quarta-feira, julho 07, 2004

Esperar por 2006

Se partirmos do princípio de que uma governação de esquerda é preferível a uma governação de direita, então um executivo liderado por Pedro Santana Lopes nunca poderá ser uma boa solução. É claro que esta preferência pode ser posta em causa, por exemplo, pelo pessoal de direita. Adiante. Por uma questão de princípio, considero preferível um compromisso claramente assumido a uma ausência de ordem meramente táctica, tendo em vista interesses particulares. Neste caso, se o PS optasse por esperar por 2006 seria uma ausência que poderia, a prazo, talvez, beneficiar o interesse particular do partido, enquanto mobilizar esforços para alcançar o governo já na actual conjuntura seria pensar no interesse do país.
O país precisa de mudar de políticas imediatamente. Mais dois anos de governo PSD-PP é uma pena que não se deve querer impor aos portugueses. A natureza liberal da governação PSD-PP não lhes permite estabelecer uma governação que reconheça a importância do Estado. Da mesma forma, também não é expectável que seja a partir desta segunda metade da legislatura que a coligação irá inverter a tendência de sacrificar as pessoas em detrimento dos números. Por isso, a melhor solução não pode passar senão pela alteração rápida e profunda de rumo. O que não constitui a base de argumentação para a antecipação das eleições. Essas razões, como já tenho referido, são de outra ordem.
Vem tudo isto a propósito de uma pequena provocação do Irreflexões. Se, por este prisma, que eu tenho quase a certeza que é partilhado pelo próprio Irreflexões, não faz sentido considerar benéfica uma governação liderada por PSL, por outro lado também não é líquido que daí resultem vantagens, ainda que meramente eleitorais, em 2006. Existem duas razões para não darmos como absolutamente certa uma retumbante vitória da esquerda em 2006 depois de dois anos com PSL como primeiro-ministro. Em primeiro lugar, a previsível tendência eleitoralista de um governo nestas condições é notória. Será virtualmente impossível que PSL resista à sua natureza, tornando este governo muito mais visível que o anterior. Para o fazer PSL precisa de gastar dinheiro. Precisa de iludir o eleitorado, criando uma aparente situação de prosperidade. Ora, uma das maiores bases de apoio com que PSL conta são os autarcas. São autênticos postos avançados, onde o contacto com o eleitorado é muito mais directo. Assim sendo, os autarcas apoiam PSL na sua ascensão a PM, PSL retribui apoiando os autarcas nas eleições de 2005 e os autarcas voltam a retribuir apoiando as pretensões de PSL para as legislativas de 2006. Está criado um ciclo de dependências mútuas que se auto-alimenta. Um factor não pode ser menosprezado.
O segundo aspecto deriva da propaganda que PSL consegue facilmente montar. Como já se tornou claro no executivo da CML, PSL não recua perante a necessidade de distorcer a realidade à medida das suas conveniências ou de catapultar actos de gestão corrente a medidas de “carácter estrutural”. Como tem sido também notório nesta fase que atravessamos, PSL e o seu séquito recorrem sem pudor à intoxicação informativa. Se em meios com algum acesso à informação este fenómeno poderá não ser tão bem sucedido, noutros os desmentidos nunca alcançarão o mesmo mediatismo da intriga que os precedeu.
Talvez isto não seja o suficiente para vencer umas legislativas em 2006 depois de dois anos de governação. Tenho esperança que, caso este cenário se confirme, à esquerda se levante uma oposição activa e coordenada, com tanta capacidade de reacção ao populismo como de criação de propostas alternativas viáveis. Uma oposição capaz de gerir a vantagem eleitoral que, neste momento, aparentemente possui. Mas, da mesma forma que acredito nisto, também estou convicto que o combate eleitoral em 2006 seria muito mais difícil do que à partida se possa imaginar.

1 Comments:

At 6:36 da tarde, Blogger cparis said...

mas olhe lá miguel... ainda há dois anos mandava a esquerda e pelos vistos mudaram... 10 anos de cavaco seguidos de 6 de guterres... parece óbvio o que é que o povo quer... tudo (esquerda ou direita) menos eleições... :-)

 

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