis para os que melhor souberem aproveitar o sistema montado. A comunicação social gosta da oratória fácil e a oratória fácil gosta das atenções da comunicação social. Entretanto, a massa de políticos que não tem perfil ou paciência para a subserviência mediática raramente vê facultada a possibilidade de divulgar formas alternativas e mais éticas de estar na política. Quando chega o momento de uns se confrontarem com os outros, sabendo que, para os leitores, os programas apresentados nunca são, na prática, o cerne da questão, o resultado é uma disputa bastante desigual entre figuras mediáticas e ilustres desconhecidos. As consequências são fáceis de adivinhar e estão um pouco por todo o lado para serem analisadas.

Seria injusto não reservar umas linhas para criticar as máquinas de interesses eleitoralistas que pululam nos partidos e cuja quota-parte de responsabilidade do estado das coisas é enorme. Felgueiras, Marco de Canavezes e Gondomar exemplificam até onde pode ir a relutância dos partidos em prescindir de uma reeleição. Chegamos mesmo ao triste caso de ver dirigentes partidários defender os caciques locais contra qualquer lógica. O apadrinhamento partidário dado aos maus exemplos, e podemos apenas recordar os casos já citados, é constrangedor e deveria fazer corar de vergonha o sistema político nacional. A democracia portuguesa estará de muito melhor saúde no dia em que escândalos desta dimensão impliquem um afastamento dos detentores dos cargos. E, uma vez provados em tribunal, não só encerrem a sua carreira política como passem a condicionar seriamente a dos que tornaram possível a sua ascensão no interior dos partidos.

terça-feira, julho 20, 2004

Sejamos claros

José Sócrates, apesar da pose, ainda não ascendeu à liderança do PS. Está lá muito perto, mas não nos precipitemos.

A estratégia do PP

Um governo com as características do que conhecemos neste momento permite concluir que a sua orientação é muito mais política que técnica. É claro o incremento de nomes provenientes do CDS-PP que pertencem à primeira linha política do partido. A Paulo Portas e Bagão Félix juntam-se Nobre Guedes e Telmo Correia. São nomes que têm como principal objectivo ganhar visibilidade. Se o Ambiente é uma pasta tão actual quanto difícil, também é certo que não tem, como nunca teve, a atenção mediática devida. A asneira ambiental passa frequentemente impune sem que a maior parte dos cidadão e das entidades competentes consigam aperceber-se em tempo útil. A acção, claro, fica extremamente diminuída. Trata-se de uma daquelas pastas que se presta muito a comunicados de imprensa divulgando as melhores das intenções, mas que é pouco acompanhada no terreno. Por mais que se queira proteger as reservas naturais, a parte essencial está sempre centrada na aplicação concreta das medidas criadas, na fiscalização e na punição dos infractores. E a verdade é que em Portugal ainda compensa poluir, assim como compensa pressionar para obter a rentabilização económica dos recursos ambientais. Aliás, utilizando um discurso que é caro ao CDS-PP, sobretudo quando lhe convém dramatizar as questões de segurança interna, algumas punições por crimes ambientais são simplesmente ridículas. Os proveitos superam largamente os custos. Enquanto estas situações se mantiverem não haverá mudanças reais na área do ambiente.
De resto, existe uma ligação muito grande, nesta altura, entre o sector ambiental e o sector turístico, a outra pasta que passou a ser tutelada pelo CDS-PP, através de Telmo Correia. O Turismo tem aquela vantagem de, por muito pouco que se faça, poder ser uma pasta que apresenta quase sempre resultados. Com a ameaça terrorista globalizada, Portugal apresenta-se como um dos países de low profile (se preferirmos esquecer a triste cimeira das Lages) na Europa e no Mundo. Garante assim uma função de destino alternativo que não deve ser menosprezada. O peso negativo de Portugal como destino está na força do euro face a outras moedas. Algo que pode ser compensado pelo maior poder de compra dos turistas que cá se deslocam. O resultado acaba por ser mais uma pasta que pode gerar mais visibilidade e menos desgaste para o seu detentor.
Outro factor de dinamização do sector do turismo passa pelo aproveitamento do ambiente como pólo de atracção. Os interesses imobiliários e turísticos rondam frequentemente as apetecíveis zonas ambientais. Mas se se pretende dinamizar um sector à custa do outro estamos longe da melhor estratégia. O ambiente é um património de todos que não pode ser reduzido a uma escala meramente económica. A defesa dos interesses ambientais não pode ser posta em causa em favor dos interesses económicos. A economia funciona por ciclos. Os prejuízos ambientais são, muitas vezes, para sempre.
Por todos estes motivos existe uma preocupação acrescida com o futuro das relações entre estes dois ministérios no actual governo. Qualquer uma das pastas se ajusta à estratégia de branqueamento político em que o CDS-PP está apostado após a péssima experiência da anterior governação. Boa visibilidade, pouco desgaste, ministros com um forte pendor político que não dão garantias de competência técnica, mas que asseguram aquela "habilidade natural" perante a comunicação social. Características que irão certamente pautar a actuação do partido de Paulo Portas nos próximos dois anos.

Avisam-se os interessados

A partir de hoje o bloguista de serviço nesta casa passa a poder ser lido também no blogue O Bicho. O primeiro post já lá está. Só ainda não sei como é que vou arranjar vida para isto...

sexta-feira, julho 16, 2004

José Sócrates

Partilhei a minha atenção à entrevista de José Sócrates com as últimas páginas do livro que estava a ler. Não sou, por isso, a pessoa mais indicada para a comentar. Do que retive, sobressaiu um discurso com aroma a campanha, e não somente para o interior do PS. José Sócrates pareceu já bastante convencido que será o próximo secretário-geral do PS e dirigiu-se a uma audiência mais vasta. Verdade seja dita, não é o único. Sendo reconhecidamente da ala direita do PS, frequentemente apelidada de esquerda moderada ou centro-esquerda, optou por não hostilizar a esquerda, elogiando até o contributo de Ferro Rodrigues como SG. Convenhamos, era o mínimo que se podia esperar. A candidatura de JS nasce na ressaca da recusa de António Vitorino, nome apontado como o mais consensual no PS para suceder a FR. Além de que esta tendência para agradar a vários sectores ao mesmo tempo é típica da escola guterrista, na qual JS se revê inteiramente. O problema é que já sabemos como terminou o guterrismo e se JS não aprendeu as lições essenciais desses tempos, mais cedo ou mais tarde pode esperar um final semelhante.

AliBaba

Este blogue estava em lista de espera para entrar na coluna dos links há uns tempos valentes. Agora que parece ter ganho alguma regularidade na publicação, ganha lugar cativo nas leituras do dia. No entanto, não consigo resistir à piadinha fácil. É que o AliBaba faz mesmo lembrar a estória da melancia: é verde por fora, mas vermelho por dentro. E já agora, parece-me que reconheço essa lista de links de algum lado. Só te falta aí um. Vê lá se adivinhas de qual é que te esqueceste...

quinta-feira, julho 15, 2004

Ainda Ferro Rodrigues

A liderança de Ferro Rodrigues foi mais importante para o sistema político português e para o PS do que é reconhecido. A linha ideológica da direcção do PS aproximou-se daquilo que considero ser o campo em que um partido com as características do PS se deve situar. Com FR, o PS ocupou claramente o campo da esquerda. Evidentemente, esta colocação desagradou a muita gente, dentro e fora do partido. Não faltou quem vaticinasse resultados desastrosos que nunca se concretizaram. Pelo contrário, quer as sondagens quer os resultados eleitorais desmentiram estas teorias. No entanto, o centro continuou a ser o objectivo eleitoral dos que não se reviram numa orientação de esquerda. Em última análise, se o PS e o PSD decidirem competir simultaneamente pelo centro perde-se diversidade no panorama político nacional. Além disso, o eleitorado do centro é tendencialmente desideologizado e consequentemente volátil. Ter um ou, ainda pior, os dois maiores partidos a focar-se no centro não contribui em nada para a pedagogia política do eleitorado e aliena uma margem de sensibilidades políticas enorme.
Fica ainda por demonstrar a capacidade de concretizar as políticas de esquerda que se prometiam. Depois da década cavaquista e dos seis anos de governo liderado por António Guterres, que estava longe de poder ser considerado a ala esquerda do PS, gora-se assim uma oportunidade que, embora mal quista e menosprezada, reunia reais condições de estabelecer uma governação bastante diferente do que foi a última experiência socialista.
Tão atacada como a linha ideológica de FR foi a sua linha política. A este facto não foi alheio o desenvolvimento do processo Casa Pia. Nos diversos episódios que envolveram FR, uma boa parte deles não tem outra classificação que não seja a de canalhice. Ainda me espanto com a facilidade com que se diz que FR deixou colar o PS ao caso Casa Pia. Como se a colagem não tivesse sido feita generalizadamente em órgãos de comunicação social mais preocupados em garantir audiências do que em permanecer fiéis à deontologia da profissão. Ou como se as insinuações de pedofilia constituíssem uma acusação da qual seja possível encontrar uma saída política. Uma acusação ao carácter, ao contrário das acusações políticas, não admite diferentes perspectivas de enquadramento. FR sabia que só combatendo veementemente essas insinuações poderia resistir como personalidade política. Mas, ainda mais importante do que isso, o que estava e está ainda em causa é um património democrático que se vê posto em causa quando se tem a sensação que o boato calunioso é suficiente para fazer rolar cabeças. O correcto funcionamento das instituições democráticas não pode ser cúmplice deste tipo de procedimentos. Por isso era tão importante que FR sobrevivesse politicamente ao lamaçal em que o quiseram ver envolvido. Para provar que os princípios podem e devem prevalecer.
A resistência quase estóica de FR perde um pouco com a sua saída. Se FR tinha que deixar a liderança do PS que o fizesse como vontade expressa dos militantes do partido e não em função dos interesses de uma comunicação social ávida de pseudo-acontecimentos ou dos interesses obscuros que sempre pareceram movimentar-se à sua volta para atingir esse fim. Pela minha parte, gostava de ter visto FR resistir pelo menos até ao congresso, obrigando os seus adversários a deixar as sombras. Qualquer que fosse o resultado, sobraria uma valiosa lição de como se deve estar na política. Com frontalidade, com princípios, com abnegação. Na verdade, a lição está lá, mas assim é mais difícil torná-la perceptível.

quarta-feira, julho 14, 2004

Mãe! Pai!

Não era para escrever mais nada hoje, mas não é todos os dias que se chega a ministro. E logo da Justiça.

Esclarecimento

O Paulo Gorjão deixou um comentário ao meu post sobre António Vitorino. Seria obstinação minha não admitir que o argumento do PG retira robustez à minha opinião sobre a genuína vontade de Vitorino em terminar o seu mandato. Como tenho por ideal que a relação que se estabelece entre o bloguista e os seus leitores deve ser mantida na base da confiança, só me resta reconhecer que, se me tivesse ocorrido o que o PG refere, toda a primeira parte do post não teria a forma e o conteúdo que tem. O que não quer dizer que muito do que lá está não continue a fazer sentido, como, por exemplo, a competência e prestígio de António Vitorino e o muito que isso pode contribuir para melhorar a política nacional.
Considero que esta é a única forma de garantir a relação de confiança que defendo. Quem quiser gastar o seu tempo a ler o que aqui vou escrevendo pode esperar ler asneiras na razão directa das limitações que tenho. Mas desonestidades não. O rigor segue dentro de momentos.

A coerência da personagem

Questionado sobre se iria buscar autarcas para o seu governo, [Pedro Santana Lopes] deixou a possibilidade em aberto. Lembrou apenas que a moção aprovada no último congresso do PSD diz que os autarcas que têm apenas um mandato deverão recandidatar-se ao lugar e que, como presidente, quer manter essa orientação. O próprio Santana estaria nessa condição, mas vai deixar o seu mandato a meio, sendo substituído por Carmona Rodrigues na Câmara de Lisboa.

A Natureza do Mal

Não percebo muito bem como é que este blogue me pode ter passado despercebido durante tanto tempo. É muito bom. Mesmo muito bom. E eu não costumo elogiar blogues com frequência. Não porque falte quem o mereça, mas porque não faz parte da linha editorial da casa. Se não conhecem, passem por lá. Se já conhecem, provavelmente sabem melhor do que eu do que estou a falar.

O seu futuro há-de ser o que ele quiser

António Vitorino não quis assumir uma candidatura ao lugar de secretário-geral do PS. É uma decisão coerente com tudo o que se disse nestes últimos dias sobre a necessidade de cumprir, até ao fim, os compromissos assumidos. Vitorino é comissário e comissário permanecerá por mais uns meses. E depois disso não lhe faltarão propostas, porque uma pessoa competente que cumpre os seus compromissos é extremamente valiosa e algo rara nestes tempos. Há que respeitar um político que não decide meramente em função das agendas mediáticas. A carreira política de António Vitorino está longe de ter terminado. Pelo contrário, depois das provas de integridade que deu, sobretudo quando era mais fácil não o fazer, António Vitorino demonstrou ter muito a dar à política.

É pena que os mais competentes, com provas dadas em diversos contextos, não se consigam rever na política portuguesa. Se, por um lado, é imperioso que se quebre um ciclo que afasta os mais sérios e competentes, o que só se pode alcançar plenamente se eles próprios estiverem dispostos a sacrificar-se por esse objectivo, por outro lado, é complicado exigir a qualquer pessoa que dê mais do que aquilo que ela julga que pode dar, dizer-lhe que se embrenhe nos meandros das clientelas, pedir-lhe que se disponha a ser atacado por todos os interesses instalados, que, provavelmente, se prejudique e veja os que lhe são próximos igualmente prejudicados. É perfeitamente razoável pedir a uma pessoa que desempenhe a sua função da forma mais competente que lhe seja possível. Mas como é que se pede a alguém que seja herói?

terça-feira, julho 13, 2004

Frida

Depois do centenário de Neruda, faz hoje meio século que faleceu Frida Kahlo.  
 



Candidata a notícia do dia

Sumo de limão pode eliminar vírus da Sida

A emotividade tem destas coisas

O Cruzes Canhoto terminou. Os seus últimos posts são o manifesto que substancia essa decisão. No Terras pode (deve) ler-se um post de despedida ao Cruzes. JMF resume o descontentamento a que se chegou com uma forma de fazer política que já não é uma forma de fazer política, mas sim uma forma de ganhar protagonismo. A emotividade tem destas coisas. Toca e transforma os outros como poucas coisas mais.

segunda-feira, julho 12, 2004

Neruda

A TSF recorda que hoje se celebra o centenário do nascimento de Pablo Neruda. A minha primeira recordação de Neruda remonta a um tempo que já não consigo precisar. Resume-se a uma ideia que a memória se encarregou de desprover de contexto. Recordo, simplesmente, a minha mãe a explicar-me com aquela doçura digna de poemas que só as mães parecem alcançar, que Neruda tinha morrido de desgosto. Isto, já nem sei bem porquê, mas ainda antes de conhecer os poemas de Neruda, ainda no tempo em que as palavras dos pais têm a força das leis divinas. Hoje nem sei se me sinto atraído pelas pessoas que morrem de desgosto por causa dos poemas de Neruda, ou se me atraem os poemas de Neruda por causa das pessoas que morrem de desgosto, ou se me atraem os poemas e as mortes por desgosto por causa de outra coisa qualquer. Mas sei que também eu me identifico com essas pequenas mortes que os desgostos trazem. Neruda faria hoje cem anos. As vidas assim merecem ser recordadas.

Onde estão os exemplos?

A vida dá-nos desafios estranhos. Algumas vezes, as oportunidades aparecem acompanhadas de um considerável senão. Por vezes, para alcançar um objectivo desejado basta fechar os olhos, basta racionalizar uma escolha. Resistir às tentações costuma ser, por regra, tarefa árdua. Mas é nestes momentos em que dizer não se torna tão difícil que o indivíduo se supera. Durão Barroso falhou este desafio. Pedro Santana Lopes e o PSD, de uma forma geral, também. Como alude o Lutz, agora é mais difícil dar conselhos aos petizes.

A demissão de Ferro Rodrigues

Embora compreensível, a decisão de Ferro Rodrigues não foi a mais desejável. Depois de tudo o que atravessou, esperava-se que FR resistisse até ao congresso, antecipado ou não. Esperava-se que FR se apresentasse com as suas propostas, de peito aberto, para calar definitivamente os opositores internos ou para cair de pé perante os lobos. FR podia ter capitalizado o descontentamento da esquerda com a decisão de Jorge Sampaio permanecendo na liderança do PS. Podia ter confrontado todos aqueles que não se pronunciaram, por calculismos exclusivamente pessoais, sobre a delapidação da democracia. Na realidade, se alguém podia sair beneficiado com esta situação, FR estava seguramente entre eles. O empenho que colocou na defesa de eleições antecipadas jogaria a seu favor.
Ao sair, FR deixa o PS entregue à direita. A oposição de esquerda, enquanto não se definir a situação interna do PS, fica entregue ao PCP e ao BE. Ironicamente, é precisamente quando sai que FR dá mais razão aos que tanto o acusaram de promover as intenções políticas dos partidos à esquerda do PS. Se se confirmar que a liderança do partido vai ser ocupada pela direita do PS, então mais razões terá o eleitorado de esquerda que não se revê nessas posições para se refugiar nos partidos ainda mais à esquerda. Em compensação, o PS poderá ganhar votos ao centro, o chamado eleitorado flutuante. Um eleitorado que ajuda a ganhar eleições, mas que não acrescenta massa crítica aos partidos. Tão depressa vem como vai, meramente ao sabor das conjunturas. Como o PS descobriu com António Guterres, tentar agradar aos dois lados da barricada resulta mal, tanto nas votações como nas governações.
Tenho defendido que a liderança de FR foi minada por dentro e por fora, o que condicionou toda a sua actuação. Afirmei que FR reunia condições para chegar às legislativas, assim o permitissem. Não porque a sua liderança fosse imune às críticas, mas porque me pareceu que poderia apresentar um projecto alternativo àquilo que tem sido comum na moderação centrista do PS dos últimos anos. Agora que se demite, dificilmente se vislumbra oportunidade para que a esquerda do PS possa voltar a imprimir outro rumo à forma de fazer política do partido.
Se, com uma liderança moderada, dita de centro-esquerda, o PS ganhar as próximas legislativas – e eu, apesar de tudo, espero que sim –, mas sem maioria absoluta, como é que este centro-esquerda moderado vai conseguir as imprescindíveis aprovações dos Orçamentos de Estado? À sua esquerda ou à sua direita? A situação não está mais fácil para o PS só porque a sua liderança vai mudar.

O preço de uma decisão

Não vale a pena repisar os argumentos esgrimidos nas duas últimas semanas sobre a convocação de eleições antecipadas. Interessa sobretudo manifestar o profundo desapontamento com a decisão do PR. Jorge Sampaio traiu a sensibilidade política dos que o elegeram, colocando-se no campo político oposto ao que lhe deu a sua base de apoio. A escolha era sua e qualquer decisão tinha suporte legal. Por aí nada a acrescentar. O que se impunha, e o que se verificou, foi uma decisão estritamente de interpretação política de uma situação. E, neste sentido, dada a interpretação do PR, é legítimo questionar se foi para este tipo de interpretações políticas que a esquerda elegeu Jorge Sampaio. A resposta é óbvia.
Certamente, Jorge Sampaio decidiu, segundo a sua convicção, o que julgou melhor para o país. É isso, talvez, o que custa mais. Que o que o PR julga melhor para o país se afaste tanto dos cidadãos. Entre a participação dos cidadãos eleitores, legitimando a representatividade do parlamento que suporta o governo, e uma solução concertada com os interlocutores privilegiados do costume, o PR decidiu-se pela segunda. Foi um tiro na pedagogia política, na participação cívica e na credibilidade da democracia. Jorge Sampaio jamais se livrará deste estigma. Da mesma forma que, no final do seu segundo mandato, desbarata o capital de simpatia que reunia junto do eleitorado. A direita nunca o apreciou e tão cedo a esquerda não voltará a confiar nele. Não há muito mais cargos que Jorge Sampaio queira assumir na política interna. Mas se o quiser realmente fazer, terá de equacionar muito bem a forma de o fazer. Quebrar as bases de confiança da forma que o PR fez costuma ter um preço alto.

quinta-feira, julho 08, 2004

Que ganhe o melhor

Aí está. Besugo é o segundo bloguista a assumir a vontade de suceder a Jorge Sampaio no cargo de Presidente da República. O outro, já se sabe, é o Paulo Gorjão.

quarta-feira, julho 07, 2004

Falta de paciência II

Foi só uma. Podia ter sido pior.

Falta de paciência

O blogger anda insuportável. Deixa lá ver quantas vezes é que estes posts vão aparecer publicados...

Esperar por 2006

Se partirmos do princípio de que uma governação de esquerda é preferível a uma governação de direita, então um executivo liderado por Pedro Santana Lopes nunca poderá ser uma boa solução. É claro que esta preferência pode ser posta em causa, por exemplo, pelo pessoal de direita. Adiante. Por uma questão de princípio, considero preferível um compromisso claramente assumido a uma ausência de ordem meramente táctica, tendo em vista interesses particulares. Neste caso, se o PS optasse por esperar por 2006 seria uma ausência que poderia, a prazo, talvez, beneficiar o interesse particular do partido, enquanto mobilizar esforços para alcançar o governo já na actual conjuntura seria pensar no interesse do país.
O país precisa de mudar de políticas imediatamente. Mais dois anos de governo PSD-PP é uma pena que não se deve querer impor aos portugueses. A natureza liberal da governação PSD-PP não lhes permite estabelecer uma governação que reconheça a importância do Estado. Da mesma forma, também não é expectável que seja a partir desta segunda metade da legislatura que a coligação irá inverter a tendência de sacrificar as pessoas em detrimento dos números. Por isso, a melhor solução não pode passar senão pela alteração rápida e profunda de rumo. O que não constitui a base de argumentação para a antecipação das eleições. Essas razões, como já tenho referido, são de outra ordem.
Vem tudo isto a propósito de uma pequena provocação do Irreflexões. Se, por este prisma, que eu tenho quase a certeza que é partilhado pelo próprio Irreflexões, não faz sentido considerar benéfica uma governação liderada por PSL, por outro lado também não é líquido que daí resultem vantagens, ainda que meramente eleitorais, em 2006. Existem duas razões para não darmos como absolutamente certa uma retumbante vitória da esquerda em 2006 depois de dois anos com PSL como primeiro-ministro. Em primeiro lugar, a previsível tendência eleitoralista de um governo nestas condições é notória. Será virtualmente impossível que PSL resista à sua natureza, tornando este governo muito mais visível que o anterior. Para o fazer PSL precisa de gastar dinheiro. Precisa de iludir o eleitorado, criando uma aparente situação de prosperidade. Ora, uma das maiores bases de apoio com que PSL conta são os autarcas. São autênticos postos avançados, onde o contacto com o eleitorado é muito mais directo. Assim sendo, os autarcas apoiam PSL na sua ascensão a PM, PSL retribui apoiando os autarcas nas eleições de 2005 e os autarcas voltam a retribuir apoiando as pretensões de PSL para as legislativas de 2006. Está criado um ciclo de dependências mútuas que se auto-alimenta. Um factor não pode ser menosprezado.
O segundo aspecto deriva da propaganda que PSL consegue facilmente montar. Como já se tornou claro no executivo da CML, PSL não recua perante a necessidade de distorcer a realidade à medida das suas conveniências ou de catapultar actos de gestão corrente a medidas de “carácter estrutural”. Como tem sido também notório nesta fase que atravessamos, PSL e o seu séquito recorrem sem pudor à intoxicação informativa. Se em meios com algum acesso à informação este fenómeno poderá não ser tão bem sucedido, noutros os desmentidos nunca alcançarão o mesmo mediatismo da intriga que os precedeu.
Talvez isto não seja o suficiente para vencer umas legislativas em 2006 depois de dois anos de governação. Tenho esperança que, caso este cenário se confirme, à esquerda se levante uma oposição activa e coordenada, com tanta capacidade de reacção ao populismo como de criação de propostas alternativas viáveis. Uma oposição capaz de gerir a vantagem eleitoral que, neste momento, aparentemente possui. Mas, da mesma forma que acredito nisto, também estou convicto que o combate eleitoral em 2006 seria muito mais difícil do que à partida se possa imaginar.

terça-feira, julho 06, 2004

Poupar quem a quê?!

Não vi a entrevista de Pedro Santana Lopes na televisão. Nem sequer me apercebi que ela se realizaria, senão teria feito o esforço. Leio agora algumas das suas palavras, referidas por vários blogues. Entre elas engasgo-me especialmente com a vontade de “poupar o povo a eleições”. Esta ideia condensa tudo o que PSL representa. O discurso fácil, baseado no imediatismo e na aceitação popular, sem olhar a consequências. Perigosamente alheio às consequências das suas próprias palavras e acções.
“Poupar o povo a eleições” é uma piscadela de olho àquele eleitorado que está farto da política e dos políticos, que, provavelmente, se abstém frequentemente, que não possui definição ideológica, que está tão separado da política que já não se interessa sobre quem faz o quê a quem. Na realidade, ainda mais do que a este eleitorado, PSL quer chegar aos que se reconhecem nesta saturação mas ainda são passíveis de ser mobilizados. Este é o primeiro ponto característico, que já tem sido numerosas vezes referido, da forma de estar na política de PSL. A preferência pelo apelo à emotividade e não à racionalidade. Porque, de facto, não se conhecem linhas de racionalidade na intervenção política de PSL. Em todos os cargos que já ocupou nunca se lhe conheceu uma fundamentação do pensamento político.
PSL quer ser – e nalguns meios é – conhecido pela obra. PSL quer que a acção funcione como produto de substituição do pensamento. Na ausência de capacidade, vontade, disciplina (o que quer que seja) para reflectir e planear, o acto é hiper-valorizado. Uma hiper-valorização artificial em que o produto final é desprovido de utilidade, de contextualização, de conexão com a própria realidade, em que as consequências nunca foram previstas ou, na melhor das hipóteses, foram menosprezadas.
O que nos remete para um segundo ponto. Na equação política que PSL formula, as consequências nunca têm lugar como variável. O perigo desta concepção da política é óbvio. Nos cargos políticos que tem ocupado, PSL tem tido a responsabilidade de gerir dinheiro que é de todos nós. Cada risco mal calculado, cada erro de planeamento e de execução é um custo suportado pelo erário público. Servem como exemplo a trapalhada do túnel do Marquês, a trapalhada do Parque Mayer, a trapalhada com o casino. Como poderão servir de exemplo as perigosas precedências da construção em altura na zona ribeirinha e da rentabilização imobiliária do Monsanto. Ou ainda a desmesurada proliferação de outdoors promocionais (muitas vezes quase no campo do culto da personalidade), a confusão, muitíssimo mal explicada e que ninguém parece recordar, da convocação de manifestações de apoio com o selo da CML, as ausências na CML para cumprir compromissos particulares, a sobreposição dos diversos papéis dos quais não abdica e a sobre-exposição a que voluntariamente se sujeita (edil, político, analista, comentador, opinion maker, etc.). Os custos já não se situam somente no âmbito financeiro, mas sim também no âmbito urbanístico, ambiental, político, ético e democrático.
É provável que PSL nem se aperceba da gravidade de muitos dos seus actos. Talvez não compreenda, pelo menos em tempo útil, como é grave o afastamento entre eleitores e eleições, entre eleitores e eleitos, que implicitamente propõe. Talvez não compreenda que, para quem se gaba de disputar e ganhar eleições, não resulta muito coerente tal afirmação. Talvez não compreenda que reduzir os actos eleitorais a períodos de fastio cuja principal característica são as fotografias dos candidatos em cartazes de rua é simplista, redutor e ilusório. É com este tipo de discurso que se quer combater a abstenção e credibilizar a política? PSL não compreende que é o maior inimigo de si mesmo. O problema é que as vítimas somos todos nós.

Poupar quem a quê?!

Não vi a entrevista de Pedro Santana Lopes na televisão. Nem sequer me apercebi que ela se realizaria, senão teria feito o esforço. Leio agora algumas das suas palavras, referidas por vários blogues. Entre elas engasgo-me especialmente com a vontade de “poupar o povo a eleições”. Esta ideia condensa tudo o que PSL representa. O discurso fácil, baseado no imediatismo e na aceitação popular, sem olhar a consequências. Perigosamente alheio às consequências das suas próprias palavras e acções.
“Poupar o povo a eleições” é uma piscadela de olho àquele eleitorado que está farto da política e dos políticos, que, provavelmente, se abstém frequentemente, que não possui definição ideológica, que está tão separado da política que já não se interessa sobre quem faz o quê a quem. Na realidade, ainda mais do que a este eleitorado, PSL quer chegar aos que se reconhecem nesta saturação mas ainda são passíveis de ser mobilizados. Este é o primeiro ponto característico, que já tem sido numerosas vezes referido, da forma de estar na política de PSL. A preferência pelo apelo à emotividade e não à racionalidade. Porque, de facto, não se conhecem linhas de racionalidade na intervenção política de PSL. Em todos os cargos que já ocupou nunca se lhe conheceu uma fundamentação do pensamento político.
PSL quer ser – e nalguns meios é – conhecido pela obra. PSL quer que a acção funcione como produto de substituição do pensamento. Na ausência de capacidade, vontade, disciplina (o que quer que seja) para reflectir e planear, o acto é hiper-valorizado. Uma hiper-valorização artificial em que o produto final é desprovido de utilidade, de contextualização, de conexão com a própria realidade, em que as consequências nunca foram previstas ou, na melhor das hipóteses, foram menosprezadas.
O que nos remete para um segundo ponto. Na equação política que PSL formula, as consequências nunca têm lugar como variável. O perigo desta concepção da política é óbvio. Nos cargos políticos que tem ocupado, PSL tem tido a responsabilidade de gerir dinheiro que é de todos nós. Cada risco mal calculado, cada erro de planeamento e de execução é um custo suportado pelo erário público. Servem como exemplo a trapalhada do túnel do Marquês, a trapalhada do Parque Mayer, a trapalhada com o casino. Como poderão servir de exemplo as perigosas precedências da construção em altura na zona ribeirinha e da rentabilização imobiliária do Monsanto. Ou ainda a desmesurada proliferação de outdoors promocionais (muitas vezes quase no campo do culto da personalidade), a confusão, muitíssimo mal explicada e que ninguém parece recordar, da convocação de manifestações de apoio com o selo da CML, as ausências na CML para cumprir compromissos particulares, a sobreposição dos diversos papéis dos quais não abdica e a sobre-exposição a que voluntariamente se sujeita (edil, político, analista, comentador, opinion maker, etc.). Os custos já não se situam somente no âmbito financeiro, mas sim também no âmbito urbanístico, ambiental, político, ético e democrático.
É provável que PSL nem se aperceba da gravidade de muitos dos seus actos. Talvez não compreenda, pelo menos em tempo útil, como é grave o afastamento entre eleitores e eleições, entre eleitores e eleitos, que implicitamente propõe. Talvez não compreenda que, para quem se gaba de disputar e ganhar eleições, não resulta muito coerente tal afirmação. Talvez não compreenda que reduzir os actos eleitorais a períodos de fastio cuja principal característica são as fotografias dos candidatos em cartazes de rua é simplista, redutor e ilusório. É com este tipo de discurso que se quer combater a abstenção e credibilizar a política? PSL não compreende que é o maior inimigo de si mesmo. O problema é que as vítimas somos todos nós.

segunda-feira, julho 05, 2004

Democracia ou não, eis a questão

Vasco Lobo Xavier consegue publicar três textos (ELEIÇÕES OU NÃO, EIS A QUESTÃO I, II e III) no Mar Salgado sobre a realização ou não de eleições antecipadas iludindo sempre as consequências para a sanidade democrática do nosso sistema. Mas, mais do que isso, VLX quer fazer crer aos seus leitores que a argumentação dos que defendem a realização de eleições também não passa por aí. O que é falso. Os argumentos de maior peso para a convocação de eleições, como já é sobejamente conhecido, passam sobretudo pela necessidade imperiosa de não se deixar beliscar, nem que seja minimamente, a legitimidade democrática. É toda uma conjugação de variáveis que está em casa e não um resultado numas eleições europeias. É, mais que tudo, a devolução aos eleitores da palavra sobre os projectos e os nomes dos seus representantes. Porque, no contexto actual, mais vale ter Santana a vencer nas urnas do que outro qualquer carecendo desta legitimação.
VLX pretende também estabelecer o primado da economia nas regras de regulação de um país. Mas, desta vez, a economia não só prevalece sobre o político e o social, como também impera sobre as elementares regras de decoro democrático. Se os empresários pensam que a democracia atrasa a retoma, então que se dane a democracia. O que VLX propõe é que se troquem eleições por hipotéticos resultados económicos. Ora, quem quiser vender a alma pelos trinta dinheiros da ordem que o faça. Mas que o faça consciente que esta transacção é absoluta. Não há inflexões nem meios caminhos. Não há tons de cinzento. Só preto e branco. Quem não vende, não vende. Quem vende, vende. É simples e permite, desde logo, saber do que é que alguns estão dispostos a prescindir em troca do precioso recheio da carteira.
As análises políticas existem para todos os gostos. Mas um texto que defende que uma vitória eleitoral é negativa para o partido vencedor merece a nossa admiração. VLX está à espera que a tendência de crescimento da esquerda se inverta numas eleições legislativas. E para isso conta com as recordações da governação PS. Sim, conta que os eleitores se recordem do tempo em que os trabalhadores tinham mais direitos, as empresas não faliam com tanta frequência, a economia funcionava melhor, o Estado cobrava mais impostos com menos taxas, a lista de espera na Saúde era só uma, não se vendiam os anéis e os dedos para disfarçar um défice que, ainda assim, era mais baixo, os ministros, regra geral, sabiam onde começava a responsabilidade política e demitiam-se quando era caso disso. Um tempo em que o primeiro-ministro não abandonava os seus compromissos para aceitar cargos europeus. Sobretudo, os eleitores recordar-se-ão do tempo em que, quando o PM se demitia, o partido no poder pedia aos eleitores que dissessem de sua justiça votando e não impunha soluções dinásticas. Sim, VLX quer que os eleitores se recordem do tempo em que os deixavam votar e os governantes não recorriam a pequenos esquemas e a vãs tentativas de perpetuação nas cadeiras do poder. Mas o que é que se pode esperar de uma figura que apelida os actos eleitorais de “jogos a feijões”. Talvez a democracia não seja o seu forte. Talvez VLX também seja daqueles que pensa que o Estado Novo só se metia com quem estava mesmo a pedi-las e que quem não fazia ondas até podia levar uma vidinha descansada. Assim compreendem-se melhor os textos que publicou sobre o Estado Novo e o 25 de Abril, embora ele possa dizer que não, que estava só a provocar. Cada um acredita no que quiser.

Momento deve ser isto a idade adulta da noite

Saber que, apesar do nó na garganta, apesar do irremediável fim da ilusão, as lágrimas já não vão aparecer como há dez ou quinze anos apareceriam.

Momento ironias da vida da noite

Momento ironias da vida da noite
O choro compulsivo de Cristiano Ronaldo, que embora jogue no Manchester United ainda não ganhou nada, a contrastar com a aparente frieza dos jogadores do FC Porto, que já ganharam tudo o que havia para ganhar.

Momento revivalismo desportivo da noite

A profundíssima certeza de que sempre que voltar a rever aquela marcação de canto vou repetir incessantemente: “Antecipem-se! Não deixem cabecear!”. Precisamente da mesma forma que sempre gritei para o Veloso: “Para o outro lado! Chuta para o outro lado!”.

Momento populista da noite II

O ministro da Defesa envergando o seu sorriso número 3 quando Portugal desperdiçava oportunidades de golo. Aquele sorriso de anúncio de pasta dentífrica, que fica bem nas fotografias mas mostra à exaustão que o ministro não percebe nada da natureza do futebol, nem que lhe tentem explicar com desenhos para colorir.

Momento populista da noite

O casal Durão Barroso empunhando uma bandeira made in China, daquelas com pagodes no lugar dos castelos.

Momento arrepio na espinha da noite

Aparecer na 2ª Circular, a caminho de casa, atrasadíssimo para o jogo e seguindo o relato no auto-rádio. Chegar à curva que leva à Avenida Lusíada, aquela que passa mesmo ao lado do estádio, tirar o som ao rádio e sentir de fora, separado pelo cimento, todo o ruído de sessenta mil almas a vibrar em conjunto.

domingo, julho 04, 2004

Parabéns

Quase que perdia o aniversário do Bloguítica. Um dos blogues mais interessantes do meu circuito diário. Um abraço para o Paulo Gorjão e votos de que continue a animar a blogosfera como tem feito até agora por muito mais tempo.

sexta-feira, julho 02, 2004

Rogério Borges

Este é o homem responsável por ninguém ter visto, em directo, o estupendo golo de Maniche. O que é que este tipo merecia?

Verbo

Eu sobrestimo
Tu sobrestimas
Ele sobrestima
Nós sobrestimamos
Vós sobrestimais
Eles sobrestimam

Parabéns...

...ao Rui Branco e ao seu Adufe.

Leitura recomendada

As Opções do Presidente e a Qualidade da Democracia Portuguesa - Pedro Magalhães

Para Quê Votar? - Miguel Sousa Tavares

quinta-feira, julho 01, 2004

(Des)continuidade

Com a demissão de Durão Barroso, caso a Assembleia não seja dissolvida, o que passamos a ter, de facto, é um novo governo suportado pela mesma composição parlamentar. Algo que está em perfeita consonância com a separação entre o poder legislativo e o poder executivo. Desta forma, a desejável credibilidade dos nomes que compõem o novo executivo não se pode confundir com a necessidade de manter o mesmo rumo de políticas governativas. Até porque o grande objectivo do governo de Durão Barroso – a redução do défice – não foi, de forma alguma, alcançado. Apesar das medidas extraordinárias para o encobrir, estruturalmente continuamos com um défice excessivo. E isto tendo em conta todos os sacrifícios que foram exigidos à população. Verdadeiramente, não há qualquer razão para que se queira impor uma continuidade nas linhas políticas do novo governo que aí vier. Pelo contrário, as alterações são, até, muito bem-vindas. O grande problema consiste no facto de se estar a querer impor uma solução que além de carecer de legitimidade, carece também de credibilidade. Se se confirmar um governo liderado por Pedro Santana Lopes, não só não se pode esperar qualquer melhoria significativa como há fortes possibilidades de ficarmos numa situação ainda mais problemática em curto espaço de tempo. Não é de uma continuidade que o país precisa. É de uma ruptura.