A revolução e a evolução
Os cartazes alusivos ao 25 de Abril não têm nada de ingénuo. Evidentemente, Abril representa uma melhoria extremamente significativa em todos os campos da vida portuguesa. É até inteiramente compreensível que a coligação PSD-PP utilize Abril para colher alguns dividendos políticos. Foi Abril que fez desta geração de políticos o que ela é. Sem a revolução esta realidade não seria viável. Sempre que a acção política portuguesa contribui para o reforço da democracia está a reforçar a herança do 25 de Abril. Por isso, é legítimo que Abril seja evocado por todos os quadrantes políticos e não apenas por alguns sectores. Sem que, no entanto, se constate essa verdade elementar que consiste no facto de Abril ter sido uma revolução de esquerda contra um regime ditatorial de direita.
Mas o emprego da palavra evolução neste contexto específico tem uma conotação pejorativa. Caracterizar o 25 de Abril como uma mera evolução constitui uma afronta à rotura criada nessa data. Porque, de facto, reduzir Abril a uma evolução implica um certo branqueamento da miséria política, social e económica que o regime salazarista se empenhou em perpetuar. Utilizar um termo como ‘evolução’ esbate as diferenças abissais entre o pré e o pós 25 de Abril. Presta-se, assim, um mau serviço à verdade histórica e à educação das novas gerações.
Tudo poderia parecer apenas mal pensado. Somente mais uma insensatez daquelas a que a coligação governamental nos tem habituado. Seria assim se não houvesse a nítida sensação de que existe um propósito definido de matizar o que o 25 de Abril representou e pretende continuar a representar. Em cada cartaz transpira uma vontade de esconder as conquistas alcançadas. Como se as liberdades e garantias proporcionadas por Abril pudessem ser enquadráveis num continuum político em que o acto da revolução, desta forma, perde todo o significado. Um relativismo extremo, portanto, da parte de quem tanto critica os relativismos, que ajuda a escancarar as portas já entreabertas da regressão das garantias sociais.
No fundo, é isto que torna inqualificável a campanha orquestrada pela coligação governamental. Não é só a incompetência, é a falsidade.
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