quinta-feira, junho 17, 2004

Porquê Ferro Rodrigues

Ferro Rodrigues como líder do PS e Ferro Rodrigues como Primeiro-Ministro são duas coisas diferentes. FR tem sido sistematicamente acusado de ser um fardo para o PS e de não permitir que o partido se assuma como alternativa. Os votos têm dito o contrário. É claro que podemos falar de estratégias. É claro que se pode criticar a liderança socialista pelas opções políticas que tem. Mas se essas críticas são feitas tendo por base a hipotética diminuição de uma base eleitoral mostram-se, até agora, infundadas. Isto parece-me uma realidade evidente. O PS de FR aparece à frente nas sondagens e acabou de ganhar as eleições de uma forma contundente. O PS de FR pode ser a “solução menos má”, como costuma ser referido. Mas, por muito mau que seja, constitui a solução preferida pela maioria dos eleitores. Nas corridas, eleitorais o menos mau é o que ganha.
Não são os partidos dos extremos que estão a crescer, excepção feita ao BE. É a coligação que ocupa o poder que está a perder e essa transferência de votos está a dar-se preferencialmente para o PS. O tal PS de FR que alienava o voto e que não tinha condições de disputar vitórias eleitorais. Muito honestamente, esta análise parece-me totalmente independente de uma pessoa se rever no PS ou na sua actual liderança.
Outro facto é o que é que esta liderança do PS conseguirá mostrar se ganhar as legislativas. Qual a governação que vamos ter, quais as principais áreas de intervenção, quais as reformas propostas? Parecendo-me que o capítulo da capacidade de FR para ganhar eleições está resolvido, entre outras, estas são as perguntas que realmente interessam.
Admito que as minhas intervenções têm sido quase sempre em defesa do actual líder do PS. Esta labuta teve início aquando do período mais difamatório do processo Casa Pia. O timbre inicial dessas posições limitava-se a afirmar que a calúnia nunca poderia servir de suporte à crítica política. O que pretendi salientar, desde aí, foi a legitimidade da liderança de FR e o seu direito a disputar eleições sem se ver boicotado interna e externamente. Sou pouco dado a intrigas e a golpes palacianos. Quem quiser o lugar de FR que o afirme claramente. Esta direcção tem o direito a não ver o seu trabalho, independentemente do valor que lhe atribuamos, condicionado pelo boicote dissimulado e sistemático. Aliás, toda a gente que ocupe uma posição e execute o seu projecto de uma forma legítima tem este direito.
Tenho defendido que a política não pode ser refém de um fundamentalismo táctico. É necessário que as estratégias de médio e longo prazo sejam reconhecidas, valorizadas e difundidas. Perante o desinteresse aparentemente crescente de uma boa parte dos eleitores, a solução não pode passar senão por uma exigência crescente. Exigência em relação aos projectos, em relação às pessoas, em relação ao exercício. Continuo plenamente convencido que se FR não tivesse resistido ao véu difamatório que sobre ele caiu isso só contribuiria para o decrescimento de qualidade da nossa política, da nossa justiça, da nossa comunicação social e da nossa cidadania. Por este motivo, principalmente, escrevi muitas vezes a favor do actual líder do PS. Por outro lado, também sempre me pareceu estranho a enorme onda de contestação a FR. Sobretudo quando me parece que essa contestação se apoia mais na vontade de satisfazer ambições pessoais, ou de grupos muito particulares dentro do PS, e a servir de seguro de vida a um governo fraquíssimo. Se me quiserem explicar que FR dá um mau PM, tudo bem. Se for essa a razão para o PS mudar de líder, é perfeitamente compreensível. Se quiserem apear FR em nome de interesses mal explicados ou uma suposta ineficácia eleitoral, já é outra conversa. Se FR chegar a PM e meter as mãos pelos pés, cá estarei para receber o julgamento das minhas opiniões. São as vantagens e os inconvenientes de fazer as coisas às claras. É mais do que muitos candidatos a ocupar lideranças partidárias podem dizer.