segunda-feira, julho 05, 2004

Democracia ou não, eis a questão

Vasco Lobo Xavier consegue publicar três textos (ELEIÇÕES OU NÃO, EIS A QUESTÃO I, II e III) no Mar Salgado sobre a realização ou não de eleições antecipadas iludindo sempre as consequências para a sanidade democrática do nosso sistema. Mas, mais do que isso, VLX quer fazer crer aos seus leitores que a argumentação dos que defendem a realização de eleições também não passa por aí. O que é falso. Os argumentos de maior peso para a convocação de eleições, como já é sobejamente conhecido, passam sobretudo pela necessidade imperiosa de não se deixar beliscar, nem que seja minimamente, a legitimidade democrática. É toda uma conjugação de variáveis que está em casa e não um resultado numas eleições europeias. É, mais que tudo, a devolução aos eleitores da palavra sobre os projectos e os nomes dos seus representantes. Porque, no contexto actual, mais vale ter Santana a vencer nas urnas do que outro qualquer carecendo desta legitimação.
VLX pretende também estabelecer o primado da economia nas regras de regulação de um país. Mas, desta vez, a economia não só prevalece sobre o político e o social, como também impera sobre as elementares regras de decoro democrático. Se os empresários pensam que a democracia atrasa a retoma, então que se dane a democracia. O que VLX propõe é que se troquem eleições por hipotéticos resultados económicos. Ora, quem quiser vender a alma pelos trinta dinheiros da ordem que o faça. Mas que o faça consciente que esta transacção é absoluta. Não há inflexões nem meios caminhos. Não há tons de cinzento. Só preto e branco. Quem não vende, não vende. Quem vende, vende. É simples e permite, desde logo, saber do que é que alguns estão dispostos a prescindir em troca do precioso recheio da carteira.
As análises políticas existem para todos os gostos. Mas um texto que defende que uma vitória eleitoral é negativa para o partido vencedor merece a nossa admiração. VLX está à espera que a tendência de crescimento da esquerda se inverta numas eleições legislativas. E para isso conta com as recordações da governação PS. Sim, conta que os eleitores se recordem do tempo em que os trabalhadores tinham mais direitos, as empresas não faliam com tanta frequência, a economia funcionava melhor, o Estado cobrava mais impostos com menos taxas, a lista de espera na Saúde era só uma, não se vendiam os anéis e os dedos para disfarçar um défice que, ainda assim, era mais baixo, os ministros, regra geral, sabiam onde começava a responsabilidade política e demitiam-se quando era caso disso. Um tempo em que o primeiro-ministro não abandonava os seus compromissos para aceitar cargos europeus. Sobretudo, os eleitores recordar-se-ão do tempo em que, quando o PM se demitia, o partido no poder pedia aos eleitores que dissessem de sua justiça votando e não impunha soluções dinásticas. Sim, VLX quer que os eleitores se recordem do tempo em que os deixavam votar e os governantes não recorriam a pequenos esquemas e a vãs tentativas de perpetuação nas cadeiras do poder. Mas o que é que se pode esperar de uma figura que apelida os actos eleitorais de “jogos a feijões”. Talvez a democracia não seja o seu forte. Talvez VLX também seja daqueles que pensa que o Estado Novo só se metia com quem estava mesmo a pedi-las e que quem não fazia ondas até podia levar uma vidinha descansada. Assim compreendem-se melhor os textos que publicou sobre o Estado Novo e o 25 de Abril, embora ele possa dizer que não, que estava só a provocar. Cada um acredita no que quiser.

1 Comments:

At 9:08 da manhã, Blogger Miguel Silva said...

Talvez o texto devesse ter terminado umas linhas mais cedo. Mas VLX foi o bloguista que decidiu conduzir um "estudo de caso" na blogosfera e eu não gostei de me sentir cobaia. Enfim, mesmo assim, talvez o texto devesse ter terminado umas linhas mais cedo.

 

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