terça-feira, setembro 27, 2005

A liberdade do espaço íntimo

De vez em quando, caio no erro de ler uma edição da Grande Reportagem que sai ao sábado com o DN. É um erro porque a comparação entre o que esta revista é e o que já foi dá pena. De meio de referência nas publicações mensais a suplemento semanal recheado de mau jornalismo foi um pequeno passo. É um facto e agora há pouco que se possa fazer para o contrariar.
Esta semana a GR decidiu oferecer aos seus leitores uma selecção de palavrões produzidos por políticos nos últimos anos. Curiosa selecção, esta, que mistura declarações públicas com comentários produzidos em privado, apenas conhecidos devido a mais uma famosa violação do segredo de justiça, relacionada com (oh surpresa!) o processo Casa Pia. Lá apareceu, então, o inevitável Ferro Rodrigues, mas também os menos conhecidos desabafos de José Sócrates e de Manuel Alegre.
É bastante estranho que se misturem estes dois registos – o público e o privado – como se não houvesse diferenças entre eles. Qualquer pessoa adopta diferentes registos consoante o contexto em que se encontra e é perfeitamente natural que num registo privado – portanto, íntimo – se permita liberdades discursivas que, por regra, não emprega em situações públicas ou formais. Este tipo de comportamento não tem, em si, nada de especial. O desvio à norma, neste caso, é mesmo a incapacidade de adaptar o seu discurso às situações.
Pode dizer-se que estas variações, mais calão, menos calão, são comuns a qualquer pessoa. E um político é, antes de tudo, uma pessoa. Em privado nem sequer será outra coisa. Mais do que isso, se trocar as prioridades e privilegiar o político em detrimento da pessoa, nunca chegará longe nem como um nem como outra. De resto, como em tudo na vida.