segunda-feira, abril 26, 2004

A caminho do fim

O discurso do Presidente da República foi extremamente cáustico para com a prestação do governo. O Primeiro-Ministro ainda tentou encaixar graciosamente as críticas, mas o dano já estava feito. Para quem já se habituou aos rendilhados dos discursos de Sampaio, as palavras escolhidas para o discurso do 25 de Abril são de uma transparência cristalina. Tal como já tinha avisado anteriormente, o PR fez questão de frisar que a conjuntura não justifica tudo e que há muitas correcções a fazer na política governamental.
As políticas da coligação PSD-PP estão a empurrar um número crescente de portugueses para uma situação sócio-económica intolerável. O desemprego aumenta, o poder de compra diminui e a situação das empresas continua a agravar-se de uma forma generalizada. As funções vitais do Estado têm vindo a ser alienadas, comprometendo o compromisso tácito com a população que representa e cujos interesses se supõe que defende.
Já não é preciso fazer notar a necessidade da contenção orçamental. Mas as políticas adoptadas para atingir esse objectivo têm comprometido o futuro económico do país. Infelizmente, mesmo com uma opinião pública disposta a alguns sacrifícios em nome da saúde financeira do Estado, podemos concluir que se desperdiçou uma boa oportunidade de capitalizar essa disponibilidade e viabilizar projectos passíveis de reduzir a despesa pública sem comprometer seriamente o investimento. O que se registou foi um ataque cego aos números sem qualquer capacidade de discernir entre o fundamental e o acessório, sem olhar às consequências, sem ponderações nos casos mais delicados, sem racionalidade e sem sentido.
O país não está melhor do que estava quando a coligação iniciou as suas funções governativas e não se prevê que venha a inverter-se a tendência. Para mais, Durão Barroso vê-se numa encruzilhada difícil. Por um lado, aproximam-se momentos eleitorais sempre sedutores para os devaneios despesistas, aos quais se junta a crescente insatisfação da opinião pública e do tecido empresarial com o desempenho do governo. Por outro lado, se a coligação falhar no objectivo de manter o défice abaixo dos três por cento compromete a sua principal promessa eleitoral. Mas as capacidades governativas evidenciadas por este executivo já demonstraram amiúde que não há engenho nem arte capazes de dar a volta a esta complicada situação. A coligação PSD-PP, que nunca chegou a gozar de um estado de graça, já atingiu o limite das suas capacidades. Não existe remodelação que lhes possa valer.