Acabar com o Estado II
Em casos como o anterior é possível identificar uma estratégia. Há um interesse em não investir na melhoria dos serviços e em deixá-los atingir o ponto de saturação. Há um interesse claro em não proporcionar ao utente um serviço de qualidade, bem organizado e bem gerido. Trabalha-se pouco e mal e gasta-se muito e mal. A estratégia é justificar a alienação dos serviços a cuja prestação o Estado está vinculado. Pelo meio, vai-se espalhando a mensagem da ineficácia, do despesismo, da falta de vocação do Estado para acumular todo o tipo de serviços. Vai-se alimentando a animosidade do cidadão contra o Estado para que a solução de alienar os serviços pareça ter todo o sentido. A estratégia passa por criar um Estado que pareça não se importar com os seus cidadãos para que estes também não se importem muito com o Estado. Para que continue a ser tolerável, por exemplo, fugir criminosamente aos impostos. Para que, finalmente, o Estado se possa demitir das suas funções vitais, cedendo-as aos interesses privados. É assim com a saúde, com a Segurança Social e agora também com as dívidas fiscais.
Acontece que o Estado, apesar de ser sempre tratado como uma entidade abstracta, possui rostos e nomes. Possui responsáveis, renováveis de quatro em quatro anos, que devem ser chamados a responder pelas escolhas que fazem e pelas consequências que estas acarretam. Se o Estado funciona mal é, em grande parte, porque quem tem a obrigação de o fazer funcionar melhor não está a cumprir a sua missão, quer seja por manifesta incompetência, quer seja por falta de vontade, ou outros obscuros interesses. Enquanto alguns contribuem activamente para a deterioração dos serviços estatais e outros assistem impávidos, resta-nos a esperança de haver também quem ainda vá resistindo, denunciando a lenta erosão do país.
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