A demissão de Ferro Rodrigues
Embora compreensível, a decisão de Ferro Rodrigues não foi a mais desejável. Depois de tudo o que atravessou, esperava-se que FR resistisse até ao congresso, antecipado ou não. Esperava-se que FR se apresentasse com as suas propostas, de peito aberto, para calar definitivamente os opositores internos ou para cair de pé perante os lobos. FR podia ter capitalizado o descontentamento da esquerda com a decisão de Jorge Sampaio permanecendo na liderança do PS. Podia ter confrontado todos aqueles que não se pronunciaram, por calculismos exclusivamente pessoais, sobre a delapidação da democracia. Na realidade, se alguém podia sair beneficiado com esta situação, FR estava seguramente entre eles. O empenho que colocou na defesa de eleições antecipadas jogaria a seu favor.
Ao sair, FR deixa o PS entregue à direita. A oposição de esquerda, enquanto não se definir a situação interna do PS, fica entregue ao PCP e ao BE. Ironicamente, é precisamente quando sai que FR dá mais razão aos que tanto o acusaram de promover as intenções políticas dos partidos à esquerda do PS. Se se confirmar que a liderança do partido vai ser ocupada pela direita do PS, então mais razões terá o eleitorado de esquerda que não se revê nessas posições para se refugiar nos partidos ainda mais à esquerda. Em compensação, o PS poderá ganhar votos ao centro, o chamado eleitorado flutuante. Um eleitorado que ajuda a ganhar eleições, mas que não acrescenta massa crítica aos partidos. Tão depressa vem como vai, meramente ao sabor das conjunturas. Como o PS descobriu com António Guterres, tentar agradar aos dois lados da barricada resulta mal, tanto nas votações como nas governações.
Tenho defendido que a liderança de FR foi minada por dentro e por fora, o que condicionou toda a sua actuação. Afirmei que FR reunia condições para chegar às legislativas, assim o permitissem. Não porque a sua liderança fosse imune às críticas, mas porque me pareceu que poderia apresentar um projecto alternativo àquilo que tem sido comum na moderação centrista do PS dos últimos anos. Agora que se demite, dificilmente se vislumbra oportunidade para que a esquerda do PS possa voltar a imprimir outro rumo à forma de fazer política do partido.
Se, com uma liderança moderada, dita de centro-esquerda, o PS ganhar as próximas legislativas – e eu, apesar de tudo, espero que sim –, mas sem maioria absoluta, como é que este centro-esquerda moderado vai conseguir as imprescindíveis aprovações dos Orçamentos de Estado? À sua esquerda ou à sua direita? A situação não está mais fácil para o PS só porque a sua liderança vai mudar.
1 Comments:
A demissão de Ferro Rodrigues é compreensível, mas não nos termos em que a colocou... ao falar em "derrota pessoal" significa que se a opção fosse outra teria uma "vitória pessoal" ?? Ou seja, que tinha sido um favor de amigo?? absurdo ter levado a questão pessoal para aquela conferência...
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