quinta-feira, novembro 06, 2003

Consenso? Qual consenso?

Comentar assuntos polémicos, por definição, não gera consensos. Já estava à espera que assim fosse quando me propus, de forma resumida, a comentar as posições das Igrejas sobre os sexos e a sexualidade, apoiado no mais recente exemplo Anglicano, mas sem esquecer o exemplo católico, que é o que nos diz mais respeito. O meu post suscitou a resposta do Acanto. Quanto aos argumentos ali esgrimidos, acrescento o seguinte. Não me interessa o número de mulheres ou de homossexuais a ocupar cargos de relevo. Não me interessa a quantidade em si, mas antes a qualidade. O que é importante é que existam condições reais de igualdade de acesso, independentemente do sexo, da opção sexual, da cor da pele, da religião, da ideologia, etc.. Não sei, ao certo, quantas mulheres existem na política nem quantos homossexuais são líderes partidários. Aliás, a opção sexual é um aspecto da intimidade de cada um e não afecta o rendimento laboral. Assim como o facto de se ser mulher também não. Mas passa mais facilmente despercebida a opção sexual do que o género.
Dir-me-ão que o papel da mulher na Igreja é o espelho do papel da mulher na nossa sociedade. Eu diria o contrário. O papel da mulher na nossa sociedade é o espelho do papel da mulher na Igreja. Ou para as coisas más já não somos uma sociedade de influência judaico-cristã? A subalternização e as dificuldades acrescidas que as mulheres enfrentam na sociedade são, numa parte significativa, um reflexo do que a Igreja estabeleceu. Isto é incontornável e está mais que na altura de começar a ser assumido.
Não conhecendo em pormenor todas as doutrinas da Igreja católica, parece-me despropositado que, no início do século XXI, a uma mulher lhe seja negada a hipótese de desempenhar as mesmas funções que um homem desempenha. Por que é que as mulheres não podem ser ordenadas? E, já agora, se os clérigos suprimem a sua sexualidade (curioso conceito), por que é que há tanta resistência à homossexualidade no seio da Igreja? Por que é que a Igreja se sente tão ameaçada pela homossexualidade? Julgo que um mundo de gente apaixonada, quaisquer que sejam as orientações sexuais, é sempre preferível a um mundo de frustrações impostas por concepções atávicas do comportamento humano.
Se as Igrejas funcionassem por consensos encontrariam lugar para todos no seu seio. Só que as Igrejas não funcionam por consensos, funcionam por dogmas. E é esta a principal objecção a uma revisão e actualização das suas representações da sociedade.