terça-feira, novembro 30, 2004

Acendam uma velinha ao santo

Jorge Sampaio vai dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas.

Olha a grande novidade

Governo Bate Recordes Negativos

segunda-feira, novembro 29, 2004

Jorge Sampaio e o PS perante a degradação do situação política

As opiniões dividem-se entre os que defendem que o Presidente deve convocar eleições quanto antes e os que acreditam na fórmula pedagógica de deixar a coligação cumprir o seu mandato integralmente. Pelo meio sempre vai havendo quem argumente que Jorge Sampaio aguarda o momento mais adequado para retirar o suporte a Santana Lopes e a Paulo Portas, momento esse que ocorrerá quando o PS atingir o seu momento mais forte como alternativa.
Existem várias objecções que se podem colocar a esta teoria. Primeiro que tudo, não é admissível que o país, na sua vertente social e económica, continue a sofrer às mãos de um governo manifestamente mal preparado para as suas funções. A experiência pedagógica, para além de ser bastante discutível como tal, tem um custo elevadíssimo. Estamos a assistir a uma degradação galopante do cenário político, a uma deterioração das condições de vida da população, a um enfraquecimento dos direitos de protecção social e a uma tentativa de subversão de princípios fundamentais do funcionamento democrático da sociedade. É incompreensível que se pretenda continuar a sujeitar a sociedade portuguesa a tamanhas provações, até porque as consequências de muitos destes actos são não só gravíssimas como provavelmente de difícil ou mesmo impossível correcção. A colocação de comissários políticos na comunicação social, na administração pública e nas empresas com participação do Estado está em curso e promete ser um dos assuntos mais difíceis de corrigir. Quando um novo governo tomar posse, haverá lugares estratégicos ocupados por pessoas que não possuem mais qualificações para as suas funções do que os laços pouco transparentes com os políticos que os nomearam. Como é que esse governo poderá obviar esta questão? Demitindo os implicados, com as já famosas indemnizações que isso acarreta, ou através de uma convivência previsivelmente conflituosa?
Em segundo lugar, é politicamente insustentável que o Presidente da República, amiúde definido por outros e por si mesmo como “o Presidente de todos os portugueses”, defenda implícita ou explicitamente os interesses de uma força partidária em particular. O Presidente da República é uma garantia do regular funcionamento das instituições, uma figura que zela pelos interesses de todos e não pelos interesses de somente alguns. É incompreensível que se defenda uma perspectiva que privilegie os interesses eleitorais do PS em detrimento dos interesses sociais e económicos, e até democráticos, do país. Não há sustentação lógica nem ética para este género de argumentação.
Já quando ocorreu a crise originada pela demissão de Durão Barroso, o que se pedia com as eleições antecipadas era que se legitimasse politicamente o novo governo, apesar do apoio parlamentar que suportava e suporta a coligação PSD-PP. Nunca se pediu que se desse a hipótese a uma determinada força política de ascender ao poder, aproveitando um momento de fraqueza do governo de então. O que se queria era que o eleitorado, dadas as condições específicas da situação, fosse chamado a pronunciar-se. Se a vitória tivesse sorrido à coligação, seria essa a solução com que teríamos de nos contentar. O governo daí resultante teria a legitimidade política de que este carece, sendo certo que com Santana Lopes como PM e com o mesmo leque de ministros a desacreditação pela acção governativa seria uma consequência igualmente inevitável.
Quero crer que a inacção do Presidente em matéria de convocação de eleições antecipadas se deve ao custo político de se contradizer em tão curto espaço de tempo. Jorge Sampaio está preso à decisão que tomou. Quanto mais cedo retirar o apoio ao actual executivo maior será a percepção da dimensão do seu erro de análise. A posição do Presidente está, portanto, muito mais enquadrada numa perspectiva de gestão da sua identidade política, procurando sair desta situação o menos desacreditado possível, do que noutra perspectiva qualquer, seja ela pedagógica ou o que se lhe queira chamar.
Mas se, por outro lado, Jorge Sampaio considerasse realmente a opção de aguentar o actual executivo em função das conveniências eleitorais de determinado partido poderíamos afirmar que o Presidente teria perdido completamente a noção das suas funções e se teria afastado dos conceitos básicos que devem presidir ao seu exercício. Neste caso, Sampaio já não seria apenas um mero espectador da degradação da vida política do país e do nosso sistema democrático, mas sim um interveniente activo nessa mesma degenerescência dos valores fundamentais que o regulam.
Evidentemente, de um ponto de vista político e eleitoral, ao PS pode interessar aguentar um pouco mais a actual situação. Será sempre preferível que as eleições ocorram num momento em que o partido constitua uma alternativa credível, com um conjunto coeso de propostas e de estratégias, sob pena de parecer que os resultados eleitorais são mais uma derrota da coligação do que uma vitória do PS. Mas este interesse particular não deixa de colidir com a realidade tal como foi caracterizada acima. A situação do país continua a agravar-se e o PS move-se num delicado equilíbrio entre a maximização dos proveitos políticos da inabilidade governamental de Santana Lopes e o mero oportunismo político. A única solução viável para o PS passa por cerrar fileiras, definindo rapidamente uma linha de acção que se apoie em medidas alternativas concretas inseridas num projecto consistente, e pedir a convocação de eleições antecipadas quanto antes. O país agradeceria.

Enquanto Sampaio aguarda

Henrique Chaves demitiu-se na sequência da remodelação governamental. Está tudo dito. Se ainda fossem precisos exemplos da forma de actuação que Santana Lopes imprime no seu consulado, este seria o caso perfeito. Não há como argumentar que a principal fonte de instabilidade não é o primeiro-ministro. Se noutros casos se inferia a responsabilidade de Santana Lopes, neste está absolutamente explícita a sua interferência e a relação directa com as consequências conhecidas.
Santana Lopes é um muito mau primeiro-ministro, coadjuvado por muito maus ministros. Poder-se-ia dizer que não é possível chegar mais baixo, politicamente falando. Mas a política portuguesa é pródiga a gerar desilusões sobre desilusões.

sexta-feira, novembro 26, 2004

Um jeito natural para interagir com os outros povos

"Ó brasuca! Não há picante?", pergunta o distinto cavalheiro da mesa ao lado à empregada brasileira.

Sempre a aprender

Tenho dúvidas sobre a utilidade do Túnel do Marquês para o trânsito lisboeta. Tenho dúvidas que seja um investimento prioritário, útil e seguro. Mas eu não percebo nada de engenharia civil nem de estudos de impacto ambiental e por isso não posso falar muito.
Mas, pelo menos, já fiquei a saber que as causas do atraso crónico nacional não se devem a quem manda avançar com obras sem ter efectuado todas as diligências recomendáveis. Devem-se, isso sim, a quem procura que só se avance depois de ter feito essas diligências. E que quem procede assim, no fundo, só quer "publicidade para lhe alimentar o já bastante inchado ego". Já os que avançaram com os projectos iniciais sem justificar a sua utilidade, a sua prioridade e a sua segurança, esses não devem ter egos para alimentar.

Também há-de passar

O nome deste blogue não tem mesmo nada a ver com Espanha. Tem sobretudo a ver com este país. E eu estou um bocado farto dele.

Há-de passar

Hoje não me apetecia ter um blogue chamado Viva Espanha. Apetecia-me antes ter um blogue que copiasse descaradamente o nome de um bom livro. Algo que não recorresse a trocadilhos ou a pequenas provocações. Por exemplo, ter um blogue chamado A Insustentável do Ser e publicar exclusivamente textos sobre o amor, ou até sobre sexo, e sobre como podem ser tão iguais e tão diferentes. Ou um blogue chamado Cem Anos de Solidão e escrever sobre a melancolia dos dias frios de Inverno. Ou ter um blogue chamado O Retrato de Dorian Gray e discutir as implicações da beleza na moral humana.
Um blogue chamado Viva Espanha é que não. Pelo menos, hoje não.

Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro

Parece incrível mas há cargos políticos com este nome.

quinta-feira, novembro 25, 2004

Mysterious ways

Só há uma forma de entender esta semana. O Altíssimo decidiu contrabalançar a alegria de celebrar os aniversários das pessoas que amo com doses reforçadas de labuta profissional e horas intermináveis de reuniões estéreis, o que me impediu de escrever em tempo oportuno sobre tantas coisas que me parecem importantes que me sinto mesmo muito aborrecido com isso. E agora parece-me mal amalgamar tudo num post, coisa que já se presta tão pouco a reflexões extensas, quanto mais a súmulas das preocupações semanais.
Não me satisfaz porque queria dizer mais sobre a aberração humana e urbanística que são os bairros sociais, sobre os rígidos critérios e fiscalizações para atribuir rendimentos e subsídios a quem já não tem quase nada, sobre a má fé de colocar o ónus de prova em pessoas que, muito provavelmente, têm poucos estudos, se tiverem alguns, e pouco tempo para perder nessa idiossincrasia nacional que é a burocracia levada ao extremo. Ou sobre o insulto e o contra-senso que são os deferimentos tácitos nos licenciamentos autárquicos, sobre a forma como se dá de mão beijada a paisagem aos interesses económicos ligados à construção e ao turismo, mas se parte do pressuposto que quem recorre ao RSI ou ao subsídio de desemprego é por natureza oportunista e mal intencionado. Ou sobre esta batalha para meter os do costume a pagar a factura, os que trabalham por conta de outrem e declaram ao fisco todo o pouco que ganham, os que não podem fugir por lado nenhum, os que estão e nunca hão-de deixar de estar mesmo a jeito para pagar as contas dos outros. Ou então sobre a insanidade de remodelar um governo que tem quatro meses, ou coisa que o valha, de tempo de trabalho, sobre a forma bonita como as fidelidades caninas são recompensadas com um lugarzito alternativo como ministro e sobre a esquizofrenia de se discordar hoje do que se aprovou ontem.

Mas sobretudo o que mais me aborrece é não ter tido tempo de dizer como amo e como são tão importantes para mim, tão fundamentais, as duas pessoas que fizeram anos esta semana. Sinto-me grato por existirem e por fazerem parte da minha vida.

segunda-feira, novembro 22, 2004

Capciosa

Foi assim que ouvi caracterizar a pergunta do referendo e é difícil encontrar melhor palavra para o fazer. Tal como está formulada, a pergunta é deliberadamente confusa e tendenciosa. Enquanto não tivermos outra (se viermos a ter outra), que se comece a discutir as questões essenciais do futuro da UE o mais brevemente possível. Até porque esta pergunta, com todos os seus defeitos, não deixa de ser um bom ponto de partida.

quinta-feira, novembro 18, 2004

Até quando?

A desfaçatez com que o governo se descarta das conclusões da AACS é simplesmente assustadora. Mostra que para este executivo o respeito, a honra e a vergonha não parecem ocupar lugar de relevo no exercício de funções. Mostra que esta gente está disposta a passar por cima de muita coisa, incluindo a perversão dos princípios da democracia, para se manter em funções.

De quantas mais razões precisará Jorge Sampaio?

Assobia para o ar

As conclusões da AACS apontam claramente para pressões ilegítimas e ameaças à independência dos órgãos de comunicação social. Não é nada que já não tenha sido comentado na altura devida em inúmeros locais. Mas com a comunicação destes resultados torna-se politicamente insustentável manter Rui Gomes da Silva e Nuno Morais Sarmento no governo. São assim as regras da responsabilidade política. O que não quer dizer, claro, que eles venham a demitir-se ou a ser demitidos. São assim as regras do compadrio e da bebedeira do poder.

Sem fronteiras

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras está em vias de ver posto em causa o seu regular funcionamento. A renovação de contrato com pessoal administrativo está a ser adiada por falta de despacho do Ministério da Administração Interna e as consequências podem levar ao encerramento de alguns departamentos ou, em alternativa, à recolocação de "agentes de rua" em tarefas administrativas.
A situação é ainda mais escandalosa se tivermos em conta que este governo alberga um dos maiores demagogos securitários e xenófobos dos últimos tempos. Os discursos inflamados de Paulo Portas no seu tempo de oposição não têm qualquer correspondência com uma real preocupação desta coligação em conferir capacidade operacional ao SEF, o que revela à transparência a retórica esvaziada de intenções do líder do PP em particular e da coligação em geral.
No actual contexto internacional, sem cair em histerias securitárias nem em fundamentalismos nacionalistas, os Serviços de Informações e os Serviços de Fronteiras constituem peças-chave para agir contra as ameaças da criminalidade organizada e do terrorismo. O estado a que se está a deixar chegar estes serviços revela uma irresponsabilidade gritante e um profundo desrespeito por todas as pessoas que dependem do SEF para verem reconhecidos os seus direitos. Com a agravante de que neste caso a incompetência pode sair muito cara.

Alto astral




Ministro da Defesa, do Mar e da Fuga Para A Frente

Instado a comentar as conclusões da AACS, Paulo Portas afirmou "Estou num dos dias mais gratificantes da minha vida como ministro da Defesa, quero lá saber dessas coisas". É justo. Eu quando estou num dos dias mais gratificantes da minha vida como cidadão anónimo também não quero saber Paulo Portas para nada. Nos restantes vou oscilando entre a vergonha e indignação.

quarta-feira, novembro 17, 2004

A dinâmica do PCP

Miguel Coelho, presidente da concelhia de Lisboa do PS, em declarações ao Público sobre as premissas de uma futura coligação para as autárquicas na capital, refere que "a haver coligação, ela será de certeza com o Bloco, cujo eleitorado é muito mais dinâmico do que o do PCP".
Não se percebe muito bem o que quererá Miguel Coelho dizer com isto. Se estiver a falar de eleitorado num sentido lato, é incompreensível que a força eleitoral do PCP seja subalternizada desta maneira em relação ao BE. No mínimo, e mesmo com a erosão eleitoral que tem vindo a sofrer, o PCP representa o dobro ou o triplo dos votos do BE em Lisboa. Representa também uma estrutura muito mais homogénea e perfeitamente habituada à realidade de campanha eleitoral, quer como oposição quer como executivo, experiência esta que não pode ser despicienda. Não se pode esquecer o facto de que nas próximas autárquicas, caso exista coligação à esquerda, apesar de o actual executivo ser de direita, o PS e o PCP ver-se-ão, com toda a certeza, obrigados a evocar e a responder pelo trabalho feito durante os mandatos de Jorge Sampaio e de João Soares.
Por outro lado, se Miguel Coelho estiver, na realidade, a falar da militância dos respectivos partidos, ninguém poderá recusar que, apesar do menor mediatismo (sobre o qual há muito para dizer), a produção de uma máquina partidária com a expressão e as características do PCP ultrapassa, e muito, a capacidade do BE. Não se pode confundir o talento para aparecer nos noticiários com a capacidade de mobilização e de trabalho das respectivas militâncias. De facto, a única forma de dar sentido à afirmação do dirigente socialista é considerá-la em termos de oportunidades mediáticas. Mas isso não se fica a dever à apatia do PCP, mas às prioridades editoriais dos diversos órgãos de comunicação social.
Não está em causa a inclusão do BE numa hipotética coligação de esquerda para a CML. O que está em causa é que a dinâmica que o PCP consegue criar junto dos seus militantes e simpatizantes é provavelmente das mais fortes no espectro partidário nacional. Não faltam por esta blogosfera, quer como leitores quer como bloguistas, muitos antigos e actuais militantes e simpatizantes comunistas que podem, com a autoridade das suas experiências directas, corroborar esta evidência.

Não fumar

No dia em que fumei o meu último cigarro prometi a mim mesmo que não me tornaria num desses ex-fumadores ferozmente anti-tabagistas. Ainda não cheguei lá, mas sinto que me afasto cada vez mais da minha promessa. Muito resumidamente, é bastante ingrato ver os esforços e eventuais benefícios desta opção postos em causa com o fumo passivo. Por vezes, torna-se mesmo exasperante.
Certamente, tudo se poderia resumir a uma questão de bom-senso. Seria muito bom se se pudesse honestamente esperar de todos os fumadores um comportamento responsável e respeitador. Como em muitos outros casos, dos quais a condução é um óptimo exemplo, esperar esta responsabilidade e respeito mútuo é uma utopia. Continua a haver quem fume em locais proibidos, assim como continua a haver quem se mantenha impávido perante o desconforto de outros com o seu fumo. Talvez nem sejam as situações mais frequentes, mas acontecem, incomodam e os não-fumadores têm o direito de não estar sujeitos a elas. Para mais, é ainda notória a má preparação de muitos espaços para o convívio entre fumadores e não-fumadores, nomeadamente no que diz respeito aos espaços de lazer, facto que afasta muitos potenciais usufruidores. Desta forma, é a minoria de fumadores que acaba por se impor na definição do espaço público.
Por tudo isto, acaba por fazer sentido adoptar legislação mais restritiva, se bem que se recomende igualmente o bom-senso. O que seria desejável é que os espaços públicos fossem concebidos para não-fumadores, e não o inverso como agora se verifica, estabelecendo-se zonas específicas para fumadores que também não merecem ser votados ao ostracismo. Não custa reconhecer que a dependência que o tabaco provoca, juntamente com a aceitação social existente, tornam necessárias medidas que não excluam os fumadores. Mas esta inclusão não poderá continuar a fazer-se à custa do bem-estar dos não-fumadores.

terça-feira, novembro 16, 2004

Reinserção social

Autoridades alemãs planeiam construir prisão adaptada para idosos
A Alemanha planeia começar a construir, brevemente o primeiro estabelecimento prisional da Europa desenhado especificamente para albergar detidos da terceira idade.

A medida surge numa altura em que o número de detidos idosos tem vindo a crescer. Desde 1995, o número de criminosos com mais de 60 anos inseridos no sistema prisional alemão aumentou 28%. Só nos últimos dias, três assaltantes com idades de 63, 72 e 74 anos foram detidos, depois de 30 anos de carreira.
A cadeia para reformados terá celas com capacidade albergar andarilhos e cadeiras de rodas. As instalações serão também equipadas com um spa e sessões de fisioterapia. Todas as camas e instalações sanitárias terão corrimões de apoio, e haverá uma equipa de enfermeiros de serviço 24 horas por dia, prestando cuidados continuados de saúde.
De acordo com uma porta-voz do ministério da Justiça, Jutta Rosendahl, a ideia surge porque actualmente o país «não tem instalações adequadas para detidos idosos». «Os reformados não precisam de salas de musculação ou formação profissional. Precisam de aconselhamento sobre o que fazer com o tempo livre, para não reincidirem no crime», acrescentou.


A dimensão da reinserção social, tantas vezes desprezada nos sistemas prisionais, parece assumir neste caso uma clara preocupação das autoridades alemãs. Evidentemente, os serviços prisionais cumprem uma função reparadora e tranquilizadora para a sociedade em geral. Ao privar o criminoso da sua liberdade, o sistema prisional permite que a sociedade se sinta justiçada através do castigo aplicado, ao mesmo tempo que transmite uma sensação de segurança pela separação entre cidadãos cumpridores e prevaricadores.
O que ficou escrito acima indica a maior preponderância da sociedade para encarar a prisão como local de punição, o que se vem a traduzir numa orientação política em conformidade. É muito pouco provável que as entidades que tutelam este sistema estejam dispostas a pagar o preço político de implementar verdadeiras condições de reinserção social. No entanto, os índices de reincidência criminal levam a reconsiderar esta estratégia. O custo social, e até económico, da reincidência criminal pode perfeitamente tornar viável uma forma alternativa de conceber o sistema prisional.
Desta forma, o sistema prisional deve apostar no reforço da sua função reintegradora, proporcionando condições que constituam hipóteses exequíveis para os reclusos. Daqui decorrem custos bastante acrescidos, mas que poderão ser amplamente compensados pelo que se ganha com a participação de um cidadão plenamente integrado na sociedade e pelo que se poupa no sistema judicial e prisional com os indivíduos que se vêem cronicamente envolvidos neste ciclo.

segunda-feira, novembro 15, 2004

Regresso à infância em tons de inveja

Onde é que estavam estes parques infantis quando eu tinha idade e tamanho para usufruir deles?

Um congresso sem história (até o anedotário é mau)

Se bem compreendo, ao estilo do que Avelino Ferreira Torres andou a fazer em Marco de Canavezes, o novo hino do PSD alude ao nome do actual líder. Imagino que haja sociais-democratas muito envergonhados com aquilo em que o partido se está a transformar.

sexta-feira, novembro 12, 2004

A ética na política

"Alguns comentadores de direita têm insistido em ver no desfecho das eleições americanas uma batalha por valores que a esquerda perdeu - o que lhes serve de argumento para exclamar, cheios de "gozo", que os valores da "velha esquerda" estão mortos e, enquanto não forem revistos, só a conduzirão às derrotas, hoje nos Estados Unidos, amanhã na Europa. Têm razão na análise, mas a lição que pretendem extrair é simplesmente amoral. Houve, de facto, uma batalha por valores nestas eleições americanas, e os valores emergentes da nova direita derrotaram os valores da velha esquerda. Mas ainda bem que houve essa batalha, que a esquerda preferiu o risco da separação das águas do que a tentação de se adaptar aos ventos hoje dominantes. Ainda bem que houve essa clarificação, mesmo que ela tenha deixado a América profundamente dividida ao meio, em termos que preocupam até os próprios vencedores. Mil vezes perder uma eleição do que perder a razão."

Miguel Sousa Tavares

Texto completo no Público

O biológico e o social

Um texto na Aba de Heisenberg sobre um dos temas mais interessantes que se apresentam para reflectir o cruzamento do social com o biológico. São experiências como estas que ajudam a desmontar os mitos dos “dons naturais” de certas pessoas. A personalidade/identidade do indivíduo é muito mais complexa do que as interpretações naturalistas, psicologistas e sociologistas podem fazer crer.

quinta-feira, novembro 11, 2004

Big brother

Pacheco Pereira explora no Público as transformações sociais introduzidas pela generalização do uso do telemóvel na nossa sociedade. Na análise de JPP destacam-se duas consequências relevantes. Nomeadamente, a introdução de uma nova dimensão de má educação, associada à incomunicabilidade, e a limitação à privacidade que decorre desta impossibilidade social de permanecer incontactável.
Evidentemente, admitindo estas duas hipóteses, levantam-se alguns desafios ao respeito e manutenção dos espaços privados. Não porque o conteúdo das novas formas de controlo seja radicalmente diferente, mas apenas porque as tecnologias evoluíram de uma maneira que tornam mais permeável o espaço privado. Afinal, o controlo formal e informal de terceiros é algo com o qual convivemos frequentemente no dia-a-dia, até mesmo em contextos de quotidiano familiar.
No fundo, tudo se pode resumir a questões éticas que já se equacionam há muito tempo. Quem já consegue respeitar os limites do bom senso e opta por não sacrificar os meios aos fins a alcançar, muito provavelmente conseguirá manter esta postura independentemente da tecnologia ao seu dispor. A nível institucional, no entanto, sobretudo no que diz respeito às entidades que zelam pelos direitos e garantias dos cidadãos na área da protecção de dados e informações, não é de desprezar a ideia de jogar pelo seguro, conferindo-lhes a capacidade de dar resposta às novas exigências.

quarta-feira, novembro 10, 2004

Sinalização

Temos que admitir que este país tem uma questão cultural com as sinalizações. A sinalização, quando existe, é muitas vezes confusa, incompleta ou enganadora, tornando-se assim inútil. Estas situações são tão comuns que temos que nos interrogar se constituem um mera negligência ou se já fazem parte de uma certa forma de agir. Ou seja, se em vez de estarmos a falar de um descuido, de uma alteração ao que deveria ser o padrão, não estaremos já perante uma forma de funcionamento sistemática, estruturada, que se constitui como característica dominante e não como desvio.
Se esta hipótese estiver correcta, a definição das situações em que potencialmente poderá estar envolvido algum tipo de sinalização já parte do princípio da existência de um défice de informação. A expectativa associada a essas situações é a de não esperar facilidades nesse campo, de tal forma que uma boa sinalização será recebida com surpresa e agrado e não com a relativa indiferença de um acontecimento regular.
Desenvolver sinalização simples e eficiente pode custar tempo e dinheiro. Mas também seria interessante contabilizar os custos que advêm da actual forma de proceder.

terça-feira, novembro 09, 2004

A "naturalidade" no casamento

Continuo a surpreender-me com a facilidade com que vinga o argumento da “naturalidade” nas relações conjugais. Foi, mais uma vez, o caso do artigo do Prof. Mário Pinto nesta segunda-feira. Entre outras ideias, defende o Prof. Mário Pinto que “deve ainda hoje valer, no novo contexto da cultura e da civilização actuais”, um sentido essencial de protecção da maternidade associado ao matrimónio. Desta forma, o casamento tem uma função “natural” procriadora, obviamente inacessível aos homossexuais, pelo que a equiparação dos casamentos homo e heterossexuais revelaria uma clara assimetria, já que só os segundos podem resultar em procriação. Mais ainda, Mário Pinto afirma que “se a sociedade se organizasse agora na base do casamento homossexual, só duraria a presente geração”.
Todo o raciocínio deste ponto do artigo de Mário Pinto está tão eivado de preconceitos, ideias feitas e incorrecções que é difícil começar a criticá-lo. As opções são tantas que dificultam a concentração de esforços.
A ideia de força do seu texto é o carácter “natural” da procriação no matrimónio. Esta ideia parte de um pressuposto de fundamentalismo biológico do relacionamento humano. Ainda que admitindo que o casamento cumpriu historicamente esta função (o que, já de si, pode ser muito discutível), ao contrário do que Mário Pinto afirma, já não faz sentido querer impor socialmente esta concepção. No “contexto da cultura e da civilização actuais” (das nossas, supõe-se), nem a reprodução sexual tem de estar necessariamente ligada ao casamento nem este tem de estar relacionado com aquela. Podemos mesmo dizer que existe uma independência considerável entre um e outra.
Os significados atribuídos ao casamento e à reprodução, felizmente, como todas as coisas, vão sofrendo alterações à medida que as sociedades se transformam culturalmente. O Homem é um ser cultural, pelo que os significados simbólicos se vão alterando ao longo dos tempos e podem ser reinterpretados pelas novas gerações. Já passámos a fase das pulsões e determinismos biológicos há vários milhares de anos. O casamento, enquanto união entre duas pessoas, hoje em dia, passa pelo menos tanto pelo desejo de comunhão de duas vidas como pelo desejo de procriação. É verdade que ainda se casa para que o fruto de uma gravidez não planeada veja a luz do dia no seio de uma relação matrimonial. Mas este facto define muito mais o casamento como instituição legitimadora da procriação do que a procriação como instituição legitimadora do casamento.
Mesmo a visão da sexualidade evoluiu muito para lá do fenómeno reprodutivo. Das inúmeras relações sexuais entre pessoas de sexo oposto, seria interessante poder contabilizar quantas têm como objectivo específico a procriação e quantas têm como objectivo a partilha de prazer. Assim, o casamento não tem nenhuma característica “natural” inerente. Tem, sim, uma profusão de características culturais que não só mudaram ao longo dos tempos, como divergem de sociedade para sociedade. Esta diversidade, por si só, é suficiente para desfazer o mito da “naturalidade” do que quer que seja, mas Mário Pinto preferiu, convenientemente, ignorá-la.
Querer reduzir a essência do casamento à função procriadora é perfeitamente castrador da liberdade humana de redefinição cultural e constitui uma negação tácita da legitimidade dos diversos estilos de vida. Não tem, por isso, que existir uma assimetria entre casamento homossexual e casamento heterossexual, na medida em que a procriação não é o objectivo do casamento, muito menos o seu “fim natural”. Os homossexuais estão tão limitados no campo da procriação como os casais heterossexuais estéreis e não se pretende certamente questionar a legitimidade do casamento neste último caso.
Em campos donde não resulta prejuízo quer para as partes envolvidas, quer para terceiros, o Estado deve abdicar de envolver-se condicionando as opções de cada um. Faz tanto sentido impedir o casamento entre duas pessoas como obrigá-las a contrair matrimónio contra a sua vontade. O casamento entre pessoas do mesmo sexo não ameaça nada nem ninguém, nem rompe com os pressupostos “naturais” porque estes pura e simplesmente não existem, não passando de criações sociais. Mas ainda que rompesse não haveria muito a fazer pois, sem prejuízo de terceiros, trata-se de um direito inalienável à diferença a à auto-determinação individual. Se algumas confissões religiosas não quiserem reconhecer o casamento entre pessoas do mesmo sexo é algo que devem resolver no seu seio. Mas como deve existir uma separação de facto entre o Estado e a moral religiosa, nenhuma confissão pode querer impor a sua visão particular da realidade ao conjunto da sociedade. E têm que se habituar a isso, de uma vez por todas.

O Descrédito também comenta este texto.

Ofende muita gente, pá

Calvin: Hobbes, achas que a nossa moralidade é definida pelos nossos actos, ou por aquilo que nos vai no coração?
Hobbes: Acho que os nossos actos mostram o que nos vai no coração.
Calvin: ISSO OFENDE-ME!

Pensar a morte

Mas as baixas são inevitáveis. Alguns fuzileiros ocuparam por isso o tempo a escrever cartas "para o caso de" - missivas de agradecimento, elogio e despedida dirigidas aos entes queridos; às vezes as cartas ficam com amigos, outras são metidas no blusão.
"É a primeira vez que penso na morte", garante Stephen Ross O'Rourke, de 19 anos, de Cincinnati, Ohio, que acabou de escrever uma carta ao pai, embora não a tenha enviado. "Penso que ninguém devia ter de escrever uma carta destas", acrescenta.


Muito menos miúdos de dezanove anos. Dezanove anos. Mais um do que o meu irmão, menos nove do que eu próprio.

segunda-feira, novembro 08, 2004

Mas mesmo tudo

Sobre este rectângulo de terra à beira-mar, já Eça de Queiroz disse tudo o que havia para dizer. O que, para além de fazer de Eça um escritor singularmente perspicaz, prova que a mentalidade reinante não se alterou muito desde o século XIX.
Continuemos...

Deve ser isto o combate à fraude

Estado deixa prescrever processos de dívida

A razão é não existir orçamento para cobrir as custas judiciais.

quinta-feira, novembro 04, 2004

Aniversário

Dez anos de Arpad Szenes - Vieira da Silva.

quarta-feira, novembro 03, 2004

Uma boa notícia num dia mau

Históricos da ETA apelam ao abandono das armas

Uma boa notícia num dia mau

Históricos da ETA apelam ao abandono das armas

The world is not enough

Este blogue é publicado a partir de uma cidade em que o presidente da Câmara se chama Carmona Rodrigues, de um país em que o primeiro-ministro se chama Santana Lopes e o Presidente que o escolheu se chama Jorge Sampaio, de uma União Europeia em que o Presidente se chama Durão Barroso e de um mundo em que o homem mais poderoso se chama George Bush. Para onde é que se pode fugir?

A televisão tal e qual ela é

Cultura democrática, dizem eles

Uma jovem foi absolvida, ontem, do crime de aborto em mais um julgamento decorrente da actual lei. O que mais choca neste caso nem é o enquadramento legal que continua a suportar estes julgamentos, mas sim a forma como o caso chegou a tribunal. Tanto a Ordem dos Enfermeiros como a Ordem dos Médicos estão a apurar a responsabilidade de dois profissionais supostamente envolvidos na denúncia do caso às autoridades, algo que viola claramente os códigos deontológicos e o sigilo profissional a que estão obrigados. Como se já não nos bastasse uma lei totalmente desajustada, agora temos de nos preocupar com as delações pseudo-moralistas de pessoas em quem devíamos ter confiança.

The World Says No To Bush

...mas quem vota são os americanos e parece que têm uma opinião diferente.

Indecision 2004

Parece estar tudo muito mal encaminhado...