segunda-feira, julho 12, 2004

O preço de uma decisão

Não vale a pena repisar os argumentos esgrimidos nas duas últimas semanas sobre a convocação de eleições antecipadas. Interessa sobretudo manifestar o profundo desapontamento com a decisão do PR. Jorge Sampaio traiu a sensibilidade política dos que o elegeram, colocando-se no campo político oposto ao que lhe deu a sua base de apoio. A escolha era sua e qualquer decisão tinha suporte legal. Por aí nada a acrescentar. O que se impunha, e o que se verificou, foi uma decisão estritamente de interpretação política de uma situação. E, neste sentido, dada a interpretação do PR, é legítimo questionar se foi para este tipo de interpretações políticas que a esquerda elegeu Jorge Sampaio. A resposta é óbvia.
Certamente, Jorge Sampaio decidiu, segundo a sua convicção, o que julgou melhor para o país. É isso, talvez, o que custa mais. Que o que o PR julga melhor para o país se afaste tanto dos cidadãos. Entre a participação dos cidadãos eleitores, legitimando a representatividade do parlamento que suporta o governo, e uma solução concertada com os interlocutores privilegiados do costume, o PR decidiu-se pela segunda. Foi um tiro na pedagogia política, na participação cívica e na credibilidade da democracia. Jorge Sampaio jamais se livrará deste estigma. Da mesma forma que, no final do seu segundo mandato, desbarata o capital de simpatia que reunia junto do eleitorado. A direita nunca o apreciou e tão cedo a esquerda não voltará a confiar nele. Não há muito mais cargos que Jorge Sampaio queira assumir na política interna. Mas se o quiser realmente fazer, terá de equacionar muito bem a forma de o fazer. Quebrar as bases de confiança da forma que o PR fez costuma ter um preço alto.