segunda-feira, maio 31, 2004

Até à próxima

Pedro Mexia resolveu encerrar, aparentemente com carácter definitivo, o seu Dicionário do Diabo. E o mínimo que posso dizer é que vai ser impossível não sentir saudades de ler os seus posts, dos mais intimistas aos mais reaccionários, mas todos irritantemente bem escritos. Ainda assim, pode-se continuar a ler o Pedro Mexia no Fora do Mundo. Nem tudo fica perdido.

O insulto como máscara da falta de argumentos

O discurso rasteiro a que o PP recorre, pela inevitável atenção mediática que recolhe, afasta a atenção da absoluta falta de projectos e de capacidade mobilizadora da coligação. Por mais que o PSD e o PP venham lançar fumo sobre a realidade do país, por mais que queiram convencer-se que têm à sua espera um resultado positivo nas eleições que se avizinham, todos os indicadores apontam para uma derrota esclarecedora no próximo dia 13. Para essa derrota contribuirão a ausência de substância política, a incapacidade de desenvolver projectos, a inépcia, a dissimulação, o péssimo desempenho governativo, a postura arrogante e o discurso agressivo. Terão o que merecem e, à imagem do que sucedeu no ciclo político de meados dos anos 90, não se limitarão a perder eleições. Serão paulatinamente escorraçados dos corredores do poder.

João Almeida e Paulo Portas

Daqui por uns tempos, quando virmos o líder da Juventude Popular a subir na hierarquia do seu partido e, provavelmente, a ocupar cargos com algum relevo político, que ninguém se esqueça do carácter que este indivíduo denotou, a começar pela falta de educação e pela falta de respeito pelos outros. E, da mesma forma, de todas as vezes que Paulo Portas aparecer com o seu ar de superioridade moral, que todos se lembrem que o actual ministro da Defesa não só patrocinou os dislates do infante como tomou parte activa nos insultos. É esta a estirpe de governantes que temos actualmente.

Um mau começo

O nível que tem vindo a atingir esta campanha eleitoral é já assustador. Não são tratados os temas mais quentes da construção europeia, não se discutem as implicações do alargamento e não se reflecte sobre o papel de Portugal no novo espaço europeu. Mas, mais ainda, nem só de vazio argumentativo se tem feito esta campanha. Alguns intervenientes, com especial destaque para a liderança do Partido Popular, têm vindo a utilizar repetidamente um tom agressivo e insultuoso sobre outras candidaturas. Deus Pinheiro, cabeça-de-lista da coligação, já veio demarcar-se destas declarações, embora, porventura, não de forma tão incisiva como seria de esperar. De facto, acaba por ser pouco relevante que Deus Pinheiro não se reveja no tipo de declarações que o PP tem feito nos últimos dias e que afirme a respeitabilidade de todas as candidaturas. O que carece de ser reforçado é que o tipo de discurso produzido pelos líderes do PP é absolutamente inadmissível e não é característico de uma forma de fazer política, mas sim de uma forma de estar na vida. O insulto e a agressão gratuita não pertencem, nem nunca pertenceram, à política. Tratam-se de uma forma inqualificável de estar na vida e seriam igualmente censuráveis numa mera conversa de café. São reveladores de uma falta de respeito generalizada, de má educação, de baixeza de nível e de falta de carácter. E quem é detentor de tão fracas capacidades não deve ter lugar no campo da política, onde as virtudes e as competências devem sofrer um escrutínio ainda mais rigoroso.

quinta-feira, maio 27, 2004

A televisão também transmite cheiro

É um facto que se comprovou com o comportamento de Durão Barroso na final europeia de ontem. Porque toda a encenação montada pelo PM tresandou a hipocrisia e populismo barato, numa fantástica demonstração da total ausência de sentido das circunstâncias.

Tesouros subaquáticos

Vale muito a pena acompanhar os posts do Ma-Schamba sobre a exploração arqueológica nas costas portugueses.

Grande Porto

Parabéns ao FCP por nos ter feito acreditar e por ter cumprido as expectativas que criou. Grande equipa. São os melhores e mainada.

quarta-feira, maio 26, 2004

O silêncio não é de ouro

A maioria parlamentar quer tratar as manifestações nas galerias da AR como se fossem acções perpetradas por hordas de bárbaros dos tempos modernos. Comparar qualquer manifestação de protesto nas galerias ao hooliganismo é revelador de uma visão do mundo que se dá mal com as liberdades. É certo que as galerias não têm como função ser palco de protestos. Mas também é certo que já existem medidas que podem ser, e são, tomadas quando tal se torna necessário. O que não faz qualquer sentido é querer equiparar manifestações da liberdade de expressão, ainda que fora dos locais mais adequados, a actos de violência gratuita dos quais resulta um sofrimento humano inegável.
Resta saber se esta ânsia dos deputados da maioria em querer remeter a AR a um silêncio monástico não é, na realidade, um subterfúgio que conduz a um isolamento anti-democrático e disfarça a inoperacionalidade das suas bancadas, a impopularidade das suas ideias e as consequências gravosas para o país das suas votações. Juntando a estas tenebrosas intenções as descabeladas declarações, a roçar o anti-comunismo primário, do primeiro-ministro no congresso do PSD, temos como resultado uma forma de fazer política que é autista, elitista e petulante, da qual Portugal guarda uma boa memória de quase meio século. Mais não, obrigado.

terça-feira, maio 25, 2004

Stop, you're killing me

Alberto João Jardim como candidato à Presidência da República? Só se for para nos rirmos todos do ridículo da hipótese. Contra AJJ até Cavaco pareceria o candidato ideal. Mas é altamente improvável que AJJ esteja na disposição de se referendar no continente. Seria o fim do mito da sua elegibilidade. De resto, eleições de escala nacional, como as presidenciais, com todas as características democráticas que felizmente se lhe reconhecem, não são o terreno natural do político madeirense. Dificilmente esta anedota se concretizará.

Onde há fumo...

Que uma pessoa cometa erros na entrega de declarações de IRS é compreensível. O que já não é compreensível é que esses erros passem sem que haja consequências. O problema de Manuela Ferreira Leite, afinal, não parece ser a explicação do seu esquecimento fiscal, mas antes a forma como se pode justificar que não lhe tenha sido aplicada nenhuma coima. Poderia ser apenas mais uma demonstração de ineficiência dos serviços, não fosse o caso de se ter dado com a própria patroa.

segunda-feira, maio 24, 2004

Humilhações públicas

O Celta de Vigo, clube de futebol especialmente conhecido entre nós por ter espetado sete golitos sem resposta ao Benfica há uns anos atrás, acabou a presente temporada relegado para a segunda liga espanhola. Segundo o Público, os jogadores, no derradeiro jogo da época, pediram desculpa de joelhos aos adeptos. O gesto levanta-me logo duas questões. Em primeiro lugar, e enquanto espectador de desporto e adepto de futebol, custa-me que o ónus das responsabilidades seja sempre imputado aos mesmos intervenientes. Ou paga o treinador, que é incompetente, ou pagam os jogadores, ingratos e indignos representantes das cores do clube.
Raramente se vêem discutidos os projectos, a liderança, as estratégias de médio e longo prazo. Raramente a discussão excede o pontapé na bola, rasteiro, portanto, para se focar em aspectos porventura mais altaneiros mas de difícil decifração. Se de génio, de louco, de treinador e de político todos temos um pouco (excepto aqueles que são pouco dados à acumulação de cargos, o que, em Portugal, como se sabe, vai contra as nossas raízes culturais), também é certo que não são muitos os que se poderão gabar de conhecer os meandros do desporto-rei na actualidade. Quais são os postos chave? Quais são as áreas de influência de cada cargo? Quem manda em quem? Quais são as relações de poder? Quais são os interesses ocultos? Suponho que só depois de se apurar as respostas a estas perguntas se pode aferir quem tem efectivamente responsabilidades pelos desaires desportivos dos clubes.
Em segundo lugar, é impossível evitar o desconforto ao imaginar cena tão humilhante. A carga simbólica que o pedido de desculpa acarreta é incontornável. Mas neste caso acresce ainda a forma como foi feito: de joelhos, à guisa de penitência. Os pecadores curvados em submissão perante a altivez e a superioridade dos seus juízes e carrascos. No ocidente, na actualidade, é difícil de aceitar que se permita este género de demonstrações. Sobretudo se o que as causa são uns pontapés na porcaria de uma bola.

domingo, maio 23, 2004

"Desperado"

A única forma de entender o discurso de hoje de Durão Barroso é tendo em conta a crise que o executivo atravessa. Não há outra forma de compreender a ausência total de propostas concretas para o país, os apelos bacocos à união nacional e os ataques patéticos à oposição. A forma repetida como DB recorre aos eventos que decorrem este ano em Portugal para pedir encarecidamente que não se levantem problemas ao governo é constrangedora. Como se qualquer mal-estar existente nos mais variados sectores da função pública não estivesse directamente relacionado com as privações que o governo lhe impôs. Como se as reivindicações dos trabalhadores da função pública não tenham origem directa no incumprimento por parte do governo dos compromissos que tem para com a sua principal força de trabalho.
Durão Barroso, à imagem do que tem sido a actuação do governo que chefia, demonstrou-se incapaz de assumir as suas responsabilidades. Mais uma vez, a culpa pode ser de toda a gente menos daqueles que têm, há mais de dois anos, a missão de decidir o presente e o futuro do país. Se as finanças não se endireitam, a culpa é do PS. Se há insatisfação social, a culpa é do PCP. E quando alguém apresenta alternativas concretas, pode sempre dizer-se que é a oposição que anda a reboque da agenda do BE.
No meio de toda esta ineficácia política, DB tenta desesperadamente continuar a fazer-nos acreditar que estamos no bom caminho. O problema do primeiro-ministro é que o seu discurso surge a contra-ciclo. No final do governo PS, quando os portugueses tinham mais poder de compra, as empresas não se encontravam asfixiadas, havia mais receita fiscal e o défice não estava disfarçado por medidas extraordinárias que depauperam o Estado, o PSD procurava dramatizar a situação económica e financeira do país. Agora que lhe convém, por razões meramente eleitoralistas, reverter o discurso, o país encontra-se mergulhado numa profundíssima crise, o desemprego atinge números assustadores, os trabalhadores perdem direitos e poder de compra e a justiça, a educação e a saúde atravessam um dos períodos mais conturbados dos últimos anos.
O congresso do PSD e o discurso de DB reflectiram os problemas que o governo atravessa: a falta de ideias, a falsa unanimidade, a desculpabilização e a desresponsabilização. Estamos a meio do mandato e a coligação PSD-PP já deu o melhor que tinha para dar. A agonia só dura mais dois anos.

Fahrenheit 9/11

O documentário Fahrenheit 9/11 ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes. Claramente assumido pelo autor, Michael Moore, como um manifesto político, aborda as relações entre a administração Bush, a família real saudita e a família Bin Laden. Entretanto, Moore enfrenta sérias dificuldades para conseguir distribuir o filme nos EUA. Aparentemente, por esta altura, há muito pouca gente interessada em continuar a fazer dos EUA a terra da liberdade.

sábado, maio 22, 2004

Os excessos e as mentiras

Querer fazer dos Açores um mau exemplo democrático, como Durão Barroso tentou, quando ao mesmo tempo se elogia o trabalho de Alberto João Jardim na Madeira, só pode ser considerado um momento de humor negro ou uma farsa descarada. Os congressos prestam-se a exageros verbais, é verdade, mas isso não significa que se deva perder a vergonha na cara e abandonar a honestidade discursiva. É intolerável, e uma clara demonstração de imaturidade democrática, que ainda se continue a confundir a política com uma série de contorcionismos para não ficar mal visto em frente às câmaras ou com a capacidade de transformar aleivosias em eufemismos ao sabor das conveniências.

Haja paciência

Não há fins-de-semana informativos mais insuportáveis do que os que coincidem com congressos do PSD. Por todas as razões e mais algumas. Pela overdose de directos e especiais, pela demagogia, pelos insultos, pelas vaidades desmedidas, pela forma como se transforma um simples acontecimento partidário num evento nacional. E, como se tudo isto não bastasse, ainda há a presença garantida de Santana Lopes e de Alberto João Jardim.

sexta-feira, maio 21, 2004

Expresso da meia-noite

A substituição do ministro do Ambiente não era propriamente inesperada. Amílcar Theias acumulou erros que não deixavam adivinhar outra solução. A única questão que se colocava era a altura exacta em que abandonaria o cargo. Ora, se a remodelação do ministro era previsível e até desejável, devido à sua inépcia política e executiva, já não é nada claro o momento concreto em que ocorre. A anunciada vontade de privatizar as Águas de Portugal faz surgir sérias reservas quanto aos papéis desempenhados pelo anterior e pelo actual titular da pasta. O executivo PSD-PP mostra, uma vez mais, a sua capacidade de enublar os contornos mesmo das medidas à partida mais consensuais.

quinta-feira, maio 20, 2004

Mas por que é que ele sorri?

Carlos Tavares explicou-nos, com o seu habitual sorriso paternalista, que a economia é mesmo assim, que o país depende de muitas condicionantes que não pode controlar, que a desgraça em que estamos afundados é quase inevitável num país como o nosso. Eu sei que não saímos da cepa torta, que nos transformámos nuns desgraçados crónicos. Mas que me venham esfregar isso na cara com um sorriso?! Caramba, haja respeito. Até porque um dos argumentos utilizados pelo ministro para relativizar os aumentos dos preços dos combustíveis referia o facto de sermos o sexto país europeu com preços mais baixos. O que só se torna mesmo relevante se se verificar que o Ministério da Economia concertou a sua posição com o Ministério das Finanças e com o Ministério do Trabalho e da Segurança Social de forma a catapultar os salários, os subsídios e as reformas nacionais igualmente para a sexta posição europeia.

quarta-feira, maio 19, 2004

A liberdade e a autoridade

A imposição da autoridade por um determinado regime está sempre associada ao controlo dos meios de repressão e ao domínio das formas de produção e reprodução social. Este facto é válido tanto para democracias como para ditaduras.
Partindo da hipótese de que um regime ditatorial enfrenta uma revolução para impor um regime democrático, coloca-se a questão, como refere o Bota Acima, de saber de que forma se vai dar a superação do primeiro. Ou seja, de que forma se garante uma certa estabilidade normativa durante o período de transição?
No período de transição para um regime mais aberto, existe uma inevitável luta pelo poder. Sabendo os diferentes grupos de interesse que esta é a melhor altura para fazerem vingar a sua agenda, é natural que os ânimos se exaltem. Perder essa oportunidade pode significar o asfixiamento da sua capacidade interventiva e transformadora. Quem for capaz de moldar o período de transição de acordo com os seus interesses tem boas hipóteses de ver salvaguardados os seus interesses por um período muito mais alargado de tempo, por exemplo, tomando parte activa na reconstrução do edifício legislativo nas suas variadas vertentes. Para assegurar essas oportunidades, alguns estarão dispostos a recorrer a meios mais violentos. Independentemente disso, todos procuram alcançar uma posição privilegiada na mesa onde se tomam as decisões.
A forma como se processa o período de transição depende também, e sobretudo, do controlo dos meios de repressão. No entanto, o papel que estes desempenharam no regime deposto influencia o papel que podem vir a desempenhar neste período e no futuro. É evidente que se amplos sectores policiais e militares estiveram ligados ao regime ditatorial não se poderá contar com eles após a deposição desse regime. Assim sendo, se a transição for feita à revelia dos meios existentes, será necessário conceber uma estratégia que assegure uma certa estabilização, o que pressupõe a substituição dos meios humanos por outros capazes de assegurar a tarefa no respeito dos ideais que se pretendem impor. O que, por sua vez, depende do número de efectivos que poderão ser dispensados para essa tarefa, dos meios de que dispõem e da relação entre estes dois aspectos e o tamanho do território onde devem operar. A logística não é, de todo, uma questão a descurar.
Talvez as maiores ou menores convulsões associadas ao período transitório dependam da conjunção destas duas variáveis. A luta pelo poder será tanto mais intensa quanto menor for a capacidade de renovar o aparelho repressivo do Estado. E isto, claro, partindo do princípio de que a mudança de regime agrada à generalidade da população. Se assim não for, os problemas poderão ser ainda maiores. Mas, também aqui, a capacidade de os levantar dependerá da maior ou menor fragilidade do novo regime. Ironicamente, a transição e a garantia da liberdade passam pela rapidez e eficácia do controlo sobre os meios de imposição da autoridade.
O direito à liberdade é um valor que está acima das perturbações que caracterizam muitos períodos transitórios. Não são certamente as provações que antecedem a almejada liberdade que servem de desculpa para a retardar. O que não inviabiliza que todo processo transitório seja acautelado, de forma a optimizar as situações de conflito naturalmente existentes, aproveitando o que têm de bom para oferecer ao mesmo tempo que se procura reduzir o sofrimento que, eventualmente, também acabam por causar.

De boas intenções...

Aprendi, desde cedo, a não fazer muitas promessas blogosféricas. A velocidade a que os temas correm pelos blogues torna muito difícil a fidelidade aos planos a médio/longo prazo. No entanto, tenho aqui uns posts recentes aos quais gostaria mesmo de voltar. De preferência, ainda antes da retoma económica.

Welcome back

O Bloguitica está de volta. Não cumpriu, felizmente, a ameaça que deixou no ar, evitando assim que tivéssemos de vir clamar pelo seu regresso. A blogosfera fica mais rica com os posts do Paulo Gorjão.

Produtividade SA

Na região Oeste há cerca de 150 000 habitantes que não sabem a que unidade de saúde se devem dirigir. É a gestão privada dos hospitais a exemplificar como a ânsia de resultados financeiros positivos colide inevitavelmente com a vontade de generalizar a oferta de serviços. E não venham dizer que ninguém avisou.

terça-feira, maio 18, 2004

Pequenos prazeres

Parar numa das portagens da CREL, absolutamente deserta, não ouvir nenhum som que não seja produzido pela natureza e cheirar o Verão que se anuncia nestas tardes de calor.

segunda-feira, maio 17, 2004

A credibilidade da política

As reacções e contra-reacções blogosféricas à acumulação de cargos políticos por Edite Estrela foram várias. Vital Moreira veio relativizar o comportamento da deputada/autarca. Entre os críticos podem destacar-se Rui Branco, Paulo Gorjão e o Irreflexões. Este último tece um comentário que me parece tocar nos pontos mais importantes da questão. Nomeadamente, no que diz respeito ao exercício de cargos políticos, deve exigir-se um comportamento exemplar, cujas premissas deverão ser ainda mais rígidas do que noutros casos. Pela própria defesa do bom nome dos políticos e da política, é do interesse dos detentores destes cargos que as suas práticas estejam bem delimitadas. E, de uma forma geral, estão. Subsistem, no entanto, alguns casos que se prestam a interpretações dúbias que não ajudam a credibilidade e a respeitabilidade da política. Sobretudo numa altura em que esta enfrenta uma crise junto da opinião pública.
Retomando a relativização de Vital Moreira e os comentários do Irreflexões, é claro que o facto de não existirem incompatibilidades legais entre o exercício de vários cargos não inviabiliza que possam existir incompatibilidades físicas. Para o eleitor que sabe não ser portador do dom da ubiquidade, é insultuoso que um político faça constar que esteve presente em mais do que um local ao mesmo tempo. Ainda que a lei o permita, como já disse, é do próprio interesse dos políticos defenderem-se destas situações. E se quisermos ir um pouco mais longe, não seria demais pedir aos políticos que fossem eles os primeiros a lutar contra estas situações menos claras, furtando-se à acumulação de cargos fisicamente incompatíveis, ou até à acumulação de cargos de todo. Certamente que a exclusividade de exercício de determinadas funções, ainda que não exigível por lei, seria tida em consideração pelos media e pelos eleitores.
Por último, se bem compreendi, Vital Moreira não pretende branquear o comportamento de Edite Estrela evocando situações ainda mais escandalosas (nas palavras do Irreflexões). O que VM pretende é chamar a atenção para o facto de a atenção mediática sobre este caso permitir que outros, de contornos bastante mais escuros, sejam eclipsados. Evidentemente, não é inteiramente comparável um político que se ausenta de plenários para cumprir outros compromissos políticos e um político que se ausenta para dar seguimento à sua vida profissional particular. No entanto, ambos os casos estão para lá do limite do aceitável e por isso devem ser denunciados sem que com isso estejamos a entrar numa dicotomia fundamentalismo moralista/populismo antiparlamentar. Porque as críticas que foram feitas não entram no campo do fundamentalismo mas no do bom-senso, porque, de facto, não há outra forma de estar na política do que com moralidade e porque se se cumprirem os mínimos exigíveis estaremos a contribuir para a credibilidade das instituições políticas, quer se trate do parlamento ou doutras quaisquer.

sexta-feira, maio 14, 2004

Uma política de enfraquecimento (I)

Nestes dois anos de governação, há duas áreas em que se pode considerar que o executivo de Durão Barroso tem tido sucesso: o enfraquecimento do Estado e a divisão entre os portugueses. No primeiro caso, torna-se evidente a vontade de afastar o Estado das esferas de influência da economia, privatizando selvaticamente e demitindo-o de desempenhar um papel que acautele os seus próprios interesses. Os negócios pouco claros e prejudiciais repetem-se. Além disso, o governo insiste em não assumir as funções essenciais do Estado, quer seja na educação, na saúde ou na segurança social. Aliás, não é por acaso que os serviços do Estado, nestas e noutras áreas, não atingem o patamar de excelência que deveriam atingir. Isto só acontece porque o governo não está realmente interessado em alterar a cultura organizacional da administração pública, muito menos se isso implicar despesas. As consequências são claras. Se o Estado não cumpre as suas funções, mesmo que seja pela deriva neo-liberal da governação, os cidadãos vêem-se confrontados com um sistema que não os favorece. Assim sendo, o corte progressivo entre cidadãos e Estado vai sendo alimentado. Porque se os trabalhadores, por exemplo, descontam dos seus salários para a Segurança Social mas vão sendo espoliados dos seus direitos, podendo acabar por não receber na razão do que foram contribuindo, gera-se um sentimento de antipatia pelo Estado e pelas funções das quais este se vai demitindo. O mesmo se passa na saúde. O Estado não presta um bom serviço mas o governo não está interessado em alterar o rumo dos acontecimentos, a não ser que com isso consiga favorecer os interesses privados. O interesse do governo em reduzir as listas de espera nos hospitais está fortemente ligado à introdução do sector privado no sector da saúde. Da mesma forma que é lógico que os seguros de saúde e os PPR’s só fazem sentido se se generalizar nos contribuintes um sentimento de insegurança face à capacidade e vontade do Estado em respeitar valores mínimos aceitáveis no cumprimento das suas obrigações.
Ou seja, cresce, como alternativa, o apelo das soluções oferecidas pelo sector privado. Só que estas não estão ao alcance de todos. Muitos portugueses não ganham o suficiente para pagar seguros de saúde e PPR’s. Assim como muitos outros não estariam interessados em fazê-lo se o Estado providenciasse um nível aceitável de serviços nessas áreas. Mas também ninguém disse que esta era uma solução para todos. Tudo o que o sector privado precisa é de um número de utentes suficiente para viabilizar o negócio. Se isso implica que um número elevado de portugueses se pode ver privado de subsídio de desemprego, reforma, cuidados de saúde, etc., a responsabilidade não será certamente dos prestadores privados. Para eles, na realidade, o problema é todo nosso. E o Estado já não estará lá para zelar pelos interesses da generalidade da população.

Falta de tempo

Gostava de voltar a pegar nalguns assuntos, sobretudo nas respostas que o Bloguitica, o Irreflexões e o Tugir deram à pergunta que lancei, mas estes têm sido dias complicados. O tempo nem sequer tem dado para responder aos comentários quanto mais para postar. Talvez para a semana haja mais disponibilidade. Entretanto, ainda se arranjou tempo para o post que vem a seguir.

quinta-feira, maio 13, 2004

Viva Espanha

Ultimamente, alguns blogues têm transformado o Viva Espanha num "Viva a Espanha". Tenho eu resistido estoicamente a certas vozes que criticam a escolha deste nome para, agora, me andarem a alterá-lo pela blogosfera. Eu não me esqueci do artigo definido. A sua ausência é consciente e voluntária. OK? Pode ser? Obrigado.

São sempre os mesmos que pagam

A preocupação social de Bagão Félix e deste governo é quase comovedora. Para o provar aí estão as novas propostas de alteração às regras do subsídio de desemprego. Bagão Félix reduz descaradamente os direitos dos trabalhadores, numa tentativa de poupança para os cofres do Estado à custa dos mais fragilizados. Estas medidas passam pela diminuição do tempo abrangido pelo subsídio para os trabalhadores com menor período contributivo e para os trabalhadores com indemnizações de rescisão elevadas, assim como pela obrigatoriedade dos desempregados aceitarem empregos afastados da sua zona de residência.
A solidariedade social faz-se a favor dos que não têm condições de garantir por si próprios um patamar de vida minimamente digno. Mas o subsídio de desemprego é, antes de tudo, um direito dos trabalhadores, justificado pelas contribuições efectuadas. É inteiramente justo que um trabalhador veja reconhecido o seu direito a usufruir das regalias sociais que ajudou a suportar. Neste sentido, se um trabalhador sempre cumpriu as suas obrigações com o Estado e se a sua entidade empregadora decide compensá-lo, na hora da rescisão, com uma indemnização de valor significativo, isso em nada deve limitar o direito que ele tem a receber os subsídios para os quais descontou. Outro aspecto perfeitamente absurdo é penalizar os trabalhadores com menor tempo de descontos para a Segurança Social, diminuindo-lhes o número de meses de subsídio. Se falamos de trabalhadores com menos anos de contribuições, é o mesmo que falar de trabalhadores com menos experiência profissional. Ou seja, trabalhadores que, quando confrontados com uma situação de desemprego, terão ainda mais dificuldades para competir num mercado de trabalho que privilegia a experiência. Para além de se encontrarem numa situação psicológica e económica delicada, com o novo diploma ficam a saber que não poderão contar com a Segurança Social para os ajudar nessa hora difícil. Por último, de um governante conservador não se esperava um ataque tão forte à estabilidade social e familiar. Deixar ambiguidades na lei que possam obrigar os trabalhadores desempregados a aceitar ofertas de trabalho sem reservas geográficas é um verdadeiro atentado. Bagão Félix parece não querer ver que as pessoas são mais do que meros conceitos abstractos nas teorias liberais da circulação de mão-de-obra. Uma pessoa não se define somente pelo seu trabalho. É muito mais do que isso. São as suas relações com a família, com os amigos e com o local onde reside. A negação desta realidade só pode vir de um reducionismo economicista censurável ou de um lapso inaceitável para um governante com tantas responsabilidades na área social.
O ministro vem falar em imoralidades na atribuição dos subsídios de desemprego. O que é imoral é que o governo continue a optar por penalizar os mais fracos. O que é imoral é, em lugar de se combater a evasão às obrigações contributivas, poupar nas retribuições aos que sempre cumpriram. Mas de um executivo miserável só se podem esperar medidas que acentuam a miséria. Nada de novo, portanto.

Tempo de antena, perdão, entrevista

Não, não vi Durão Barroso na SIC. Não costumo ver os tempos de antena do PSD. São sempre a mesma coisa, uma maçada. Mas deixem-me adivinhar como terá sido este: 'blá, blá, herança pesada, blá, blá, radicais de esquerda, blá, blá, herança pesada, blá, blá, trabalho difícil, blá, blá, herança pesada, blá, blá, blá, blá’. Andei muito longe, Luís?

quarta-feira, maio 12, 2004

O PS de Ferro Rodrigues

Um dos fenómenos que mais me intrigam é a vontade de apear Ferro Rodrigues da liderança do PS. É compreensível que a direita lhe seja hostil. São seus adversários políticos. Agora, que dentro do próprio PS haja reservas, isso já é outra história. Até que ponto as hesitações de que a liderança de Ferro Rodrigues é acusada não nascem de constrangimentos internos mas alheios à vontade do próprio líder? Uma pergunta que não me importaria de ver respondida neste blogue, neste ou neste. Ou noutros. Para inverter um bocadinho os papéis e não ser sempre o mesmo a fazer as perguntas.

A liberdade de expressão nos blogues

Assim que tive conhecimento da possibilidade de algumas instâncias quererem acabar com os blogues, tive a oportunidade de manifestar por mail a minha oposição a essa tentativa. Os blogues ainda continuam a ser um dos espaços de maior liberdade de expressão. Embora estejam a ser progressivamente criados mais blogues de carácter político, mantém-se a relativa liberdade de adesão a esta forma de comunicação, o que possibilita um número de temas, de pontos de vista e de opiniões muito superior ao que se obtém apenas através dos partidos políticos (o uso dos termos ‘relativa liberdade’ prende-se com o facto de os blogues exigirem uma disponibilidade, em termos financeiros e logísticos, mas também de tempo, que nem toda a gente possui). Concordo plenamente que uma das próximas batalhas a travar seja contra as limitações à liberdade expressão, nomeadamente na Internet. Provavelmente, será bastante fácil contornar essas limitações. É muito mais complicado limitar a oferta e a procura num meio como a Internet. Mas a questão de fundo não é a facilidade com que nos podemos furtar às possíveis restrições. A questão de fundo é uma questão de princípio. Não basta, nestes casos, encontrar soluções alternativas. É mesmo necessário lutar para que não se imponham práticas censórias e castradoras. Fazer concessões neste campo pode ser muito perigoso e este não é um daqueles assuntos em que se queira descobrir os inconvenientes tarde de mais.

Duas perguntas

A ameaça aos blogues acabou antes de começar. Está tudo bastante bem explicado no Tugir. No entanto, levantam-se questões interessantes. Primeiro, de que forma se pode compatibilizar o direito à liberdade de expressão com os meios de combate à criminalidade organizada? Segundo, como é que as declarações de um entrevistado podem sofrer tantas distorções até aparecerem publicadas?

terça-feira, maio 11, 2004

Lentamente...

Após o sacrifício de algumas imagens publicadas, os links regressaram à posição onde fazem mais sentido. Aos poucos o blogue vai ganhando forma.
Entretanto, o Terras e o Irreflexões, pelo menos, também aproveitaram para mudar o template.

A tortura como forma de terror

A tortura é uma forma de terror, uma vez que tem uma componente que se relaciona com o medo que pretende impor não só à vítima mas também a terceiros não envolvidos directamente. Mal os actos de tortura se tornam conhecidos de outros que não os directamente envolvidos, quer seja voluntariamente ou não, o seu alcance passa a exceder a situação concreta em que se verificou. Passa a haver uma generalização da arbitrariedade e dos abusos, sobretudo nas representações que se constroem. Ou seja, mesmo indivíduos que não estiveram directamente envolvidos em nenhuma situação de abuso conseguem identificar perfeitamente em que lado da relação se poderão encontrar.
Os objectivos da tortura extravasam largamente a obtenção de informações ou a repressão aplicada individualmente. É impossível dissociar esta prática das medidas de controlo social e definição de relações de poder. De qualquer forma, qualquer que seja o sentido atribuído e o objectivo pretendido pelo torcionário, resulta sempre que existe uma vítima condenada às sevícias. O que importa reter é que determinada pessoa, ou determinado grupo de pessoas, decidiu recorrer a estas práticas, que elas existiram. O que se encontra por trás desta escolha é uma incapacidade de reconhecer as vítimas como semelhantes, uma recusa da sua humanidade e da sua dignidade. Ou então, uma capacidade de subalternizar estes valores a um interesse julgado superior. A frequência e a extensão no tempo dos abusos não assumem uma importância fundamental, embora os números ajudem a impressionar. No entanto, trata-se de uma contabilidade mórbida. Qualquer abuso cometido é uma situação intolerável que gera os sentimentos já descritos. Porque um caso de abusos já é um caso a mais e porque, de facto, por mais esporádicos que sejam, ninguém consegue garantir que não será a próxima vítima.
Ora, dito isto, se fizermos a sua aplicação aos abusos cometidos nas prisões iraquianas e em Guantanamo (ou em qualquer outro lado em que estas situações se repitam, seja em Cuba, na Coreia, na Rússia, em Espanha, na América Latina em Portugal, etc.), temos de um lado um grupo de pessoas que recorreu a actos de extrema violência física e psicológica sobre outras pessoas e do outro as suas vítimas. Evidentemente, talvez os actos praticados pelos militares da coligação, com ou sem autorização ou supervisão superior, possam não rivalizar com os anteriormente praticados no regime de Saddam. Evidentemente, pode haver pessoas envolvidas que, baseadas na convicção de que os fins justificam os meios e que, deste modo, contribuem para a segurança de todos nós, patrocinam estas violações da integridade do ser humano. Mas se não conseguirmos reconhecer que nesta lógica está presente a mesma violência gratuita, o mesmo abuso abjecto, a mesma capacidade de violar e corromper todos os valores da liberdade, da dignidade e da integridade em troca de qualquer outro interesse, então já perdemos a capacidade de estabelecer diferenças. Se estivermos preparados para abdicar destes valores, mesmo que a troco de uma pretensa segurança contra o terrorismo e a iniquidade, então já pouco temos para salvar. Passámos para o outro lado da barreira. Sem o perceber, já passámos para o lado do inimigo e somos todos terroristas de nós próprios.
Por estes motivos, é fundamental que nas sociedades que não se revêem nesta hierarquização de prioridades se tomem medidas inequívocas perante tais situações. Essas medidas devem passar pela exorcização de qualquer resquício de cedência. Isto implica que os responsáveis directos e indirectos, os que tiveram conhecimento e não ajuizaram a gravidade das ocorrências, os que não tiveram conhecimento mas possuem responsabilidade política sobre os restantes sejam chamados a responder. E, inevitavelmente, sejam afastados das suas funções. O preço a pagar é alto, mas é a única forma de corresponder inteiramente à gravidade das ofensas cometidas.

segunda-feira, maio 10, 2004

À boleia do passado

Há pormenores que são reveladores do carácter das pessoas. Paulo Portas preferiu, em sua defesa sobre o caso das boleias, aproveitar para referir comportamentos mais ou menos semelhantes por parte de elementos de outros partidos. O que PP sabe mas não diz é que existe uma grande diferença entre transportar funcionários do Estado, no exercício das suas funções, e dar uma boleia a companheiros partidários, que acumulam os cargos para que foram eleitos com cargos directivos dos seus respectivos partidos, para uma simples reunião partidária. Mas, mesmo que se verificasse que anteriormente também outros políticos tinham incorrido numa prática censurável, isso nunca poderia servir de atenuante. E se Paulo Portas e o seu partido não conseguem ver as diferenças é porque estão piores do que se imaginava.

Alterações

Já estão aí as primeiras alterações. Em primeiro lugar, os links blogosféricos passaram para o fim da coluna à direita e desapareceram os links para os órgãos de comunicação social. A seu tempo voltarão para lá. Quem sabe, talvez seja desta vez que tem lugar a tão prometida actualização dessa categoria de links (uma promessa já com tantas barbas como o Viva Espanha).
A segunda alteração é de peso. A título experimental, o Viva Espanha está aberto a comentários. Até agora, a única forma de contacto entre bloguista e leitores tinha sido o e-mail (que continua a funcionar, claro). No entanto, é provável que os comentários possuam um formato mais adequado para quem queira transformar uma opinião em três ou quatro linhas de escrita sem que para isso se veja obrigado a mandar um mail ou a postar. Já para não falar de todos quantos não têm nenhum blogue onde o possam fazer.
O tempo já vai sendo escasso para as leituras diárias e para postar o que se me vai oferecendo dizer. Se os comentários registarem alguma adesão, muito provavelmente, ser-me-á complicado acompanhar a par e passo o que por lá aparecer. Fica a promessa de me esforçar por isso enquanto tal me for possível. De qualquer forma, repito, este período de comentários é experimental. Vamos ver como é que resulta e depois voltamos a falar.

Novo look

Aproveitando as novidades no Blogger, o Viva Espanha refrescou o aspecto. Ainda não é garantido que se aguente assim, mas, conhecendo a minha tendência para me afeiçoar a estas coisas, é provável que o novo template ainda dure uns bons tempos.

sexta-feira, maio 07, 2004

Bota foto

O Bota Acima desafia a blogosfera a postar fotografias de crianças. Uma ideia interessante secundada por uma fotografia deliciosa para motivar as hostes.

Paulinho das boleias

O ministro da Defesa anda, com grande naturalidade, a dar boleias aos dirigentes do PP Açores nos helicópteros das Forças Armadas. Há gente que não cria vergonha na cara, por mais bronzeada que esta esteja. Paulo Portas, se não fosse líder do PP, seria um dos nomes mais remodeláveis deste governo.

quinta-feira, maio 06, 2004

Pierre Falcone e o SEF

Pierre Falcone, com um mandato de captura internacional pendente, passou pelo Aeroporto da Portela onde foi detido pelo SEF. Posteriormente viria a ser libertado, ao que tudo indica, sem que se tenham respeitado todos os procedimentos que dizem respeito a estes casos. Simples incompetência ou algo mais?

Escrita abrupta

Pacheco Pereira, no dia em que o Abrupto completa um ano de existência, critica a coligação PCP-PEV. Para JPP, não só “Os Verdes” não acrescentam diversidade ao panorama político, como só servem para aumentar a logística atribuída ao PCP na Assembleia da República. JPP só não esclarece se os deputados ecologistas ficam mais caros que aqueles deputados dos partidos mais representados que, para além de ajudarem a encher cadeiras, passam a legislatura a fazer não se sabe bem o quê.

quarta-feira, maio 05, 2004

Zaping

E agora, se não se importam, vou procurar um canal de televisão que não tenha acampado à frente do EP de Lisboa ou à porta de certa vivenda em Cascais. Tarefa ingrata, claro.

Multipartidarismo

Interroga-se o Irreflexões sobre as vantagens dos partidos praticamente inexistentes em continuar a existir e, mesmo a concorrer às eleições europeias. Deixando de parte as convicções ideológicas, que certamente as há, julgo que a grande vantagem para estes partidos é constituírem um grupo de pressão sobre os maiores partidos e a opinião pública em geral. Muito embora tenham uma expressão eleitoral residual, muitas vezes têm nas suas fileiras militantes com alguma exposição mediática. Desta forma podem acalentar o ensejo de, por vezes, conseguir incomodar suficientemente os maiores partidos de forma a capitalizarem as concessões que estes estejam dispostos a fazer.
Por outro lado, os pequenos partidos, certamente, também alimentam pequenas fogueiras de vaidades e jogos de poder. Não conhecendo em pormenor a realidade interna de nenhum partido, não vejo por que razão ela possa variar significativamente de uns para outros, salvaguardadas as devidas idiossincrasias. Assim sendo, se acontece nuns, por que não nos outros?
Muito provavelmente, não há uma razão solitária capaz de explicar a manutenção destes pequenos partidos. A sua existência dependerá de uma confluência de motivações e interesses que se vão articulando de uma forma que vai assegurando a sua subsistência. Um equilíbrio tão delicado quanto interessante.

A perda de eleitorado pelos partidos mais pequenos é motivo de preocupação. Para que a democracia funcione bem não basta que haja eleições livres, também fazem falta alternativas. Existe uma crescente pressão para a bi-polarização partidária. A sobrevivência dos pequenos partidos parece-me uma causa altamente defensável. Quanto mais diversos forem os interesses representados menor será a possibilidade de centralizações abusivas. É claro que alcançar consensos se pode tornar mais difícil. Mas também ninguém disse que isto ia ser fácil.

Uma vitória contra o sistema (post de homenagem a Dias da Cunha)

O FC Porto conseguiu mais um brilhante feito na sua história. Está a escassos minutos de se tornar, caso ganhe a final, na segunda equipa a conquistar a Taça dos Campeões Europeus e a Taça UEFA em anos consecutivos. Está de parabéns e esperemos que nos dê efectivamente essa alegria.
O feito do FCP é ainda mais notável quando se atenta aos obstáculos que teve de superar. A UEFA, entidade responsável pelas competições europeias de futebol, tem vindo, desde há muito tempo, a substituir qualquer resquício de beleza desportiva pelo superior interesse financeiro. O futebol já não é um desporto, é uma máquina de gerar receitas que importa preservar a todo o custo. A UEFA eliminou uma das competições europeias de clubes (Taça das Taças) e transformou a Taça dos Campeões numa Liga aberta a clubes que terminaram os respectivos campeonatos em 2º, 3º ou mesmo 4º lugar, enquanto que outros clubes, provenientes de campeonatos menos cotados, podem não ter acesso directo apesar de terem terminado em 1º lugar. Além disso, quanto mais cotado é o campeonato mais equipas fornecerá para as competições europeias. Ao mesmo tempo, vai-se preparando também para adoptar para a Taça UEFA um formato semelhante. Ou seja, como o modelo privilegia a cotação do campeonato (para a qual contribui a carreira europeia das respectivas equipas), o resultado é um esquema viciado que favorece os mais fortes. Quanto mais cotado é o campeonato mais equipas podem aceder às provas da UEFA, quanto mais equipas de um campeonato disputam as provas mais hipóteses têm de arrecadar pontos para a cotação dos campeonatos.
Sem surpresa, os campeonatos mais cotados são os dos maiores países europeus. Espanha, Inglaterra, Itália e Alemanha são os países mais privilegiados por este modelo. São também países populosos e com um nível de desenvolvimento económico notável. A relação entre um factor e outro não se deve ao acaso. O facto de o modelo adoptado pela UEFA favorecer os países com melhores indicadores económicos não é uma feliz coincidência. Trata-se, antes de tudo, de uma forma de rentabilizar o negócio do futebol. Em qualquer um destes países pode encontrar-se um elevado número de possíveis consumidores com um significativo poder de compra, para além de grupos económicos dispostos a utilizar a montra das competições europeias para promover as suas marcas. As infindáveis horas de futebol televisivo e de programas associados são, simultaneamente, horas de publicidade muito bem pagas. Neste sentido, o mérito desportivo é o que menos interessa desde que ajude a alimentar o status quo. O desportivismo foi totalmente desvirtuado e é praticamente impossível dissociar as competições europeias dos resultados financeiros que geram.
O lugar que o FCP ocupa actualmente no futebol europeu é não só inteiramente merecido como também altamente significativo. Sobretudo porque é resultado de um trabalho levado a cabo por um clube com um orçamento modesto, com um jovem treinador português, com uma equipa construída à base de nomes portugueses, rejeitando as lógicas de mediatismo galáctico tão em voga. Um clube oriundo de um campeonato pouco cotado, de um país que representa muito pouco em termos económicos quando comparado com os gigantes europeus, onde o poder de compra e o número de potenciais consumidores não é particularmente apelativo. Um outsider que vem demonstrar que o modelo defendido pela UEFA é desportivamente injusto e tendencialmente afasta outros estilos de futebol, onde podem despontar pérolas como esta magnífica equipa que é o Futebol Clube do Porto.

segunda-feira, maio 03, 2004

Resultados eleitorais

A análise de Vital Moreira aos resultados da sondagem apresentada pelo DN aponta numa direcção interessante. Reconhecendo que um resultado de 42% não é famoso tendo em conta as dificuldades que atravessa a coligação, VM aponta um défice de estratégia e de 'elan' à liderança do PS.
Curiosamente, a solução preconizada não parece passar pelas prescrições habituais. Se o PS está a perder eleitorado para a esquerda, talvez esse facto não se deva somente ao cinzentismo que se aponta ao seu líder, mas antes a uma definição estratégica de esquerda que tarda em se afirmar. Como se tem notado, levar o PS para a esquerda de Guterres não é uma tarefa fácil. A oposição começa, certamente, dentro do próprio aparelho partidário. Mas a ser verdade que não se está a conquistar eleitorado à esquerda, o que é que isso poderá dizer de uma disputa pela liderança em que os principais candidatos se assumem muito mais centristas do que a orientação actual do partido? Ou seja, se há uma esquerda que, não se revendo neste PS, se vai refugiar ainda mais à esquerda, uma mudança de liderança que posicione o partido mais ao centro irá, provavelmente, afastar ainda mais eleitorado. Por sua vez, esta perda poderá ser compensada pelos eleitores do centro entretanto atraídos pelo reposicionamento.
Uma questão, já aqui abordada, se levanta. Parece consensual que as eleições se decidem pelo eleitorado oscilante do centro. Mas a ser assim, não se estará a entrar numa reedição dos governos de António Guterres? Será isso o mais conveniente para o PS, para o país e para a reconciliação do eleitorado com a política? O centro pode ajudar a ganhar eleições, mas é o eleitorado ideologicamente definido que substancia a essência de um partido, dando-lhe identidade e até credibilidade.

Duas notas finais. Primeiro, se é conveniente que o PS não se deslumbre pelas recentes sondagens, também é importante que não se menospreze o resultado que o partido está prestes a alcançar. O PS prepara-se para derrotar sozinho os dois partidos de direita unidos. Se 42% é um resultado inferior aos registados noutras situações eleitorais, não deixa de ser notável que uma liderança atacada por quase todos os lados se prepare para infligir uma pesada derrota à direita.
O segundo ponto diz respeito ao resultado do PP. Numa coligação é natural que o partido minoritário veja o seu resultado canibalizado pela maior força política. Os 2,6% podem ser preocupantes para o PP, mas não são surpreendentes. O futuro eleitoral do PP passa, assim, por duas incógnitas. A primeira prende-se com durabilidade da ligação ao PSD. Não se prevê que o PSD queira continuar a subsidiar eleitoralmente o PP se daí não retirar benefícios. Mesmo o próprio PP, que terá alguma relutância em abandonar a actual coligação por receio de enfrentar sozinho os números que as sondagens lhe atribuem, terá de considerar quando é que o regresso à autonomia não será uma melhor opção, tendo em vista a continuidade da expressão eleitoral do próprio partido. A segunda incógnita tem a ver com a continuidade de Paulo Portas como líder. Se assim for, o actual ministro já mostrou ser capaz de recorrer ao que for preciso para arrancar um resultado que recoloque o PP no mapa político. Mas se Paulo Portas resolver sair podem adivinhar-se tempos difíceis para os lados do Largo do Caldas.

Aprenderam a lição?

Sou uma pessoa pouco dada a clubites. Depois dos fulgores habituais da adolescência, deixei de me emocionar excessivamente com as cores das camisolas. Lá vou torcendo pelo SLB quando me parece que os rapazes não desmerecem o sofrimento, mas não tenho qualquer pejo em manifestar contentamento pelos bons resultados do FCP, ou do SCP (se os houvesse), ou de qualquer outra equipa que eleve o desporto português acima do nível mediano em que ele está submergido. Servem estas linhas para esclarecer que acredito que as tristes cenas que se puderam presenciar em Alvalade este fim-de-semana poderiam ter por actores principais quaisquer energúmenos independentemente dos cachecóis e das bandeiras que carregavam. Ficou patente que, caso houvesse vontade e/ou discernimento, os meliantes tinham tomado conta das operações a seu bel-prazer. Esperemos que se tenha aprendido com os erros e que não se venha a descobrir no Verão que o défice de produtividade nacional em relação à Europa também se pode aferir pela superior eficácia do hooliganismo estrangeiro.

Duas Linhas

O blogue Duas Linhas anuncia que está de regresso. Welcome back, pois então.

Um conflito de interesses

O Jumento publicou uma interessante reflexão sobre os conflitos de interesse que surgem quando se tem gestores privados à frente da cobrança de impostos. De leitura mais que recomendável.

Um papel fundamental

O editorial do Público de hoje debruça-se sobre a superficialidade do debate político actual. Este é um dos temas incontornáveis para quem se preocupa com a degradação da qualidade do debate político. O discurso político está sobretudo orientado para os ciclos políticos de curto prazo, quando não mesmo para o imediato. Falta estratégia, planos ambiciosos de longo prazo e capacidade de mobilizar o eleitorado para a importância da política. Pelo contrário, parece ter-se alcançado um estado em que a fraqueza da troca de argumentos se alimenta de si mesma. O problema torna-se um ciclo vicioso. A elevação de nível é injustamente conotada com erudição e elitismo e parece impossível fugir a esta lógica redutora.
Como faz notar Eduardo Dâmaso, é importante para os partidos não perder de vista o resultado eleitoral. No entanto, o ponto fundamental devia centrar-se nas questões que verdadeiramente interessam. Nomeadamente, o género de políticas que se podem e devem implementar, as propostas de acção e os resultados esperados, para que os eleitores tenham oportunidade de poder comparar os fins pretendidos e os meios escolhidos para os alcançar. Porque já se sabe que os primeiros nem sempre justificam os segundos. Esta é uma tarefa que cabe a todos os partidos, para que a cena política nacional não seja campo fértil para populismos e demagogias que, a médio prazo, ajudam a afastar o eleitorado.
Mesmo assim, cabe à oposição, e ao PS de uma forma especial, conduzir o debate para os terrenos mais legítimos em cada momento, elaborando, apresentando e assegurando a notoriedade das suas propostas alternativas. É certo que a política de Manuela Ferreira Leite e de Durão Barroso criou uma situação económica praticamente insustentável e que a consolidação orçamental é uma miragem. Compreende-se que Sousa Franco se queira defender dos ataques que lhe são desferidos pelos actuais governantes, sobretudo quando os resultados do combate ao défice são os que se conhecem. Mas, sendo que o ex-Ministro é agora cabeça de lista às europeias, a sua defesa poderia passar, por exemplo, por uma recolocação do debate político no campo em que ele se deve centrar e esforçar-se por discutir a Europa nas variadíssimas vertentes que este tema tem. A sanidade do sistema político e partidário ficar-lhe-ia certamente grata.

The Shooting of May Third 1808



Goya