Um erro em cima de outro
O que eu gostava era que me explicassem por que é que a imaturidade dos partidos tem que ser interpretada como um defeito do sistema eleitoral? Os partidos políticos estão a atravessar uma crise mais ou menos profunda – dependendo do partido em questão e da benevolência da abordagem que se queira fazer. A qualidade da política e dos políticos tem vindo a diminuir nos últimos anos, existe um afastamento crescente entre eleitores e eleitos, há défice de democracia no funcionamento interno das organizações partidárias, existem lógicas clientelares em todos os partidos e registam-se vagas sucessivas de nomeações parasitárias para o aparelho de Estado. Perante isto, a abstenção cresce desde que existe democracia – fenómeno especialmente sentido nos casos em que o eleitor tem mais dificuldades em vislumbrar a sua relação com o acto eleitoral, como nas eleições para a UE – e o eleitorado votante sente dificuldades em fazer uma opção clara entre as forças políticas que se apresentam a escrutínio. Evidentemente, pode discutir-se a preparação do eleitorado para avaliar as propostas apresentadas, mas, nestas questões, a maior parte da responsabilidade cabe, sem dúvida, às forças partidárias.
Ora, se o actual sistema eleitoral permite a formação de maiorias absolutas e se estas não surgem mais vezes é porque a diversidade de expressões políticas assim o determina. O que não se pode fazer é querer transformar duas maiorias absolutas de partido único em toda a história de eleições legislativas e a existência de dois partidos que, em termos eleitorais, têm vindo a consolidar-se como as maiores forças nacionais numa tendência eleitoral para maiorias absolutas. Defender tal argumentação é distorcer a história eleitoral democrática à medida das conveniências actuais desses dois partidos e não uma análise objectiva do que tem vindo a acontecer.
Por outro lado, existe a ideia – errada – de que a governabilidade e a representatividade são incompatíveis (ver Bloguítica). O que existe é uma imaturidade política e democrática e uma falta de competência dos partidos e dos políticos que têm tido a seu cargo a governação. As coligações e os acordos parlamentares não são, em si, um mau exemplo de governação ou da democracia. Pelo contrário, podem constituir uma boa opção de prós e contras entre duas ou mais forças políticas. O problema da coligação PSD-PP não está no facto de ser uma coligação, mas sim (se não se levar em conta as reservas ideológicas que se possa ter contra a linha política por ela definida) nos actores políticos que estiveram em palco nos últimos dois anos e meio e na sua manifesta incompetência e falta de preparação para o exercício dos cargos. O que nos coloca novamente no ponto de partida: os problemas de governabilidade residem sobretudo nos partidos políticos e não no sistema eleitoral. Residem no facto de personalidades sem o menor perfil para ocupar cargos de responsabilidade brotarem nos partidos como cogumelos e ascenderem incompreensivelmente a posições de relevo. É este o problema que deve ser estudado e solucionado. Tudo o que passe por uma alteração do sistema eleitoral é, nestes termos, uma inversão de prioridades e um prémio à mediocridade.
1 Comments:
caro miguel, a sua aborgadem é pertinente e tem alguma razão.
no entanto não posso deixar de Lhe fazer notar que o principal problema do nosso sistema politico é a facilidade com que se provocam eleições...
esta facilidade faz com que os politicos ganhem (ou pensem que ganhem) muito mais derrubando o mais votado, em vez de cooperarem com ele.
Repare que, por exemplo, nas Câmaras Municipais há maior governabilidade porque após as eleições já se sabe que só há novas eleições passados 4 anos. Deste modo vê espalhadas pelo país coligações que visam "resolver" os problemas durante 4 anos. Repare que há até as coligações mais improváveis tipo PSD+CDU como é o caso de Coimbra.
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