segunda-feira, março 01, 2004

A luta entre o essencial e o acessório

No Tugir, Luís Novaes Tito dá boa réplica aos que querem reduzir a política a uma feira de vaidades. Argumentar sobre as qualidades estéticas dos candidatos é não só idiota mas também perigoso. E é perigoso porque se confunde uma análise da realidade, em que a estética ocupa inegavelmente um lugar destacado, com a acção que se deve operar sobre a mesma realidade. Ou seja, uma coisa é constatar que a forma tem, nestes tempos, preponderância sobre o conteúdo. Outra, completamente diferente, é pactuar com isso e ajudar a perpetuar essa distorção. O foco da questão deve estar sempre centrado nos conteúdos. Não é produtivo, e chega a ser pernicioso, discutir o circo que se gera à volta de determinados políticos da mesma forma que se discutem os conteúdos políticos. Como se o espectáculo mediático complementasse ou substituísse a escassez de ideias, por vezes escassez de ideais, de propostas, de acção política.
É perfeitamente impossível evitar a mediatização da política. Lamentavelmente não se podem ganhar eleições à revelia dos meios de comunicação. Sabemos que, para a eficácia da comunicação, a forma como a mensagem é transmitida chega a ser tão importante como a própria mensagem. No entanto, nenhuma destas verdades é comparável à injustiça que se comete ao privilegiar a forma sobre o conteúdo. Quando se ataca candidatos pela sua menor habilidade em dominar as técnicas essenciais à sobrevivência mediática, estamos a descer aos níveis mais baixos da reflexão sobre a realidade política. De facto, muitas vezes nem sequer estaremos a reflectir sobre política mas sim sobre espectáculo.
LNT afirma ‘que se o objectivo é ganhar eleições, mais importante é saber para quê, como fazer e com que competência’. Tem razão. Mas eu colocaria ainda mais a tónica na acção transformadora das sociedades que a política constitui. Porque, apesar de sabermos que sem vitórias eleitorais dificilmente se alcança esse objectivo, demasiada atenção sobre o resultado eleitoral abre as portas à dominação do acessório sobre o essencial.