sexta-feira, outubro 29, 2004

Verde que te quiero verde

Homenagem à adesão da Imprensa Nacional-Casa da Moeda ao Dia Nacional da Desburocratização.

Romance Sonámbulo

Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña.
Con la sombra en la cintura
ella sueña en su baranda,
verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Verde que te quiero verde.
Bajo la luna gitana,
las cosas la están mirando
y ella no puede mirarlas.

Verde que te quiero verde.
Grandes estrellas de escarcha,
vienen con el pez de sombra
que abre el camino del alba.
La higuera frota su viento
con la lija de sus ramas,
y el monte, gato garduño,
eriza sus pitas agrias.
¿Pero quién vendrá? ¿Y por dónde?
Ella sigue en su baranda,
verde carne, pelo verde,
soñando en la mar amarga.

--Compadre, quiero cambiar
mi caballo por su casa,
mi montura por su espejo,
mi cuchillo por su manta.
Compadre, vengo sangrando,
desde los puertos de Cabra.
--Si yo pudiera, mocito,
este trato se cerraba.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
--Compadre, quiero morir,
decentemente en mi cama.
De acero, si puede ser,
con las sábanas de holanda.
¿No ves la herida que tengo
desde el pecho a la garganta?
--Trescientas rosas morenas
lleva tu pechera blanca.
Tu sangre rezuma y huele
alrededor de tu faja.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
--Dejadme subir al menos
hasta las altas barandas,
¡dejadme subir!, dejadme
hasta las verdes barandas.
Barandales de la luna
por donde retumba el agua.

Ya suben los dos compadres
hacia las altas barandas.
Dejando un rastro de sangre.
Dejando un rastro de lágrimas.
Temblaban en los tejados
farolillos de hojalata.
Mil panderos de cristal
herían la madrugada.

Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
Los dos compadres subieron.
El largo viento dejaba
en la boca un raro gusto
de hiel, de menta y de albahaca.
--¡Compadre! ¿Dónde está, dime?
¿Dónde está tu niña amarga?
¡Cuántas veces te esperó!
¡Cuántas veces te esperara,
cara fresca, negro pelo,
en esta verde baranda!

Sobre el rostro del aljibe
se mecía la gitana.
Verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Un carámbano de luna
la sostiene sobre el agua.
La noche se puso íntima
como una pequeña plaza.
Guardias civiles borrachos
en la puerta golpeaban.
Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
El barco sobre la mar.
Y el caballo en la montaña.

Federico García Lorca

Boas e más notícias

Este governo, de arrogância em arrogância, de asneira em asneira, está a afundar-se rapidamente. O problema reside no facto de, enquanto se afunda, nos estar a levar com ele.

quinta-feira, outubro 28, 2004

Policiamento da blogosfera?

Casa Pia - PJ confisca computador a autor de blogue

Consultado sobre a acção do Ministério Público (MP) junto de António Caldeira, autor do blogue Do Portugal Profundo, José Magalhães considera estar aberto 'um precedente'.

Contorcionismo neo-liberal

Um ministro vem à praça criticar as intervenções de um comentador de um canal privado de televisão. O comentador tem uma conversa com o Presidente do referido canal e decide afastar-se. Moral da história: privatizem-se os órgãos de comunicação social públicos.
É espantoso como a eventual falta de carácter de determinadas personalidades, aliada à inoperância de determinados organismos de fiscalização (nada de novo, portanto), está a ser paulatinamente transformada numa necessidade de levar o Estado a entrar em mais uma senda de privatizações.

Quem tiver dúvidas sobre o interesse que os negócios da comunicação social podem gerar, consulte os sinais da “crise dos media” que o Terras do Nunca tem publicado.

Semelhanças e diferenças

As explicações de Marcelo Rebelo de Sousa são substancialmente diferentes das de Miguel Paes do Amaral. Já entre as declarações de Rui Gomes da Silva, que despoletaram toda esta controvérsia, e o que MRS disse que ouviu de Paes do Amaral há notórias semelhanças.
Dito isto, é claro que alguém está a contar mal a história. Eu não sei quem é, embora desconfie, mas há locais próprios para o apurar.

quarta-feira, outubro 27, 2004

Contradições, perdão, contraditório

Marcelo Rebelo de Sousa afirma que foi alvo de pressões por parte de Paes do Amaral

Aguardam-se reacções.

Visibilidade? Talvez... Benefícios? Not so much...

Durão Barroso recuou com a sua proposta de Comissão. Há quem defenda que este desaire é humilhante e enfraquece a Comissão, o que pode ser considerado preocupante para os pequenos Estados da UE que têm encontrado nela um confortável aliado. E também que DB poderia ter feito mais para evitar esta situação, por exemplo, adoptando uma posição mais flexível desde o início.
O ex-primeiro-ministro português tem, por isso, e à luz destas opiniões, responsabilidades acrescidas na fragilização da Comissão e dos pequenos Estados. Donde se poderá concluir, porventura, que a escolha de Durão Barroso para a presidência da UE não era necessariamente boa para Portugal.

Clarificação

Rocco Buttiglione tem todo o direito às suas convicções e a expressá-las como quiser. Eu tenho o direito de discordar dele e de achar que não tem perfil para ser representante da União Europeia.

Buttiglione

Há duas maneiras de encarar as declarações do polémico Rocco Buttiglione sobre as mulheres. A primeira é reconhecer que o senhor tem as suas convicções religiosas, fundamentadas pelo conhecimento histórico das raízes da palavra matrimónio. A segunda é considerar que Butiglione tem uma concepção atávica do papel social da mulher, suportada por um fundamentalismo religioso incompreensível no seio da União Europeia.

A grande divisão

Eleições presidenciais: é mais a cultura do que a economia que divide a América

Um pequeno resumo de quem vota em quem, num interessante artigo sobre a importância dos factores culturais nas eleições americanas.

terça-feira, outubro 26, 2004

Pequenas coisas que me irritam

A crónica preocupação nacional: "é doutor ou engenheiro?"

O silêncio na política

Não me quero meter em conversas para onde não fui chamado, mas, se me conseguir explicar bem, ficará claro que não é essa a minha intenção. Em dois posts (um do Irreflexões e outro do Bloguítica [2061]) é arguida a ideia de que a melhor coisa que José Sócrates tem a fazer é manter-se calado e quieto enquanto o governo se vai suicidando politicamente. Não duvido da apetência deste governo para a cavalgada de disparates, mas julgo que se deve esperar mais do líder da oposição.
Não é inteiramente justo comparar a situação política que Ferro Rodrigues enfrentou com a que se depara a José Sócrates, mas é perfeitamente razoável pedir a este último o mesmo que se pedia ao primeiro. O nível de exigência tem de ser o mesmo. A fasquia colocada para FR não pode ser agora reduzida para JS. Ao líder do maior partido da oposição pede-se uma actuação firme e a construção de uma alternativa forte e credível. Foi isto que foi pedido a FR e é o que se pede, certamente, também a JS.
Como político experiente e metódico que tem a fama de ser, os silêncios de JS correspondem a uma estratégia possivelmente sintetizada na citação de Napoleão que o Irreflexões relembrou. JS pretende gerir o timing das suas intervenções não só para evitar desgastar-se, mas também, como já foi referido, porque o governo vai contribuindo para o seu próprio descrédito a um ritmo acelerado. Esta gestão é delicada. Bem utilizada pode resultar em enormes benefícios eleitorais, mas pode igualmente revelar-se prejudicial em determinados cenários. Nomeadamente, caso transpareça mais nitidamente a vontade de colher dividendos políticos com a gestão dos silêncios do que a vontade de defender os interesses dos eleitores.
Por último, há ainda que considerar o aspecto ético da questão. O PS e o seu líder, qualquer que seja, ou qualquer outro partido com aspirações de governação, não podem esperar que o poder lhes caia ao colo, o que, desde logo, até contribuiria para fragilizar o seu executivo. Aos partidos e aos políticos que aspiram a ocupar o poder pede-se que ajam respeitando determinados códigos de conduta, que apresentem propostas concretas, que sejam capazes de construir alternativas (e não meras alternâncias), que estejam presentes nos momentos difíceis e que contribuam para a credibilidade do sistema. Neste momento, em que a coligação PSD-PP é o que se sabe, cabe à oposição, com especial destaque para o PS pelo seu peso eleitoral, um papel fundamental para desmontar toda esta mascarada governativa. O governo até pode cair de podre como uma vulgar peça de fruta, mas a actuação mais correcta é garanti-lo abanando a árvore.

O fim dos dólares em Cuba

O regime de Fidel Castro está apostado em retirar os dólares americanos de circulação em Cuba. A justificação desta medida prende-se com a recuperação dos cerca de 400 milhões de dólares que se estimam que circulem na ilha.
Até ao Verão de 2003, e julgo que ainda seja o caso, existiam em Cuba três moedas: o peso cubano, o peso conversível e o dólar americano (segundo alguns relatos o euro também era aceite em algumas estâncias turísticas). As duas primeiras são moedas nacionais, ao passo que os dólares são introduzidos na economia local pelos turistas em subsectores relacionados com o turismo. O turismo, por sua vez, faz-se pagar bem. A título de exemplo, a entrada nos museus é paga e se se quiser tirar fotografias no seu interior paga-se uma sobretaxa. Uma garrafa de água de 33 cl. custa um dólar e nos locais com maior afluxo turístico pode chegar a pagar-se pequenas fortunas por uma refeição. Fazer uma vida mais barata em Cuba é possível mas implica algum esforço de contenção e de procura pela melhor relação qualidade-preço.
Não admira que, para evitar os inconvenientes dos câmbios e das contas de cabeça, o turista faça as suas despesas sobretudo em dólares. Os cubanos também não se fazem rogados a receber esta moeda, muito mais forte do que a sua que lhes permite alcançar um poder de compra bastante superior. Aqui reside um dos problemas que o regime cubano enfrenta e que poderá ser uma razão bastante mais relevante para retirar o dólar americano de circulação.
Em Cuba a teoria da ausência de classes sociais parece realmente funcionar. Existe um efectivo nivelamento proporcionado pelo controle económico total por parte do Estado. Não havendo propriedade privada e sendo o Estado a definir os regimes salariais, o poder de compra da população é, de uma forma geral, uniforme. Os profissionais mais bem pagos estão nas forças policiais e no exército, logo seguidos dos médicos que ganham, em média, 25 dólares mensais. O salário médio na ilha, segundo o que os próprios habitantes referem, é de entre 7 a 10 dólares mensais. Mas, em qualquer caso, estamos a falar de uma quantia insuficiente para assegurar um padrão de vida razoável, com acesso ao consumo na forma como o conhecemos, pelo que o nivelamento está feito, infelizmente para a população, bastante por baixo. As tensões e insatisfações provocadas por todas as limitações impostas pelo Estado não se repercutem em conflitos de classe, uma vez que estas são virtualmente inexistentes. Este é, sem dúvida, um dos cimentos mais sólidos do regime. O nivelamento praticado não permite ostentação de riqueza. Assim, não há franjas da população a sentirem-se injustiçadas em detrimento de outros grupos sociais.
Este cenário pode sofrer profundas alterações com o peso económico do sector do turismo e com a circulação do dólar. Os cubanos com acesso ao turismo acedem igualmente a essa moeda altamente valorizada, não só através dos canais oficiais da economia, mas sobretudo através de canais paralelos, nomeadamente, em negócios ilegais ou em gorjetas. Nesta perspectiva, quem tenha acesso aos sectores da economia onde circulem dólares está numa posição privilegiada dentro do sistema. Como as necessidades são muitas, a curto prazo este efeito é diluído. Mas a médio prazo pode representar já uma diferenciação notável criando uma classe social nova que se destaca pelo seu poder de compra, o que representa uma grande ameaça para o sistema social em vigor em Cuba. Estranho seria se o regime de Fidel Castro não reagisse.

Desigualdades

Quem quiser consultar alguma informação sobre as desigualdades provocadas pela dimensão económica da globalização pode seguir o link deixado pelo Carlos A.A., nos comentários ao post Esquerda vs. Direita, para um post do Albardeiro.

segunda-feira, outubro 25, 2004

A coerência

Educação sexual nas escolas parada e sem coordenação há dois anos

A aposta na Educação Sexual não é um dos argumentos recorrentemente utilizado pelos partidos da coligação, em especial o PP, para rebater a descriminalização do aborto?

Visitas prisionais

A notícia já não é desta semana e parece ter passado um pouco despercebida. O Director-Geral dos Serviços Prisionais avançou com a ideia de reduzir as visitas aos detidos. A justificação prende-se com questões de segurança, nomeadamente, com a introdução de substâncias ilícitas nos estabelecimentos prisionais.
Em Portugal esta forma de encarar os problemas parece fazer escola. Se algo aparenta não funcionar adequadamente, não se procura melhorá-lo. Opta-se quase sempre por condicioná-lo ferozmente ou simplesmente extingui-lo. A cultura de facilitismo também passa por aqui.

Esquerda vs. Direita

Um texto anterior, relacionado com as alternativas partidárias, deu origem a um post a revelar alguma perplexidade no Acanto. Vale a pena, então, desenvolver um pouco algumas questões que aí ficaram em aberto.
O mundo está cada vez mais globalizado. É tão inegável quanto inevitável. Mas o que não é inevitável é esta forma de globalização liberal que tem sido dominante até agora. O resultado, apesar das manobras estatísticas para nos convencer do contrário, é um crescimento das desigualdades, a todos os níveis, entre os que mais têm e os que menos têm. E esta realidade é notória a nível global, mas também a nível nacional e local. Perante isto, não querendo discorrer em pormenor sobre as diferenças entre os modelos de esquerda e de direita, parece-me claro que o modelo que tem sido aplicado é um modelo de direita e que as consequências são as que foram resumidas acima. Embora a globalização e a modernidade contribuam para criar microcosmos individuais de referências, as principais linhas de orientação política continuam a fazer sentido. É em relação a elas que nos posicionamos politicamente, embora as divergências sejam cada vez mais complexas de analisar.
Não me custa admitir que com a crescente complexidade da realidade social existam desafios à linearidade dos posicionamentos políticos. A apologia do intervencionismo do Estado pode coexistir com determinado moralismo social, ou vice-versa. Sem dúvida, os partidos políticos têm de encontrar soluções que correspondam à realidade em que estão inseridos, o que implica que as mensagens sejam, também, muito mais complexas (o que, infelizmente, nem sempre se verifica, caindo-se frequentemente em simplismos e reducionismos). Mas, qualquer que seja o caminho adoptado, e por muito complexa que seja a realidade, não se pode iludir o facto de continuarem a existir dois termos de referência com propostas divergentes, embora muitas vezes se possam cruzar.
De outra forma, ter-se-ia de admitir uma versão única, verdadeira, absoluta e inevitável da realidade política, económica, social e cultural. Mas não estamos a caminhar nesse sentido. O que acontece, como sempre aconteceu, é que temos um modelo dominante no mundo ocidental que tem um enorme poder. Poder de afirmação, de reprodução, de expansão e de dominação. Evidentemente, não será necessário explicá-lo, sendo o modelo dominante, os princípios e a visão da realidade que veicula são os seus. E, por isso, “oferece-se”, naturalmente, como a melhor opção. Desta forma, não é estranho que, sendo a direita que detém o domínio económico-social, seja comum encontrar teóricos que argumentam que o futuro da esquerda tem de passar seguramente por uma deriva centrista. Aliás, este é um dos principais indicadores de que as teorias de domínio da esquerda são mitos que têm como principal função o reforço do modelo dominante.
É inegável que uma deslocação da esquerda para o centro é uma deslocação no sentido da direita, o que assenta como uma luva às pretensões de hegemonia dos modelos liberais. Por estes motivos repito que faz ainda todo o sentido falar numa dicotomia esquerda-direita. Faz sentido que as pessoas desenvolvam uma auto e hetero-identificação política recorrendo a essa diferenciação. E faz todo o sentido que se continue a discutir os interesses e valores que estão por trás de cada modelo e as implicações das suas capacidades de acção e de transformação da realidade. Ainda que correndo o risco de ter de conviver com discursos demagógicos ou desonestidades de parte a parte, este é um debate com utilidade inquestionável para o progresso do pensamento político. Muito pior estaríamos se houvesse uma empobrecedora unanimidade artificial em volta de um destes pólos.

sexta-feira, outubro 22, 2004

Uma estratégia de irresponsabilidade

Julgo não estar enganado se disser que Santana Lopes é o principal seguidor do culto da sua própria personalidade. As constantes referências ao seu desempenho utilizando a primeira pessoa revelam um egocentrismo claro, algo perfeitamente notório mesmo em ocasiões oficiais, onde este comportamento se torna ainda mais inadmissível. Santana está habituado ao one man show e deve ser-lhe difícil partilhar focos de atenção. Além disso, o instinto de sobrevivência política de PSL (embora se possa, com muito mais justiça, apelidá-lo de arrivismo) está bastante desenvolvido. O que contribui para que a contenção de danos seja feita sempre tendo em vista a preservação da sua imagem, sacrificando-se pelo caminho os que tiverem de ser sacrificados.
Ultimamente tem-se assistido a uma culpabilização política dos assessores e dos ministros do governo, certamente merecida, mas que deve ser colocada em perspectiva. A diluição das asneiras governativas pelos níveis inferiores serve uma estratégia de preservação da imagem. A imponderação de PSL não o ajuda e os episódios tristes sucedem-se, mas as exposições difíceis estão reservadas para outros. Pelos blogues não falta quem vá desmascarando este fenómeno, mas nos órgãos de comunicação social que realmente têm peso não se assiste a este nível de exercício da crítica. O resultado prático é um branqueamento da paupérrima prestação de PSL enquanto primeiro-ministro.
O problema não está somente, nem sequer sobretudo, nos colaboradores de Santana Lopes. Existe, para qualquer detentor de um cargo político, uma responsabilidade política sobre a sua área de influência. A influência de um primeiro-ministro corresponde a todas as áreas de actuação do seu governo. É ele que, em última análise, responde pela prestação do governo que coordena, independentemente da sua responsabilidade directa nos assuntos ou do seu total alheamento dos mesmos.
Mas nem sequer tem sido esse o caso. O que se tem passado é uma intervenção de PSL, ainda que por interpostas pessoas, no sentido de definir planos de intervenção política, manipulando a comunicação social e a opinião pública à sua conveniência. Sobre isto o primeiro-ministro tem mais do que mera responsabilidade política, embora esta já fosse suficiente para questionar a sua governação. Assim, entre as declarações extemporâneas de PSL, as contradições diárias com os seus ministros e os comentários dos seus colaboradores mais próximos não há diferenças significativas. Tudo tem o seu estilo e cunho pessoal. O primeiro-ministro não só tem conhecimento e dá o aval como é o principal mentor deste estilo de (des)governar. Por isso, terá que ser, assim, também o primeiro a ser responsabilizado em toda a linha nas críticas que são feitas a este governo.

Participação e cidadania

Gostava de chamar a atenção para este post no Quase em Português. Não tanto pelo interessante projecto da Alternativa (embora aguarde para confirmar os moldes em que se vai desenvolver), mas sobretudo pelo que está escrito no segundo parágrafo. Ali estão, de forma tão sucinta quanto directa, as relações de uma pessoa com as instituições de um país. A distinção que depois é feita entre cidadão e compatriota convida a uma reflexão séria sobre a participação de cidadãos estrangeiros nos projectos políticos, e não só, do país de acolhimento.
Inverter a redução da cidadania à nacionalidade é um desafio com particular relevância no cenário da integração europeia. A segurança é um bem necessário para a manutenção das liberdades e após o 11 de Setembro muitas dúvidas se podem levantar, mas a perspectiva mais correcta terá sempre de passar por um equilíbrio que não inviabilize o crescente reconhecimento de direitos dos migrantes. Tudo o que não passe por aí será um passo atrás neste domínio.

quinta-feira, outubro 21, 2004

Private

Mega legal diz tudo. Agora podes dizer que globalizaste o teu brilho natural. E eu sinto-me cada vez mais privilegiado.

Não percebem nada

O ministro Morais Sarmento quer que o poder político controle a televisão pública. Controlar e não controlar. Quer dizer, não é controlar, é controlar. Por isso não venham os mal intencionados dizer que é controlar quando ficou perfeitamente claro que é apenas controlar.

O ministro Gomes da Silva afirmou que existia uma cabala entre determinadas pessoas e alguns órgãos de comunicação social. Cabala e não cabala. Quer dizer, não é uma cabala, é uma cabala. Por isso não venham os mal intencionados dizer que o ministro disse cabala quando ficou perfeitamente claro que apenas disse cabala.

Percebem?

quarta-feira, outubro 20, 2004

Alternativas partidárias

Meti-me numa agradável troca de correspondência com o Evaristo do Abrangente que acabou por transbordar para os blogues. No essencial, andamos a discutir as vantagens da multiplicidade partidária. A argumentação do Evaristo parte de vários pressupostos que, na minha opinião, podem ser muito discutíveis.
No parlamento nacional estão representadas cinco forças políticas. Para o Evaristo parece ser já um número que peca por excesso, uma vez que a multiplicidade partidária leva à dispersão de votos. Mas para se aceitar esta ideia é preciso que se subvertam algumas regras de bom senso democrático. Por princípio, os eleitores escolhem a força política que lhes pareça mais conveniente. As sociedades modernas são caracterizadas por uma profunda heterogeneidade social, cultural e até ideológica. Embora a dicotomia esquerda-direita continue a fazer todo o sentido, em muitos aspectos essa heterogeneidade provoca intersecções ideológicas. As propostas de âmbito social e económico de cada um destes campos continuam a ser o referencial de alinhamento político por excelência, mas já não se pode pretender reduzir as análises a uma questão de preto e branco. A diversidade das sociedades deve ser tida em conta em todos os momentos, o que não deve ser confundido com um alinhamento indefinido e incaracterístico. Neste sentido, e como o voto é soberano, não se pode pretender ver na transferência de votos entre forças políticas um sintoma de enfraquecimento do sistema partidário. Isso representará certamente um problema para os partidos em questão, mas a força do sistema não está na força dos partidos e sim na força dos eleitores. Um sistema que não sirva para representar as sensibilidades do eleitorado é um sistema desadequado que deve ser alterado quanto antes.
Em segundo lugar, não está escrito em lado nenhum que o melhor sistema de governação seja o de maioria absoluta unipartidária. Claramente, as maiorias absolutas servem bastante bem os interesses dos partidos que alcançam esses resultados, mas representarão um sinal de maturidade democrática? Quando as forças partidárias não conseguem entender-se para implementar reformas reconhecidamente necessárias estamos perante uma de duas situações. Ou os interesses partidários se estão a sobrepor aos interesses nacionais, ou as características ideológicas dos partidos representados são realmente inconciliáveis. Neste último caso, como alternativa à maioria absoluta, também podemos equacionar, na inviabilidade de reposicionamentos ideológicos dos partidos com expressão significativa, o aparecimento de partidos que preencham as lacunas aparentemente existentes. É evidente que este facto levaria à diminuição da expressão dos partidos existentes, mas caberia a estes encontrarem soluções que viabilizassem igualmente os seus interesses. De tal forma que poderiam até libertar os maiores partidos para melhor se definirem ideologicamente.
Com uma maior continuidade no espectro partidário, os programas de governo que surgissem de coligações ou acordos multipartidários poderiam facilmente tornar-se mais abrangentes e equilibrados do que os que surgem através de maiorias absolutas, não só respondendo às necessidades do eleitorado, mas também promovendo a sua identificação com o sistema partidário. Esta é uma perspectiva que pressupõe maiores exigências e responsabilidades para todas as partes, mas que pode permitir uma saudável nova dinâmica para o sistema eleitoral.

Uma decisão necessária

Ainda não percebi se estão certos os que defendem a teoria de que Santana Lopes quer provocar eleições antecipadas ou se a incompetência e a desfaçatez deste governo estão mesmo para lá de qualquer limite conhecido nos últimos 30 anos. Ou é a vergonhosa prestação de Gomes da Silva em praticamente tudo o que faz e diz, ou é Morais Sarmento a assumir a vontade de controlar politicamente a televisão, ou é o primeiro-ministro a explicar ao país o seu regime de sono. Para Jorge Sampaio, que por esta altura talvez já se tenha apercebido das implicações do monstruoso erro que cometeu, é muito difícil inverter a situação. Com que cara pode o Presidente vir fazer o que devia ter feito há uns meses atrás? Essa opção vai certamente fragilizar ainda mais a sua já fragilizada figura política. Mas não lhe resta outra solução legítima.
Perante os que defendem que o governo deve cair de podre, pode argumentar-se que os danos provocados pela sua actuação são demasiado graves e que é relativamente indiferente saber se resultam de uma estratégia deliberada ou não. Assim sendo, estão em causa questões como a qualidade do exercício democrático das funções governativas, para não falar dos problemas sociais, económicos e financeiros que o OE, na sua deriva populista, promete. Admitindo que não estão errados os que defendem que deixar Santana completar a sua governação é a melhor maneira de o arrumar politicamente (e sobre isto muito haverá para dizer), ainda falta perceber por que é que hão-de ser os que nunca votaram em PSL que devem pagar o preço mais alto. Na realidade, Jorge Sampaio é o principal responsável por termos este governo. Sendo que para nos livrarmos definitivamente da desastrosa equipa de Santana Lopes existe um preço a pagar, a pessoa mais indicada para o fazer é o actual Presidente da República. Jorge Sampaio que tenha a coragem de se sacrificar, corrigindo a asneira que cometeu.

À espera

Chalon-sur-Saône – Montpellier – Toulouse – Irun – Lisboa

terça-feira, outubro 19, 2004

Contra a sinceridade

Poucas coisas são tão irritantemente falsas como a defesa da “sinceridade”. Em rigor, passamos uma boa parte da nossa existência a fingir. É uma regra essencial do funcionamento das sociedades. Somos todos preparados para nos adaptarmos às pessoas e às situações. De uma forma geral, controlamos as nossas acções e não dizemos tudo o que nos apetece. É um processo afinado ao longo dos tempos para facilitar a sociabilidade, tão eficaz que poucas vezes nos impele a reflectir sobre ele. A sinceridade, aquela abertura frontal em que se confronta o outro com a verdade nua e crua, só ocorre em situações muito precisas e entre interlocutores com relações muito específicas. Tudo o resto são mitos que mascaram o facto de passarmos a vida a encenar peças escritas por outros autores.

Prioridades

Há coisas realmente importantes e outras que nem tanto. O facto de Pedro Santana Lopes ser primeiro-ministro e liderar um governo onde ainda pontuam nomes com o calibre de um Rui Gomes da Silva ou de um Luís Nobre Guedes, para não falar da inenarrável lista de secretários de estado, é importante. Um jogo de futebol que degenera numa sucessão de insultos entre uma cambada de energúmenos, nem por isso.

De acordo, a importância da troca de insultos entre gente inqualificável depende das responsabilidades dessas pessoas e do que se poderia aprender em estudos de caso sobre a ascensão destas personagens. Mas, verdade seja dita, nunca se tiram consequências da primeira dessas condições e nunca ninguém se interessou pela segunda. Assim, o que sobra é que estamos há mais de uma semana a ouvir falar de um acontecimento secundário, enquanto Santana Lopes continua a ser primeiro-ministro. Alguém se lembra que o governo apresentou a proposta de Orçamento de Estado na sexta-feira?

segunda-feira, outubro 18, 2004

A não-democracia

Alberto João Jardim decidiu dedicar a vitória de domingo à comunicação social do continente na verborreia que se lhe reconhece. É o oitavo mandato consecutivo de AJJ à frente dos destinos da Madeira. Se não se soubesse mais nada, a subtileza discursiva e o fenómeno de perpetuação no poder seriam suficientes para se perceber a saúde do sistema democrático na Madeira. Não se trata somente de vitórias da mesma força política, trata-se do exercício de um cargo pela mesma pessoa ao longo de duas décadas, o que, podendo parecer que não, ainda faz diferença.
Dizer que as pessoas votam não chega para definir uma democracia.

Parabéns

...e obrigado. Pelo tempo juntos. Por seres quem és e como és. Por me fazeres feliz. Por me fazeres querer ser melhor. Por tudo.

quinta-feira, outubro 14, 2004

Sobre o jogo

Os jogos vistos na televisão ou ao vivo são muito diferentes. Criam-se impressões diferentes, não só pelo ambiente que um estádio proporciona, mas sobretudo pela perspectiva do jogo que se tem. Numa transmissão, para o bem e para o mal, ressaltam os pormenores, enquanto num estádio sobressai o conjunto geral. Ou seja, enquanto que através da televisão nos pode chegar um passe teleguiado de 30 metros, no estádio pode ficar a impressão que havia meia equipa melhor colocada para receber a bola.
Com este resultado, a selecção reconquistou o apreço da crítica. Sete golos são muitos golos e a Rússia era, supostamente, a segunda selecção mais poderosa do grupo. Mas as coisas podem ser vistas por outro prisma. Só os dois primeiros golos, em que num parece haver um fora-de-jogo e no outro uma pequena confusão, foram marcados dentro da grande área. Aliás, até parece que os restantes não só foram todos marcados de meia distância, como esta foi, até, progressivamente aumentando. Houve umas boas trocas de bola, algumas boas desmarcações servidas por alguns bons passes. Mas a verdade é que os russos não se mexeram durante quase toda a primeira parte e há dúvidas que tenham regressado para a segunda. Foram uma completa nulidade. E contra esta nulidade, o que Portugal conseguiu foi sofrer um golo e chegar apenas por duas vezes à área adversária.
Bem vistas as coisas, a defesa continua a desconcentrar-se incompreensivelmente e o guarda-redes treme tanto que assusta. O meio campo funcionou bem, mas também não tinha ninguém à frente. E o ataque... o ataque é a magia de Deco e a garra de Ronaldo e acabou-se, porque Pauleta parece que chegou agora à equipa e, mesmo assim, continua a ser o nosso melhor ponta-de-lança. Como esta gente não desaprendeu a sua arte, a a ausência de Figo, sendo importante, não explica tudo, temos que nos interrogar sobre o trabalho de Scolari e de Madaíl. Infelizmente, ou muito me engano, ou o post idealizado sábado há-de ter razões para ser publicado, mais jogo menos jogo.

Sobre o bom gosto

Os azulejos, meu Deus, os azulejos! E os tons de verde, meu Deus, os tons de verde e amarelo e verde e mais verde! E na televisão parecia tão bonito.

Sobre o estádio

A recordação mais nítida que guardo do Alvalade XXI são os degraus. Para qualquer lado que se queira ir, é preciso subir e descer degraus. Sempre se ouviu dizer que o Sporting era o clube mais elitista dos três grandes, mas nunca antes essa afirmação foi tão correcta. O Alvalade XXI começa a fazer a “triagem” ainda cá fora, quando se torna necessário ultrapassar a escadaria que dá acesso à zona das bilheteiras, para quem vem do Campo Grande. A partir daí, é sempre a piorar. É certo que o bilhete que eu tinha dava acesso a uma zona tão afastada do relvado que se respirava já um ar rarefeito, mas, caramba, continua a ser inadmissível que se exija ao espectador uma preparação física que rivalize com a dos jogadores. Afinal de contas, onde é que é suposto estarem os tipos transpirados e ofegantes: nas bancadas ou no relvado?

quarta-feira, outubro 13, 2004

E pronto

Lá fui comprar o spray e os comprimidos para as dores de garganta. Daqui a pouco ponho-me a caminho do Alvalade XXI para conhecer o estádio e ver o Portugal-Rússia. No final, espero não ter que dar por melhor empregue o tempo e o dinheiros gastos na farmácia do que no jogo. Se isso acontecer, também não há-de ser nenhuma desgraça. Afinal, tenho um post idealizado desde sábado mesmo à espera de sair.

A minha roupa é melhor que a tua

O Ma-Shamba recuperou um tema que já tinha sido abordado pelo Aviz, o das restrições à liberdade de escolha da indumentária no meio escolar. Jorge Bacelar Gouveia afirma que essas restrições são inconstitucionais e, suponho, deve ter boas razões para o fazer. No entanto, as suas considerações são, inevitavelmente, jurídicas. E, para que a reflexão esteja mais completa, é necessário abordar outros aspectos.
FJV refere que “a questão não está, sequer, em que se discuta se o regulamento é exagerado ou não”, mas, no meu entender, a questão é precisamente essa, e por duas razões.
Em primeiro lugar, porque a questão da definição de limites não é despicienda. Se todos reconhecemos a liberdade dos indivíduos para se expressarem e apresentarem como entenderem, não deixa de ser muito complicado dizer em que ponto é que estamos perante um abuso dessa liberdade, isto se nos centrarmos, para efeitos de argumentação, no campo das indumentárias. Não podemos esquecer que existe um sentido atribuído a tudo o que fazemos e, nessa medida, eu até posso concordar que o JPT veja um artefacto erótico no piercing da sua aluna e que seja esse também o sentido que ela lhe atribui. Mas posso assegurar, por exemplo, que não é, de todo, o sentido que eu lhe atribuo. O meu sentido é meu e o vosso é vosso, ambos tendo valor dentro dos códigos de referência que cada um adopta. Da mesma forma, se é inegável o erotismo de certas combinações de roupa, também é certo que alguns as considerarão muito mais eróticas do que outros, pelo muito dificilmente se poderá chegar a um acordo sobre a razoabilidade de uma indumentária, desde que não estejamos a falar de situações que uma larga maioria de pessoas consideraria claramente escandalosas. O que nos conduz quase directamente para a segunda razão anunciada.
Com efeito, em qualquer contexto social do quotidiano, geralmente, impera o bom senso. Não deve haver muitos professores a ir de t-shirt, calções e sandálias para as aulas. Assim como, não entrando eu numa escola secundária há muito tempo, pela amostra que se vê nas ruas e nos transportes, não me parece que sejam um antro de provocação libidinosa adolescente. Isto sucede porque o social tem formas tão discretas quanto eficazes de controlar os desvios. No fundo, tudo se relaciona com as expectativas associadas a cada situação e aos seus intervenientes. A maioria dos professores (sentir-me-ia tentado a dizer que será a esmagadora maioria) sabe que se for para a sala de aula com uma indumentária desadequada é trucidado pelos alunos e dificilmente lhes reconquista o respeito. Da mesma forma, qualquer adolescente sabe que se não seguir os imperativos da moda juvenil terá muita dificuldade em inserir-se socialmente na escola. De resto, é natural que num contexto social de extrema valorização do corpo e do aspecto físico, a juventude, também ela alvo de forte valorização, se afirme com alguns dos maiores trunfos que possui. Acaba por ser uma questão de sobrevivência e aceitação social.
Saber quem define o que está in e o que está out em cada ano poderá ser uma reflexão igualmente interessante, mas não é o ponto central nesta argumentação. O que está aqui em questão é que os grupos sociais, neste caso considerados pela faixa etária e pelo papel desempenhado no meio escolar, se apropriam dessas tendências e dispõem de um espaço de manobra até relativamente reduzido. Não conhecendo as relações que caracterizavam a situação descrita pelo JPT, espanto-me que a sua aluna tenha soçobrado perante a sua vontade. A esta distância, era capaz de arriscar que isso lhe terá, provavelmente, custado alguma força de afirmação perante o resto da turma. Sem com isto querer dizer que os professores não tenham o direito de se sentirem ofendidos com determinadas situações. Em última análise, temos em confronto dois conjuntos de referências culturais e não é fácil decidir, neste caso, quem tem mais legitimidade para impor a sua sensibilidade.
Existem complexas redes de significados e relações de poder e afirmação que não são visíveis com uma observação superficial. De uma forma geral, podemos confiar nos mecanismos informais que as sociedades desenvolveram para se auto-controlar. Não lhes querer reconhecer a influência que possuem é um erro tão grande quanto podem ser contraproducentes as tentativas de regulação impostas do exterior. Nesta óptica, aos espíritos mais castos pode não restar outra solução que não um estóico esforço de habituação. Como fraco prémio de consolação, podem confiar que, muito provavelmente, os piercings e os umbigos vão sair de moda mais brevemente do que imaginam, se bem que não se sabe o que aí virá a seguir. Ainda vão acabar a ter saudades destes dias.

Rogai por nós

Sobre o conteúdo da comunicação/tempo de antena/propaganda do primeiro-ministro muito há para dizer. Por exemplo, que não anunciou nada de novo, que não esclareceu nada sobre os temas que apoquentam o país, que se apropriou indevidamente do trabalho realizado por outros governos e o apresentou como seu, ou que foram simplesmente quinze minutos de demagogia e populismo. No entanto, ninguém resumiu melhor o sentimento final do que Luís Afonso: deve vir aí a Senhora de Fátima para ministra das Finanças.

Santana e a liberdade da imprensa

Na época em que era presidente da Câmara da Figueira da Foz, Santana Lopes cortou relações com o jornal "Linha do Oeste" devido à publicação, em Março de 1998, de um editorial que criticava as opções da autarquia.

terça-feira, outubro 12, 2004

Acabar com isto enquanto é tempo

O arrivismo, a incompetência e a arrogância deste governo podem ter como resultado um desencanto crescente do eleitorado. Perante tamanhas demonstrações de desrespeito pelos princípios básicos orientadores da acção política correcta e legítima, é compreensível que a repulsa provocada se transforme em afastamento e aumente o divórcio entre eleitores e eleitos. Não sei se será uma estratégia conscientemente delineada, mas que pode ser-lhes útil, que ninguém duvide.
Perante este cenário assustador, é necessário que se repita incessantemente o perigo que este executivo, mais que o anterior, representa para o futuro do país e do seu sistema eleitoral. É absolutamente fundamental que não se baixe os braços, que se continue a apontar a sua irreversível tendência para o disparate, para a inépcia e para a manipulação grosseira e que não se deixe claudicar o futuro às suas mãos.
Este conjunto de pessoas reunidas à volta da personagem que é o actual primeiro-ministro é uma imagem fiel dele próprio. São superficiais, irresponsáveis e representam um perigo bastante real. Cada dia que passa, é um dia a mais.

Não acredito

Este senhor é mesmo deputado? A sério, é mesmo deputado? Somos nós que lhe pagamos a refinada verve?

A comunicação/tempo de antena/propaganda (riscar o que não interessa)

Há figuras que se adequam melhor a uma pose de estado, enquanto outras se dão melhor com o papel de político na oposição. Durão Barroso e Ferro Rodrigues são dois exemplos de políticos que revelavam mais perfil para a pose de estado. Nenhum foi particularmente reconhecido como carismático líder de oposição. O que talvez se possa atribuir, em parte, ao facto de ambos terem conhecido primeiro os cargos executivos e só depois as cadeiras da oposição. Estavam notoriamente mais confortáveis no papel relativamente mais calmo que costuma caracterizar o exercício do poder.
Por outro lado, Santana Lopes está muito mais talhado para o papel de opositor. A comunicação de ontem foi disso uma clara demonstração. O desconforto de PSL chegou a ser constrangedor. Sem espaço para a gesticulação, sem margem de manobra para as modulações de voz características dos comícios, pouco à-vontade no seu lugar, nunca conseguiu entrar no papel e conferiu um tom assustadoramente artificial à sua intervenção. Para quem é suposto ser um mestre da imagem, até nesse aspecto foi muito pobre.

segunda-feira, outubro 11, 2004

O dolce fare niente segundo Matilde

A Matilde é uma gata com, sensivelmente, seis meses de idade. Os dois donos da Matilde, sendo que eu sou um deles, não gostam muito de nomes de pessoas aplicados aos animais de estimação. Mas esta gata, por motivos que não vêm agora ao caso, tinha de receber o nome de Matilde. A Matilde não é uma gata especialmente bonita. É uma gata europeia, elegante, listada em tons de cinzento e castanho, que tem o aspecto comum que os gatos têm quando não são persas, nem siameses, nem de alguma dessas raças mais exóticas.
Nunca tive, verdadeiramente, um animal de estimação. Havia lá em casa, há muitos anos, um canário extremamente resistente e pouco dado a cantorias. Mas não se pode dizer com sinceridade que, apesar de me ter sido oferecido, eu tivesse sobre ele alguma responsabilidade ou atenção especial. E chegou a haver em casa do meu pai uma cadela, já mencionada num post de antanho que gerou vivos protestos. Por isso, nenhuma destas experiências constituiu uma verdadeira relação afectiva com o animal em causa, não obstante a simpatia que a cadela do meu pai era capaz de gerar e o meu intenso desejo de ter um dia um cão, objectivo que se pretende alcançar, através de um pacto de regime que satisfaça os grupos de oposição, talvez por volta da passagem de ano.
A Matilde é, por isso, o primeiro animal de estimação que sinto que verdadeiramente me pertence, ainda que não seja o único, nem sequer o principal, responsável por ela. Também por isto, é extremamente curiosa a relação que temos. O meu conhecimento sobre gatos foi quase integralmente adquirido depois da chegada da Matilde e fortemente condicionado pelos boatos mais ou menos generalizados sobre a espécie. Que não se pode ensinar gatos, que eles são demasiado independentes, que fazem o que querem, que não vêm quando são chamados, etc. Depois deste meio ano, estou cada vez menos convencido destas ideias preconcebidas.
Como todos os gatos, suponho, a Matilde é brincalhona, não excessivamente dada a meiguices e com uma personalidade que se vai sedimentando de dia para dia. Está a tornar-se uma especialista a jogar às escondidas e é capaz de arquitectar elaborados planos de emboscada. Trepa para muitos locais onde não devia estar, mais por curiosidade do que por outra coisa qualquer, mas, muitas vezes, basta que lhe apontemos o sítio onde deve permanecer para que, mesmo sem repreensões, obedeça quase imediatamente. Adora andar de carro, posicionando-se sempre perto do vidro traseiro ou em cima do tablier, a estudar o curto percurso que separa as duas casas que conhece. Delira a atacar mãos, braços, pernas, pés ou virtualmente qualquer pedaço de pele que encontre, mas é significativamente mais comedida com pessoas a que não esteja muito habituada. As mordidelas e as arranhadelas doem e deixam marcas, mas ela já aprendeu a praticamente não recorrer às garras e a dosear a força das mandíbulas. Para um dono convertido às deliciosas traquinices de um animal felpudo de três ou quatro quilos, é o suficiente para se suportar quase tudo estoicamente com um sorriso embevecido na cara.
Também como todos os gatos, suponho, tem os seus sítios preferidos para fazer as suas sonecas, por baixo de determinado cadeirão na sala, ou em cima do sofá. Mas o que mais a caracteriza é o facto de ser uma gata que gosta de companhia. Já houve um tempo em que tinha tamanho para se vir aninhar no pescoço de um de nós para dormitar. Neste momento, já está demasiado grande para esses equilíbrios, mas continua a preferir a companhia dos donos às sestas solitárias. Invariavelmente, pode ser encontrada na mesma divisão que nós. E com alguma frequência, naquelas tardes pachorrentas de fim-de-semana, não hesita em saltar para junto de nós, descobrindo um confortável recanto colado ao nossos corpos, onde adormece ronronando pelo simples prazer de estar ali. Uma experiência que transmite uma tranquilidade e uma gratificação difíceis de descrever. Agora que sei o que é, já nem saberia viver bem sem isso.

Uma questão de pontos de vista

Hoje é dia de conferência de imprensa para Pedro Santana Lopes. É uma acção perfeitamente coerente com todo o seu percurso político. Afinal, ninguém lhe deve ter dito que a política não é o que se diz em frente ao microfone, é o que se faz nos gabinetes.

quinta-feira, outubro 07, 2004

A iliteracia

Nos comentários ao post anterior, alguém me acusa de paternalismo. E adianta que "os portugueses não são tão imbecis" como eu quero fazer crer. Como um blogue também pode ser um espaço confessional, admito que posso ser mais paternalista do que gostaria. Não o digo pelo que escrevi nesse post (talvez noutros se note mais), mas porque é uma característica que reconheço possuir e que não ajuda nas relações que mantenho. Suponho até que, por vezes, haja quem sofra bastante com isso e só posso estar agradecido por ainda me tolerarem quando tenho mais um dos meus ataques.
Não sou particularmente dado a manifestações de exaltação patriótica, mas também não tenho nada em particular contra os portugueses. Não pretendo fazer dos portugueses um bando de imbecis nem penso que sejam mais ou menos imbecis do que outro povo qualquer. Nessa medida, o que escrevi sobre a falta de ferramentas para descodificar a realidade pode ser aplicado, certamente, do lado de lá da fronteira, ou em Inglaterra, ou nos EUA, etc.
Para que seja possível descodificar conteúdos é necessário que se partilhe a linguagem em que estes foram produzidos. Por exemplo, das centenas de milhar de espectadores que seguiam semanalmente os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa, quantos dominam a realidade política para descodificarem todas as alfinetadas e insinuações que caracterizavam as suas intervenções? Se não houver um conhecimento dos códigos utilizados, não é possível decifrar as mensagens. À velocidade a que os acontecimentos surgem na televisão e sem possibilidade de recapitular o que está a ser dito, quem pode assegurar que a apreensão da mensagem é fidedigna? Não se trata de uma questão de menosprezar todo um povo, trata-se de uma questão de razoabilidade.
A iliteracia dos portugueses é uma realidade, porventura, pouco divulgada. Mas é uma realidade. Em estudos realizados, a percentagem de portugueses que não consegue efectuar correctamente tarefas aparentemente simples como interpretar textos ou tabelas é assustadoramente alta. Já para não falar das constrangedoras médias que as disciplinas de Português e Matemática registam todos os anos. Seria uma insensatez considerar que quem revela tamanhas dificuldades na compreensão da língua e no raciocínio lógico-matemático possa, perante o pequeno ecrã, transformar-se num especialista em semiologia.
Mas, para que este texto não fique sem o devido suporte, nos próximos posts talvez seja possível fazer algumas incursões ao maravilhoso mundo das estatísticas do analfabetismo funcional. Desaconselhado aos espíritos patrióticos mais sensíveis, claro.

Viagens na minha terra



Torre do Castelo Estremoz. Depois da visita, um café e uma água fresca no pátio da Pousada.

Comunicação, liberdade e democracia

Os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa estão longe de ser isentos ou ingénuos. Evidentemente, está no seu direito. As posições que assume são da sua responsabilidade e só o devem comprometer a ele.
Existem, no entanto, outros problemas. A meu ver, podem resumir-se em duas questões: a parcialidade das linhas editoriais dos meios de comunicação social e o encapotamento dessa parcialidade, travestido em supostas análises objectivas.
Estamos, também, perante um problema de literacia dos consumidores. Provavelmente, muitos dos leitores ou espectadores não possui as ferramentas necessárias para descodificar os conteúdos, para ler as entrelinhas, para separar a objectividade da parcialidade e o rigor da propaganda. É um problema recorrente na nossa sociedade e que está intimamente ligado ao sistema educativo e à própria qualidade dos serviços oferecidos nestas áreas.
Mas se é certo que nem todos conseguem destrinçar o que estão a consumir, também é notório que muitos analistas, assim como os órgãos que lhes servem de suporte, não se preocupam em contribuir para clarificar as posições. Por princípio, é mau sinal que uma boa parte dos comentadores, opinion makers e analistas seja composta por políticos. Muito pior quando alguns estão ainda no activo. Não se percebe como é que a sua objectividade se coaduna com a necessidade de defender os interesses do partido. Se isto se afigura do mais elementar bom senso para um mero consumidor, talvez não seja pedir demais que os editores também levem este pormenor em linha de consideração. Igualmente conveniente seria uma higienização do exercício do jornalismo, na medida em que os espaços de notícia se diferenciem na forma e no conteúdo dos espaços de opinião. Não se pede que os jornalistas deixem de emitir opiniões, nem sequer que não o possam fazer pelos meios que habitualmente utilizam. Mas pede-se que a opinião não habite no espaço da notícia. Em televisão existem separadores que identificam o início e o fim dos espaços publicitários, para que estes não sejam confundidos com os restantes conteúdos. Dado o elevado grau de iliteracia da população, talvez esteja na altura de pensar em adoptar modelos semelhantes para explicitar claramente a separação entre a informação e a opinião.
Por outro lado, existe ainda a questão de conhecer o alinhamento editorial dos meios de comunicação social. Se é fundamental para o exercício da democracia que exista igualdade de oportunidades no acesso à informação, quer a montante (produtores/divulgadores) quer a jusante (consumidores), isso não implica, forçosamente, que não possam existir órgãos de comunicação social alinhados com determinadas correntes de opinião política. O que é desejável, nesse caso, é que esse alinhamento seja assumido publicamente sem subterfúgios. Porque o perigo reside mais na dissimulação do que no alinhamento propriamente dito.
Não obstante, é perfeitamente ridículo que se queira fazer crer que há equilíbrio nos órgãos de comunicação social portugueses. E chega a ser patético que se pretenda fazer crer que o domínio das linhas editoriais pertença à esquerda. É um desafio tentar encontrar um nome de esquerda entre os mais mediáticos comentadores da actualidade.
O verdadeiro domínio reside sobretudo nos interesses do bloco central. O espaço está praticamente monopolizado pelas tendências dominantes da política. Não são oferecidos espaços de comunicação aos espectros mais distantes do centro, nem às vozes de organizações mais ou menos não-alinhadas com os campos políticos conhecidos.
Posto isto, seria eticamente recomendável que os órgãos de comunicação social assumissem a sua responsabilidade cívica e contribuíssem activamente para a igualdade de oportunidades. Caso não desejem assumi-lo, pelo menos que clarifiquem o seu alinhamento.
Assim, conviria que os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa correspondessem factualmente à verdade e que tivessem lugar fora do enquadramento noticioso. Mas no que diz respeito às suas considerações e opiniões, estas não podem ser senão subjectivas e, portanto, valorativas. Desta forma, caberia sobretudo à TVI criar condições de descodificação dos conteúdos do seu comentador, quer através da criação de um espaço próprio, desligado do telejornal, quer através da auscultação de outros pontos de vista.
No entanto, o que assistimos foi um ataque do governo, na pessoa do ministro Rui Gomes da Silva (mas é de supor que com conhecimento de Santana Lopes), tendo como alvo o comentador e não o canal televisivo. Por isso, ao contrário do que agora quer fazer crer, o governo atacou a liberdade de expressão de um comentador. A preocupação principal centrou-se no conteúdo do que era dito e não tanto nas condições em que era dito.
O facto de Marcelo Rebelo de Sousa ter deixado as suas funções de comentador na TVI adensa a névoa deste episódio. Se o comentador tomou essa decisão somente depois de ter conversado com Paes do Amaral, é fundamental que venha explicar por que o fez. É essencial que o público possa saber se houve pressões da administração do canal ou dos seus accionistas no sentido de moderar ou afastar Marcelo Rebelo de Sousa. E se assim tiver sido, é absolutamente necessário apurar se a própria TVI foi alvo de pressões por parte do governo, ou se os interesses dos grupos que a controlam não estão a entrar em rota de colisão com a sua capacidade de corresponder à prestação de serviços que a sua licença obriga.
Esta é uma questão que se reveste de uma seriedade iniludível. Não se trata de um fait divers, pelo que convém esclarecer todo o assunto de forma a não deixar uma réstia de dúvida. Se houve realmente pressões governamentais no sentido de condicionar os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente da República não pode tomar outra decisão que não seja a de demitir imediatamente este executivo. Porque se isto não é um ataque à democracia, já nada é.

quarta-feira, outubro 06, 2004

Abandonar?

A facilidade com que as expressões "pegam" é fantástica. Carlos Carvalhas revelou a sua intenção de não se candidatar novamente ao cargo de secretário-geral do PCP, mas a maior parte da comunicação social optou por falar em "abandono". Ora, o ainda SG do PCP, que não apresentou a demissão, vai cumprir este mandato, que é já o terceiro, até ao fim. Ou seja, não abandona rigorosamente nada.
Para facilitar o entendimento do uso correcto da palavra abandonar, segue-se uma curta lista de pessoas de quem se pode dizer, com muito mais justiça, que abandonaram alguma coisa:

Durão Barroso – abandonou o seu mandato de primeiro-ministro a meio da legislatura para ocupar o cargo de presidente da Comissão Europeia

Pedro Santana Lopes – abandonou o seu mandato de presidente da CM de Lisboa para ocupar o cargo de primeiro-ministro sem ter que se sujeitar a essa maçada que são as eleições

Paulo Portas – quebrou a sua promessa de ficar na CM de Lisboa e abandonou-a sem terminar o mandato

Manuela Ferreira Leite – abandonou as regras do rigor quando recorreu a medidas de controlo do défice ineficazes e até perigosas

Celeste Cardona – abandonou as suas responsabilidades quando a Justiça atravessou a sua maior crise no período democrático

David Justino – abandonou o princípio da responsabilidade política (ou da vergonha na cara, dependendo do ponto de vista) em sucessivas entrevistas sobre o seu exercício nas funções de ministro da Educação

Luís Filipe Pereira – abandonou o Serviço Nacional de Saúde para o deixar ser devorado pelos interesses privados e abandonou os princípios da álgebra ao negar que o número de pacientes na segunda lista de espera para uma cirurgia deva ser somado ao número de pacientes que ainda restam na primeira lista

Bagão Félix – abandonou o princípio da solidariedade política ao distanciar-se das medidas adoptadas pelo anterior governo, do qual também fez parte

Alberto João Jardim – abandonou, há muito tempo, o respeito pelos outros e pelo funcionamento democrático das instituições (também poderá ter apenas abandonado a sanidade mental)

Rui Gomes da Silva - abandonou o princípio da liberdade de expressão para pressionar um conhecido comentador político

Jorge Sampaio – abandonou-nos a todos às mãos de um bando de incompetentes que se julgam inimputáveis

Imigração

Após a constatação do extraordinário número de pessoas que recorre às quotas de emigração criadas pela governação PSD-PP, o secretário de estado vem, ainda assim, defender o modelo. Para Feliciano Barreiras Duarte, as intenções do governo redundaram num sucesso incomparável, uma vez que o reduzido número indica que os empregadores optam por imigrantes já estabelecidos em território nacional, o que contribui para a sua integração social.
Temos assim que, na realidade, o governo parece até ter pecado por excesso, existindo umas 8497 vagas que não encontram interessados.
A argumentação de Feliciano Barreiras Duarte possui uma concepção interessante de integração social. Para o governante, a integração social parece passar quase exclusivamente pelo emprego. As restantes componentes são convenientemente ignoradas, com excepção da listagem de um conjunto de medidas das quais não apresenta qualquer prova da sua eficácia. É manifestamente insuficiente referir uns quantos decretos que supostamente fomentam a integração social dos imigrantes se não se apresentar uma avaliação dos resultados conseguidos. Nestas questões, infelizmente, as boas intenções não chegam.
De resto, pela leitura do texto nem se percebe em que medida é que se pode associar o ridículo acesso ao sistema de quotas à preferência dos empregadores por imigrantes que já estejam em território nacional, nem sequer como é que essa suposta preferência se traduz efectivamente em direitos, garantias, qualidade de vida e integração social. Aliás, se foram detectadas necessidades no mercado de trabalho, e se estas foram quase exclusivamente supridas por pessoas já a residir em Portugal, como é de supor que os imigrantes não possuem o dom da ubiquidade, é natural que continuem a fazer-se sentir necessidades no mercado de trabalho em número mais ou menos semelhante. Ou o secretário de estado consegue provar que os empregadores deram lugar a 8500 imigrantes desempregados residentes em Portugal, ou não há outra conclusão a tirar. Ou melhor, até há: o sistema de quotas é um falhanço total e tanto os empregadores como os imigrantes continuam a operar preferencialmente à margem da lei.

Agradecimento

Gostava de agradecer as amáveis propostas para um almoço para os lados de Beja. Fica prometido que da próxima vez que por aí esteja aviso e combina-se uma sessão gastronómica.

Actualização

Os dois posts seguintes são os que teriam sido publicados segunda-feira – se não tivesse ficado sem acesso à Internet – ou terça-feira – se não tivesse encontrado coisas melhores para fazer.

segunda-feira, outubro 04, 2004

Fim-de-semana



Uma das mais belas torres de menagem do país.

sexta-feira, outubro 01, 2004

Land of freedom and oppotunities



"ADVERTÊNCIA
Embora a Biblioteca de Santa Cruz faça todos os esforços para proteger a sua privacidade, sob a Lei Pública Federal 107-56, USA PATRIOT ACT, os registos dos livros e de outros materiais emprestados por esta biblioteca podem ser obtidos por agentes federais.
Aquela lei federal proíbe os funcionários da biblioteca de o informarem se agentes federais obtiveram registos sobre a sua pessoa. Questões acerca desta política deveriam ser dirigidas ao Procurador Geral John Ashcroft, Departamento da Justiça, Washington, D.C. 20530".

Imagem gentilmente retirada de Resistir.info

O exemplo espanhol

A Espanha prepara-se para oficializar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Algo perfeitamente natural, de resto. Definir o casamento numa perspectiva meramente reprodutiva é devolver a noção de relacionamento humano à Idade Média. Hoje em dia, nas sociedades ocidentais, o casamento diz respeito a uma noção de relacionamento afectivo entre duas pessoas, envolvendo as dimensões amorosa e sexual. O que tanto é válido para relações heterossexuais como para relações homossexuais.
O conceito de família, tanto como o de casamento, é histórica e geograficamente variável. Nesta medida, interessa perceber que está na altura da realidade político-legislativa acompanhar a realidade social. Existem relações de atracção entre pessoas do mesmo sexo, existem relações que evoluem para cenários de afectividade estável co-habitacional (ainda que a co-habitação não seja condição essencial para a estabilidade de uma relação), é da mais elementar justiça que finalmente se reconheça um conjunto de direitos que têm vindo a ser negados a algumas pessoas com base nas suas opções sexuais. Negar a equiparação de direitos tendo por base o preconceito sexual é perpetuar uma intolerável discriminação que não se coaduna com os valores que a chamada modernidade ocidental gosta de defender.