E porque hoje é segunda-feira...
...João César das Neves escreve no DN. Ao longo do seu espaço de opinião JCN vai vendendo a ideia de que as elites europeias ostracizaram a religião, para terminar no cliché da falta de valores da sociedade moderna.
A asneirada é tanta que é difícil responder em pouco espaço. Tentemos ainda assim...
De facto a religião viu-se afastada de determinados campos da sociedade. Nomeadamente, do campo da ciência e do campo da política. No primeiro caso por uma questão de método, no segundo por uma questão de justiça. Até aos nossos dias a investigação científica tem conseguido sobreviver com esta opção. Parece até ter feito alguns tímidos progressos. Por seu lado, a política não deixou de ter em consideração a religião, limitou-se a efectuar uma necessária separação de poderes. O Estado é laico e assim sendo - não tendo religião - é o Estado de todas as religiões. Desta forma a liberdade religiosa é uma realidade incontestável na Europa ocidental.
Quanto à falta de prova da inexistência de Deus, da alma ou da vida depois da morte o professor acerta. Esquece-se, convenientemente, é de referir as provas da sua existência. Aliás, ou muito me engano ou é por aí que se constrói a fé de cada um. Sem possibilidade de verificações empíricas cada um faz as opções que a consciência lhe dita. Não há constrangimentos a esse respeito.
Daqui JCN evolui para uma confusão demasiado perigosa para passar impune. Misturar no mesmo saco "Racionalismo, Iluminismo, Utilitarismo, Marxismo, Positivismo, Nazismo, Existencialismo" seria ridículo se não fosse abjecto. O legado de cada um destes ismos fala por si próprio e o do nazismo clama a vida de perto de 40 milhões de pessoas. Promover a doutrina nazi a este nível revela um profundo desprezo pelo sofrimento a que foi sujeito o mundo durante mais de uma década. Quanto a este assunto estamos conversados.
Mas talvez esta estranha concepção do nazismo ajude a justificar o branqueamento da Inquisição que é feito de seguida. Tanto as Cruzadas como a Inquisição são produtos de época. Relevam da mentalidade da altura e não poderão ser avaliadas à luz dos valores do século XXI. Mesmo assim, se alguém puder apontar em que parte dos Evangelhos Cristo apela ao belicismo, ao genocídio e à tortura como forma de espalhar a Palavra que esteja à vontade.
É óbvio que a religião não se eclipsou na Europa. Pelo contrário, ocupa um lugar de relevo e de importância fundamentais. Mais ainda, neste início de século podemos afirmar que temos uma Europa religiosamente mais rica. A diversidade religiosa, sobretudo relacionada com os fenómenos de migração, permite um maior contacto entre culturas. Num contexto de liberdade religiosa, como é o caso, potencia-se a tolerância e a compreensão mútua o que é sempre louvável.
Para terminar, caracterizar a Europa como culturalmente indigente é ridículo, absurdo e estúpido. Não há falta de valores. Há conjuntos valorativos que privilegiam a individualidade e a competição e, mesmo não se partilhando estes modelos, não se pode negar a sua existência. Não há, pura e simplesmente, sociedades sem valores e sem cultura.
As dinâmicas da modernidade promovem solidariedades orgânicas. Talvez a desorientação seja uma das suas consequências, mas a indigência cultural não é certamente.
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