quarta-feira, outubro 20, 2004

Alternativas partidárias

Meti-me numa agradável troca de correspondência com o Evaristo do Abrangente que acabou por transbordar para os blogues. No essencial, andamos a discutir as vantagens da multiplicidade partidária. A argumentação do Evaristo parte de vários pressupostos que, na minha opinião, podem ser muito discutíveis.
No parlamento nacional estão representadas cinco forças políticas. Para o Evaristo parece ser já um número que peca por excesso, uma vez que a multiplicidade partidária leva à dispersão de votos. Mas para se aceitar esta ideia é preciso que se subvertam algumas regras de bom senso democrático. Por princípio, os eleitores escolhem a força política que lhes pareça mais conveniente. As sociedades modernas são caracterizadas por uma profunda heterogeneidade social, cultural e até ideológica. Embora a dicotomia esquerda-direita continue a fazer todo o sentido, em muitos aspectos essa heterogeneidade provoca intersecções ideológicas. As propostas de âmbito social e económico de cada um destes campos continuam a ser o referencial de alinhamento político por excelência, mas já não se pode pretender reduzir as análises a uma questão de preto e branco. A diversidade das sociedades deve ser tida em conta em todos os momentos, o que não deve ser confundido com um alinhamento indefinido e incaracterístico. Neste sentido, e como o voto é soberano, não se pode pretender ver na transferência de votos entre forças políticas um sintoma de enfraquecimento do sistema partidário. Isso representará certamente um problema para os partidos em questão, mas a força do sistema não está na força dos partidos e sim na força dos eleitores. Um sistema que não sirva para representar as sensibilidades do eleitorado é um sistema desadequado que deve ser alterado quanto antes.
Em segundo lugar, não está escrito em lado nenhum que o melhor sistema de governação seja o de maioria absoluta unipartidária. Claramente, as maiorias absolutas servem bastante bem os interesses dos partidos que alcançam esses resultados, mas representarão um sinal de maturidade democrática? Quando as forças partidárias não conseguem entender-se para implementar reformas reconhecidamente necessárias estamos perante uma de duas situações. Ou os interesses partidários se estão a sobrepor aos interesses nacionais, ou as características ideológicas dos partidos representados são realmente inconciliáveis. Neste último caso, como alternativa à maioria absoluta, também podemos equacionar, na inviabilidade de reposicionamentos ideológicos dos partidos com expressão significativa, o aparecimento de partidos que preencham as lacunas aparentemente existentes. É evidente que este facto levaria à diminuição da expressão dos partidos existentes, mas caberia a estes encontrarem soluções que viabilizassem igualmente os seus interesses. De tal forma que poderiam até libertar os maiores partidos para melhor se definirem ideologicamente.
Com uma maior continuidade no espectro partidário, os programas de governo que surgissem de coligações ou acordos multipartidários poderiam facilmente tornar-se mais abrangentes e equilibrados do que os que surgem através de maiorias absolutas, não só respondendo às necessidades do eleitorado, mas também promovendo a sua identificação com o sistema partidário. Esta é uma perspectiva que pressupõe maiores exigências e responsabilidades para todas as partes, mas que pode permitir uma saudável nova dinâmica para o sistema eleitoral.

1 Comments:

At 12:26 da manhã, Blogger mfc said...

Mesmo com os problemas que acarreta em termos de maiorias estáveis, prefiro o nosso sistema eleitoral onde um grande número de forças políticas logram alcançar representação.

 

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